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Vanguarda na rede

MARIA ALICE DA CRUZ

Diversos artistas atuantes em Campinas no final dos anos 1950, entre eles os membros do chamado Grupo Vanguarda, contribuíram de forma importante para a introdução da arte moderna na cidade. Apesar das diversas homenagens concedidas ao Grupo Vanguarda, formado por Thomaz Perina, Francisco Biojone, Maria Helena Motta Paes, Bernardo Caro, Enéas Dedecca, Geraldo Jürgensen, Raul Porto, Mário Bueno, Geraldo de Souza, Franco Sacchi e Edoardo Belgrado, faltava dar visibilidade a pesquisas acadêmicas destinadas à reflexão do trabalho desses e de outros artistas de vanguarda na cidade. Preencher esta lacuna está entre os objetivos do site “Arte Vanguarda em Campinas: textos, obras, exposições (1950-1970)”, projeto coordenado pela professora Maria de Fátima Morethy Couto, do Departamento de Artes Plásticas da Unicamp, financiado pelo CNPq e pela Fapesp.

O projeto reúne e disponibiliza ao público pesquisas, textos críticos de época e documentos até então mantidos apenas no acervo de bibliotecas e arquivos de documentação. “Esse material precisa ser levado ao conhecimento do público, principalmente por se referir a um momento importante da arte em Campinas. Optamos, primeiramente, por fazer a divulgação das pesquisas empreendidas por nossos alunos”, explica Fátima. A proposta é reunir esses documentos num mesmo espaço para ampliar a rede de estudos voltados à produção artística da época. Apesar de priorizar pesquisas desenvolvidas por graduandos e pós-graduandos da Unicamp, o site também abriga trabalhos de pesquisadores de outras instituições que oferecem análise crítica sobre o tema.

O site contém uma subpágina de obras comentadas, o que também permite ampliar a reflexão sobre o trabalho de artistas como Mário Bueno, Egas Francisco, Bernardo Caro e Raul Porto, entre outros. Entre os críticos que assinam os comentários selecionados pelos pesquisadores do projeto estão Olney Krüse, Mário Schemberg, Antônio Zago, Emerson Dionísio, Waldemar Cordeiro e Renata Cristina de Oliveira Maia Zago.

O espaço virtual torna público, também, artigos e documentos como textos críticos e jornalísticos, catálogos de exposição, cartas e manifestos, registro fotográfico e análise de obras, entrevistas com artistas e críticos. Segundo Maria de Fátima, vários desses documentos de época foram encontrados nos arquivos do Centro de Ciências, Letras e Artes de Campinas (CCLA), do Centro de Memória da Unicamp (CMU) e na Fundação Bienal de São Paulo. A partir da digitalização de convites e catálogos de eventos, o visitante do site tem agora informações precisas da ficha técnica de exposições individuais e coletivas, como salões e bienais, que contaram com a participação dos campineiros. “Muitas vezes, o pesquisador precisava de determinadas informações, mas tinha de recorrer aos acervos tradicionais. Agora várias informações se encontram neste acervo virtual”, acrescenta Maria de Fátima. O bolsista Octávio Augusto Bueno Fonseca da Silva, aluno do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Unicamp, é o responsável pela organização desses documentos, muitos dos quais selecionados pelos alunos no decorrer de suas pesquisas.

De acordo com Maria de Fátima, desde a concepção, a ideia é que o site extrapole o campo da divulgação e do enaltecimento dos artistas. Ela explica que, como a organização da página está pautada em pesquisas de cunho acadêmico, nem todos os artistas atuantes em Campinas naquele período estão contemplados neste momento, mas a ideia é organizar um banco de dados a partir da conclusão de pesquisas em andamento e de futuros trabalhos dedicados aos vanguardistas. “À medida que os alunos forem concluindo suas pesquisas, o site será atualizado com informações novas”, explica Fátima.

Maria de Fátima acredita que o tema permite uma discussão ampla sobre a relação entre centro e periferia; local, nacional e internacional no campo das artes e da história da arte, como também sobre os limites e alcances no estabelecimento de um vocabulário de vanguarda fora dos grandes centros de um país periférico. Ela acrescenta que, embora o foco específico do projeto seja a arte em Campinas, foram igualmente analisados e discutidos, em diversas pesquisas, o contexto artístico e o sistema de arte de outras cidades. A professora apresenta como exemplo a pesquisa empreendida por Lívia Fonseca, que mereceu menção honrosa no Congresso de Iniciação Científica da Unicamp de 2010, em que tratou da relação entre os artistas concretos de São Paulo e os vanguardistas de Campinas. Ou ainda a pesquisa de Juliana de Sá Duarte, na qual ela compara o trabalho de Mário Bueno ao de artistas do Grupo Santa Helena de São Paulo.

Um documento importante disponível na página é um texto assinado pela pesquisadora Renata Zago, em que ela analisa o conteúdo do manifesto que marca a origem do Grupo Vanguarda. De acordo com Renata, as inscrições “movimento”, “renovação” e “revificação constante” contidas no documento mostram que o grupo sugere uma renovação artística que seja progressiva. O manifesto, segundo a pesquisadora, contém uma crítica àqueles que guardam “os segredos da arte” para si mesmos, a quem chamam de mestres, provavelmente os pintores acadêmicos que não revelam sua maneira de trabalhar, acredita Renata. Nem mesmo os críticos de arte passaram despercebidos pelo julgamento do grupo por não serem capazes de observar o objeto de arte em si, mas se apoiarem em outros valores, como no “nome de quem assina” a obra. O grupo manifesta a busca de uma atitude crítica, além da vontade de livrar a obra de arte de sua “aura” (“um poema é um poema / uma tela é uma tela”). Ao longo do manifesto, os artistas fazem dura crítica à atitude das instituições artísticas de aceitarem apenas o que é ditado por padrões pré-estabelecidos, segundo a autora.

 

Breve história

Renata é autora da dissertação “Os salões de arte contemporânea de Campinas”, apresentada no Instituto de Artes da Unicamp em 2007. Além dela, assinam pesquisas constantes no site José Armando Pereira da Silva, Nara Vieira Duarte, Juliana de Sá Almeida Duarte, Carolina Tiemi Odashima, Lívia Diniz, Osvaldo Mariuzzo Júnior e Fernando Passos dos Santos.

Em 1957, um grupo de jovens artistas atuantes em Campinas toma o espaço restrito à arte tradicional para instalar a I Exposição de Arte Contemporânea de Campinas, no saguão do Teatro Municipal. Os artistas chegam com um manifesto, com a participação do jornalista e poeta Alberto Amêndola Heinzl, contendo os objetivos, princípios e estratégias do grupo e fazendo críticas contundentes aos espaços de arte e à forma de se fazer arte no passado. O texto foi publicado no Jornal do Centro de Ciências, Letras e Artes de Campinas, em junho de 1958.

Na opinião de Maria de Fátima, o texto tenta reproduzir o mesmo tom polêmico do Manifesto Ruptura, distribuído por integrantes do grupo concretista de São Paulo antes da inauguração de sua primeira exposição no Museu de Arte Moderna de São Paulo, em dezembro de 1952.

Após a mostra, os artistas de Campinas passaram a se reunir, dando ao grupo o nome Vanguarda. As reuniões deram origem à segunda edição da Exposição de Arte Contemporânea de Campinas, no andar térreo do Edifício Catedral.

O endereço do projeto “Arte Vanguarda em Campinas” é http://www.iar.unicamp.br/vanguardasemcampinas. Aqueles que tiverem documentos, fotos, catálogos e textos de época sobre o tema e quiserem disponibilizá-los podem entrar em contato com a equipe do projeto pelo email.



 
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