Não é comum que certos problemas práticos de patrulhamento urbano sejam tratados pela universidade brasileira. Em dissertação de mestrado, orientada pelo professor Antonio Carlos Moretti e co-orientada pela professora Margarida P. Mello, apresentada ao Departamento de Matemática Aplicada do Instituto de Matemática, Estatística e Computação Cientifica (Imecc) da Unicamp, Washington Alves de Oliveira desenvolveu um sistema que permite a implantação de rotas para o patrulhamento urbano preventivo. O objetivo do trabalho é possibilitar a melhoria da logística de operações de corporações militares ou de empresas de segurança. A metodologia foi desenvolvida com base em estudo de caso na cidade de Vinhedo, da região metropolitana da Campinas.
O pesquisador, que milita na área de segurança, estudou um aspecto do problema de planejamento do patrulhamento urbano preventivo que é o da construção de rotas a serem percorridas pelos veículos da força policial. Entre outras finalidades, a elaboração de rotas visa garantir boa visibilidade para o patrulhamento de maneira a proporcionar sensação de segurança para a população, permitir melhor localização para atendimento de ocorrências, vigiar e visitar determinados locais, estabelecimentos públicos, hospitais, escolas, evitar atos ilegais etc. O planejamento das rotas deve levar em consideração os recursos disponíveis, tais como número de veículos, garantia de agilidade e distribuição equânime do trabalho entre as viaturas utilizadas.
O produto final do trabalho desenvolvido por Oliveira é um módulo computacional capaz de automaticamente gerar rotas que atendam às necessidades determinadas pelos responsáveis pela segurança pública. Ele afirma que foi possível criar um modelo computacional que viabiliza um patrulhamento preventivo ágil e eficiente dentro de condições previamente impostas pelo administrador de segurança: “Obtivemos resultados satisfatórios na aplicação feita na cidade de Vinhedo, em que algumas rotas foram sugeridas para o serviço de segurança de patrimônios públicos sob a responsabilidade da Guarda Civil Municipal. O trabalho foi possível graças ao apoio do comandante e secretário de segurança local”.
Segundo Oliveira, o estudo conduziu à análise de outros problemas, relacionados à área de segurança pública e privada, que poderia ser beneficiada com a realização de mais pesquisas semelhantes às desenvolvidas no trabalho. Considera que os profissionais que atuam no setor de segurança têm tarefas e funções variadas a cumprir e que nas guardas municipais e nas policias estaduais é considerável o número de pessoas que necessitam de treinamento na utilização de equipamentos como veículos, armas e dispositivos para comunicações apoiados em programas computacionais.
Entre os problemas enfrentados pelos administradores da área, ele alinhava escala de serviço, distribuição e alocação de homens e veículos, alocação de sedes, postos, delegacias e batalhões, distribuição de turnos de serviços, cobertura de regiões ou locais pré-fixados e logísticas de materiais. Considera que esses problemas estão interligados e também devem ser tratados levando em conta prioridades hierárquicas, índices de ocorrências, prioridades de atendimento etc. Entende que os diversos serviços das equipes de prevenção, salvamentos, treinamento, manutenção entre outros, que são realizados ao mesmo tempo e em diversos locais em uma cidade ou estado, exigem eficiente administração para que possam ser executados de forma satisfatória.
O trabalho desenvolvido por Oliveira se atém à distribuição de veículos em rotas de cobertura em locais pré-fixados e mostra que pesquisas podem ser realizadas com grande sucesso nesta área. Se aplicadas, pondera o pesquisador, podem facilitar muito a tarefa dos administradores e conseqüentemente melhorar a qualidade dos serviços prestados por profissionais de segurança, aumentado-lhes o nível de satisfação e o dos cidadãos por eles servidos.
No estudo, o pesquisador adaptou o modelo para o Problema de Rotas de Cobertura multi-veículo (m-PRC), que consiste em um programa linear inteiro cujo tamanho e complexidade torna inviável a aplicação de métodos exatos para sua solução. Soluções sub-ótimas foram obtidas aplicando-se as heurísticas propostas por M. Hachicha e outras criadas pelo próprio pesquisador. As heurísticas foram implementadas em Matlab e sua validação, assim como a do modelo, foi feita através da resolução de problemas gerados aleatoriamente. Além disso, foi resolvido o modelo construído a partir de dados reais obtidos junto à cidade de Vinhedo.
Oliveira esclarece que, embora as heurísticas utilizadas não garantam a obtenção de soluções ótimas, em todos os testes conseguiram alcançar resultados que podem ser consideradas bons em tempo computacional aceitável. Em alguns casos foi possível mostrar que as soluções estão entre 2% a 5% do valor ótimo. No modelo, um grafo, isto é, um conjunto de vértices e arestas ligando pares de vértices, representa a região geográfica a ser patrulhada. No caso da cidade de Vinhedo, o grafo foi construído a partir do mapa digital da cidade.
Uma rota é constituída por uma seqüência alternada de nós e arestas e começa e termina na base do serviço. Os pontos de visita obrigatória são associados a vértices que devem pertencer a rotas, e os pontos de cobertura obrigatória são associados a vértices que devem estar suficientemente próximos das rotas. O objetivo final é construir rotas eficientes. “Procuramos gerar rotas de tamanho menor possível, para que cada circuito seja percorrido o maior número de vezes durante um turno de serviço. Os resultados se mostraram promissores e a análise das soluções obtidas permitirá aprimorar o modelo”, explica ele.
Estudo abre novas frentes
Oliveira diz que no mestrado utilizou no programa uma linguagem ainda lenta, mas no doutorado, que já iniciou, pretende implementá-lo em uma linguagem mais rápida, o que permitirá franquear seu uso aos administradores de segurança. E explica: “Um programa mais ágil possibilitará que o administrador tenha possibilidade de determinar rotas de acordo com as circunstâncias de cada dia, pois se sabe que as necessidades de patrulhamento durante a semana são diferentes das dos fins de semana e feriados, além do que, eventos ou ocorrências podem determinar rotas diferentes, a critério das exigências impostas pelo momento, o que exige remanejamento de viaturas. Hoje, o programa não permite ainda interação com o administrador e a definição rápida de novas rotas, além das previamente estabelecidas. “A idéia, e isso faremos no doutorado, é chegar a um programa que possa ser utilizado por qualquer administrador de acordo com os parâmetros por ele estabelecidos”.
Washington Alves de Oliveira, graduado em licenciatura matemática pela Unicamp, foi atraído para o estudo porque milita na área de segurança e conhece como as viaturas são utilizadas na segurança, sabendo das dificuldades em direcioná-las. Por isso se interessou em determinar um meio de criar rotas mais racionais de forma a melhorar os serviços oferecidos.
Ele considera que a forma de determinar rotas está pronta e independe do tamanho das regiões, embora o aumento da quantidade de dados torne o processo mais lento, o que pode ser resolvido com a utilização de uma linguagem mais eficiente.
Julga muito interessante ter levado para o Imecc a questão da segurança porque, em geral, os órgãos de segurança, principalmente da área militar, têm regras mais rígidas para disponibilizar seus dados para a comunidade, diferentemente do que acontece em alguns outros países como os EUA e Canadá, onde esses problemas são estudados pela comunidade acadêmica. Ele acredita que o pioneirismo da iniciativa deve motivar, no futuro, outros pesquisadores, possibilitando a criação de referências nacionais, o que determinará que futuros trabalhos sejam desenvolvidos de forma menos solitária.
“Leva-se sozinho o peso de propor um problema não muito discutido no meio acadêmico. Isso nos deixa sem referência, pois não existem outros trabalhos tão próximos que possam oferecer parâmetros. É um pouco solitário”, admite o pesquisador, que menciona também as dificuldades na obtenção de dados. “As pessoas e os organismos da área de segurança não estão acostumados a esse tipo de trabalho e encontram-se tolhidos por ordens legais quanto ao fornecimento de informações que esse tipo de pesquisa exige, apesar de disporem de diversos registros que possibilitam vastas pesquisas. Acredito que daqui a algum tempo as coisas se tornarão muito mais fáceis”.
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