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Luz sobre a desigualdade

MANUEL ALVES FILHO

Alexandre Gori Maia, autor do estudo: refinamento da análise acerca das desigualdades sociais existentes no país (Foto: Antoninho Perri)Estudo desenvolvido para a tese de doutoramento de Alexandre Gori Maia, defendida no Instituto de Economia (IE) da Unicamp, ajuda a lançar luz sobre a problemática da desigualdade social brasileira, a partir da proposição de uma nova configuração do espaço territorial do país. No trabalho, orientado pelo professor Waldir José de Quadros, o pesquisador explora uma metodologia de análise da estrutura social que concilia duas dimensões: “estratos sociais”, tradicionalmente definidos pelas faixas de renda per capita, e “classes ocupacionais”, determinadas pelo nível de inserção no mercado de trabalho. “O objetivo da pesquisa foi desenvolver uma ferramenta que contribuísse para ampliar a compreensão sobre o tema, visto que não é raro que municípios pertencentes a uma mesma região apresentem significativas diferenças entre si”, explica o autor.

A idéia do estudo, conforme Alexandre Gori, foi estabelecer uma metodologia que favorecesse o refinamento da análise acerca das desiguContraste em Campinas: pesquisa mostra que diferenças podem ser significativas em uma mesma cidade (Foto: Antoninho Perri) aldades sociais existentes no país. O pesquisador lembra que o indicador renda, embora seja importante, não é capaz de dar conta de revelar, por si somente, as nuances relacionadas ao tema. Além do mais, acrescenta, as regiões costumam encobrir as diferenças entre os municípios. “No Nordeste, região menos desenvolvida do país, há cidades que apresentam estruturas sociais próximas das de alguns municípios do interior de São Paulo”, compara. Para compor sua proposta metodológica, o autor da tese utilizou dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) e do Censo Demográfico, ambos executados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Na estrutura social considerada por Alexandre Gori, as classes ocupacionais foram divididas da seguinte maneira: empregadores, profissionais trabalhadores, massa trabalhadora não-agrícola, não-remunerados não-agrícolas, massa trabalhadora agrícola, não-remunerados agrícolas, sem ocupação com renda e sem ocupação sem renda (ver tabela). Pelo método de análise sugerido pelo pesquisador, a renda per capita cumpre o papel de diferenciar os níveis de bem-estar das famílias dentro de uma mesma classe ocupacional. “Esse aspecto é importante, pois mesmo entre os integrantes das classes mais abastadas, como a formada pelos chamados profissionais colarinho-branco, a parcela de pessoas com rendimento per capita não superior a R$ 296 ao mês alcança 30%”, aponta.

Tal situação se torna ainda mais dramática, de acordo com o autor da tese, quando consideradas as classes de menor prestígio social. Entre os membros da massa trabalhadora agrícola, por exemplo, 79% não possuem rendimento per capita superior a R$ 300 mensais. Entre os integrantes da massa trabalhadora não-agrícola, constituída na sua maioria pelo operariado, 62% encontram-se na mesma situação. De maneira geral, revela a pesquisa, a população brasileira apresenta “baixíssimos” níveis de rendimento. Um dado agravante é que essa renda está “pessimamente” distribuída. “Apenas para dar uma idéia dessa situação, basta citar que 46,8 milhões de pessoas sobrevivem com um rendimento per capita inferior a R$ 144”, informa Alexandre Gori.

O autor da tese esclarece que, num país como o Brasil, qualquer fator é capaz de influenciar na determinação das taxas de desigualdade social. Exatamente por isso, a estrutura social proposta na pesquisa também leva em consideração, para efeito de análise, variáveis como escolaridade, etnia e gênero. No que se refere à escolaridade, destaca o pesquisador, somente 14% da população possui 3º grau completo ou incompleto. A maioria desse contingente (cerca de 80%) encontra-se nas classes ocupacionais constituídas pelos empregadores e profissionais. “Nas classes menos abastadas, como a constituída pela massa trabalhadora agrícola, o número de integrantes sem escolaridade é uma vez e meia superior ao daqueles que têm 2º grau ou mais”.

A avaliação de tais dados é importante, no entender de Alexandre Gori, porque revela não apenas a situação atual desses brasileiros, mas as perspectivas que eles têm de melhorar suas condições. “Obviamente, as perspectivas são muito distintas. Uma pessoa de uma categoria ocupacional mais elevada e com diploma universitário, ainda que esteja desempregada, tem melhores perspectivas do que uma que tem uma ocupação de baixo padrão social e baixo nível de escolaridade”, confronta. A configuração do espaço nacional a partir de estruturas sociais municipais permite, segundo o pesquisador, determinar o grau de desenvolvimento de uma localidade. De modo geral, a pesquisa identificou alguns padrões espaciais mais ou menos conhecidos. Conforme o estudo, a área mais contígua de municípios urbanos ocorre próxima aos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e sudoeste de Minas Gerais.

Os municípios rurais mais desenvolvidos, destaca o autor do trabalho, predominam na Zona da Mata, Agreste Nordestino e em áreas de transição entre localidades urbanas e rurais nas regiões Centro-Oeste, Sul e Sudeste. “Os municípios rurais menos desenvolvidos prevalecem nas áreas do Sertão nordestino, floresta amazônica e na mesorregião da Grande Fronteira do Mercosul”. Uma importante indicação da metodologia desenvolvida por Alexandre Gori refere-se à relevância do investimento na estrutura dos municípios. “O município que dispõe de estrutura desenvolvida não oferece apenas oportunidade de geração de renda, mas também a perspectiva de melhoria de uma série de indicadores de bem-estar social que estão associados aos padrões de vida das estruturas mais desenvolvidas. Quando a estrutura social é precária, a perspectiva dessas localidades fica comprometida. Isso se torna especialmente claro quando verificamos como o agronegócio criou bolsões de prosperidade no Centro-Oeste. Alguns municípios da região apresentam indicadores comparáveis aos de alguns municípios do Oeste Paulista”.

De acordo com Alexandre Gori, a metodologia proposta por ele não deve ser aplicada isoladamente, a exemplo daquelas que levam em consideração apenas a dimensão econômica. Como dito anteriormente, quando associada a outras classificações, ela ajuda a refinar a reflexão em torno das desigualdades sociais. Ainda segundo o pesquisador, desde que haja informações disponíveis, é possível aplicar uma lupa sobre o método, de modo a identificar, por exemplo, as diferenças existentes entre os bairros que compõem um município.




 

 

 
 
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