Estudo desenvolvido para a tese de doutoramento de Alexandre Gori Maia, defendida no Instituto de Economia (IE) da Unicamp, ajuda a lançar luz sobre a problemática da desigualdade social brasileira, a partir da proposição de uma nova configuração do espaço territorial do paÃs. No trabalho, orientado pelo professor Waldir José de Quadros, o pesquisador explora uma metodologia de análise da estrutura social que concilia duas dimensões: “estratos sociaisâ€, tradicionalmente definidos pelas faixas de renda per capita, e “classes ocupacionaisâ€, determinadas pelo nÃvel de inserção no mercado de trabalho. “O objetivo da pesquisa foi desenvolver uma ferramenta que contribuÃsse para ampliar a compreensão sobre o tema, visto que não é raro que municÃpios pertencentes a uma mesma região apresentem significativas diferenças entre siâ€, explica o autor.
A idéia do estudo, conforme Alexandre Gori, foi estabelecer uma metodologia que favorecesse o refinamento da análise acerca das desigu
aldades sociais existentes no paÃs. O pesquisador lembra que o indicador renda, embora seja importante, não é capaz de dar conta de revelar, por si somente, as nuances relacionadas ao tema. Além do mais, acrescenta, as regiões costumam encobrir as diferenças entre os municÃpios. “No Nordeste, região menos desenvolvida do paÃs, há cidades que apresentam estruturas sociais próximas das de alguns municÃpios do interior de São Pauloâ€, compara. Para compor sua proposta metodológica, o autor da tese utilizou dados da Pesquisa Nacional por Amostra de DomicÃlios (PNAD) e do Censo Demográfico, ambos executados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e EstatÃstica (IBGE).
Na estrutura social considerada por Alexandre Gori, as classes ocupacionais foram divididas da seguinte maneira: empregadores, profissionais trabalhadores, massa trabalhadora não-agrÃcola, não-remunerados não-agrÃcolas, massa trabalhadora agrÃcola, não-remunerados agrÃcolas, sem ocupação com renda e sem ocupação sem renda (ver tabela). Pelo método de análise sugerido pelo pesquisador, a renda per capita cumpre o papel de diferenciar os nÃveis de bem-estar das famÃlias dentro de uma mesma classe ocupacional. “Esse aspecto é importante, pois mesmo entre os integrantes das classes mais abastadas, como a formada pelos chamados profissionais colarinho-branco, a parcela de pessoas com rendimento per capita não superior a R$ 296 ao mês alcança 30%â€, aponta.
Tal situação se torna ainda mais dramática, de acordo com o autor da tese, quando consideradas as classes de menor prestÃgio social. Entre os membros da massa trabalhadora agrÃcola, por exemplo, 79% não possuem rendimento per capita superior a R$ 300 mensais. Entre os integrantes da massa trabalhadora não-agrÃcola, constituÃda na sua maioria pelo operariado, 62% encontram-se na mesma situação. De maneira geral, revela a pesquisa, a população brasileira apresenta “baixÃssimos†nÃveis de rendimento. Um dado agravante é que essa renda está “pessimamente†distribuÃda. “Apenas para dar uma idéia dessa situação, basta citar que 46,8 milhões de pessoas sobrevivem com um rendimento per capita inferior a R$ 144â€, informa Alexandre Gori.
O autor da tese esclarece que, num paÃs como o Brasil, qualquer fator é capaz de influenciar na determinação das taxas de desigualdade social. Exatamente por isso, a estrutura social proposta na pesquisa também leva em consideração, para efeito de análise, variáveis como escolaridade, etnia e gênero. No que se refere à escolaridade, destaca o pesquisador, somente 14% da população possui 3º grau completo ou incompleto. A maioria desse contingente (cerca de 80%) encontra-se nas classes ocupacionais constituÃdas pelos empregadores e profissionais. “Nas classes menos abastadas, como a constituÃda pela massa trabalhadora agrÃcola, o número de integrantes sem escolaridade é uma vez e meia superior ao daqueles que têm 2º grau ou maisâ€.
A avaliação de tais dados é importante, no entender de Alexandre Gori, porque revela não apenas a situação atual desses brasileiros, mas as perspectivas que eles têm de melhorar suas condições. “Obviamente, as perspectivas são muito distintas. Uma pessoa de uma categoria ocupacional mais elevada e com diploma universitário, ainda que esteja desempregada, tem melhores perspectivas do que uma que tem uma ocupação de baixo padrão social e baixo nÃvel de escolaridadeâ€, confronta. A configuração do espaço nacional a partir de estruturas sociais municipais permite, segundo o pesquisador, determinar o grau de desenvolvimento de uma localidade. De modo geral, a pesquisa identificou alguns padrões espaciais mais ou menos conhecidos. Conforme o estudo, a área mais contÃgua de municÃpios urbanos ocorre próxima aos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e sudoeste de Minas Gerais.
Os municÃpios rurais mais desenvolvidos, destaca o autor
do trabalho, predominam na Zona da Mata, Agreste Nordestino
e em áreas de transição entre localidades urbanas e rurais
nas regiões Centro-Oeste, Sul e Sudeste. “Os municÃpios
rurais menos desenvolvidos prevalecem nas áreas do Sertão
nordestino, floresta amazônica e na mesorregião da Grande
Fronteira do Mercosulâ€. Uma importante indicação da metodologia
desenvolvida por Alexandre Gori refere-se à relevância do
investimento na estrutura dos municÃpios. “O municÃpio que
dispõe de estrutura desenvolvida não oferece apenas oportunidade
de geração de renda, mas também a perspectiva de melhoria
de uma série de indicadores de bem-estar social que estão
associados aos padrões de vida das estruturas mais desenvolvidas.
Quando a estrutura social é precária, a perspectiva dessas
localidades fica comprometida. Isso se torna especialmente
claro quando verificamos como o agronegócio criou bolsões
de prosperidade no Centro-Oeste. Alguns municÃpios da região
apresentam indicadores comparáveis aos de alguns municÃpios
do Oeste Paulistaâ€.
De acordo com Alexandre Gori, a metodologia proposta por ele não deve ser aplicada isoladamente, a exemplo daquelas que levam em consideração apenas a dimensão econômica. Como dito anteriormente, quando associada a outras classificações, ela ajuda a refinar a reflexão em torno das desigualdades sociais. Ainda segundo o pesquisador, desde que haja informações disponÃveis, é possÃvel aplicar uma lupa sobre o método, de modo a identificar, por exemplo, as diferenças existentes entre os bairros que compõem um municÃpio.

