Inteligência
artificial
Alunos
fazem exercícios com brinquedos Lego para aplicar
conceitos sofisticados de Robótica
PAULO
C. NASCIMENTO
Pequenos
veículos construídos com peças do
jogo Lego, de dimensões próximas à
de uma caixa de sapatos, movem-se sozinhos em diferentes
direções no chão de uma sala de aula
na Unicamp. Dotados de rodas, garras e guindastes, desviam-se
de paredes e de outros obstáculos, e executam tarefas
como pegar cubos de isopor e transportá-los de
um local para outro.
O
que parece brincadeira de criança é, de
fato, o exercício acadêmico da aplicação
de sofisticados conceitos de inteligência artificial
para a operação de robôs autônomos,
executado por alunos da disciplina eletiva de Robótica:
Sistemas Sensorial e Motor, oferecida desde o ano passado
pelo Instituto de Computação (IC) para graduandos
dos cursos de Ciência da Computação
e Engenharia de Computação, e para pós-graduandos
em Ciência da Computação.
A
montagem dos robôs, a partir de conjuntos fabricados
pela empresa Lego, constitui a parte prática da
disciplina, concebida com a proposta de introduzir nos
princípios básicos da Robótica os
alunos interessados no tema.
Controladas
por computador, as engenhocas montadas pelos estudantes
têm inteligência para tomar decisões
e solucionar situações a que são
submetidas. Algumas são de natureza simples
virar à direita ou à esquerda para prosseguir
em seu deslocamento após detectar um obstáculo
à fren-te , outras um pouco mais complexas,
como se deslocar sobre uma mesa e parar próximo
da borda sem cair no chão.
Podem
ainda protagonizar uma proeza heróica: identificar
e resgatar humanos amigos (na verdade blocos
de isopor, coloridos para auxiliar o robô na identificação)
do interior de uma arena, onde se misturam humanos
inimigos e outros robôs que precisam enfrentar.
Embora
os sistemas montados pelos alunos sejam, de certa forma,
simples, possibilitam trabalhar os princípios fundamentais
da Robótica de maneira concreta, ou seja, a lógica
de programação envolvida no funcionamento
do robozinho é a mesma aplicada em um aparato que
execute operações mais complexas,
esclarece o professor Luiz Marcos Garcia Gonçalves,
responsável pela disciplina, ministrada ao longo
do segundo semestre.
Cérebro
Depois de prontos, os robôs movem-se sozinhos
por meio de rodas ou esteiras iguais às de um trator,
acionadas por motores alimentados por baterias. Um pequeno
computador acoplado a sua estrutura processa o programa
operacional elaborado pelos alunos e, como um cérebro,
controla seus movimentos a partir de informações
fornecidas por sensores de toque e de luz.
Esses
dispositivos equivalentes à visão
ou às sensações táteis humanas
permitem aos autômatos reconhecer o ambiente
em que se encontram, deslocar-se em diferentes direções
e, com a ajuda do programa, decidir qual a melhor maneira
de transpor um obstáculo, seja simplesmente des-viando
dele ou providenciando a remoção por meio
de alguma ferramenta que transportem.
Submetidos
a testes de desempenho durante o semestre, os veículos
devem ser capazes de executar com sucesso tarefas previamente
especificadas e com diferentes graus de dificuldade. O
nível de exigência dessas provas (que incluem
uma competição de robôs no encerramento
do curso) acompanha a evolução das aulas
e permite avaliar a compreensão e a correta aplicação
dos conteúdos teóricos de Computação,
Mecânica e Eletrônica proporcionados pela
disciplina, conforme Luiz Gonçalves.
Empolgação
A novidade oferecida pelo IC empolgou veteranos
e calouros. Para Raphael Marcos Menderico, primeiranista
de Engenharia de Computação, a disciplina
lhe permitiu aprofundar seus conhecimentos em programação
de robôs um assunto que o apaixona
mais cedo do que pensava na Universidade. Segundo ele,
a ênfase na prática colaborou para que assimilasse
rapidamente o conteúdo teórico, apesar de
sua complexidade.
Sheila
Moraes de Almeida, terceiranista de Ciên-cia da
Computação, conta que a disciplina ampliou
suas oportunidades de desenvolver experimentos em inteligência
artificial, área em que já atua com projetos
de iniciação científica e na qual
pretende permanecer como pesquisadora após a graduação.
A
atividade prática torna os conceitos de Robótica
bastante palpáveis para os alunos, e enriquece
a aprendizagem e construção do conhecimento,
argumenta João Vilhete Viegas d´Abreu, professor-assistente
da disciplina. É muito diferente do que apenas
assistir ao funcionamento do robô em uma simulação
abstrata na tela do computador, observa.
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A relação homem-máquina
A
Robótica é uma área multidisciplinar
que se vale dos conhecimentos de outras ciências,
como Engenharia Mecânica, Engenharia Elétrica
e Inteligência Artificial, para a criação
de robôs. A maioria dessas máquinas é
utilizada em linhas de produção industrial,
onde repetem infinitamente e com milimétrica
precisão uma série de operações
previamente programadas.
Entretanto,
cientistas em diferentes centros de pesquisa dedicam
grandes esforços ao desenvolvimento de uma geração
mais avançada de autômatos, os robôs
inteligentes. São exemplos de iniciativas
concretas nesse fascinante campo científico:
o robô-cobra projetado por engenheiros da Nasa
(a agência espacial norte-americana) para trabalhar
em situações de ausência de gravidade;
o cão robótico Aibo lançado pela
Sony; ou o robô doméstico criado pela NEC
para servir de companhia principalmente a pessoas de
terceira idade que vivem sozinhas, com sensores que
lhe permitem desempenhar diversas tarefas, como reconhecer
mais de uma centena de comandos de voz e frases de seus
donos.
Os
robôs inteligentes do futuro, contudo,
serão controlados por redes neurais artificiais
conjuntos de microchips de silício que
procuram imitar a organização e o funcionamento
do cérebro. Capazes de tomar decisões
cada vez mais complexas, poderão até demonstrar
emoções e sentimentos na interação
com os humanos, em uma relação homem-máquina
freqüentemente explorada pelas artes.
A
literatura de ficção científica
e o cinema já produziram inúmeras obras
sobre o tema, como o clássico O Homem Bicentenário,
de Isaac Asimov (1920-1992), autor de antologias sobre
os robôs. O cult movie Blade Runner,
do diretor Ridley Scott, abordou nos anos 80 a conflituosa
relação entre humanos e replicantes
robôs avançadíssimos desenvolvidos
com recursos de biotecnologia, que desejam ter sentimentos
e ser como os seus criadores.
Mais
recentemente, Inteligência Artificial, filme de
Steven Spielberg, tratou das aventuras de um garoto-robô
construído com a capacidade de amar seus donos
a ponto de considerá-los seus pais.
Respeitadas
as devidas proporções, o que os alunos
da Unicamp fazem nada mais é que montar suas
cria-turas cibernéticas com os mesmos conceitos
básicos da inteligência artificial que
governa todos esses engenhos robóticos, os já
materia-lizados pela ciência e aqueles que, por
enquanto, povoam o imaginário de escritores e
roteiristas de cinema. Apenas por enquanto.
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