Unicamp
Jornal da Unicamp
Baixar versão em PDF Campinas, 01 de outubro de 2012 a 07 de outubro de 2012 – ANO 2012 – Nº 540Acesso contempla
mérito acadêmico
e ações afirmativas
Inovações marcam sistema de ingresso aos cursos de graduação da Universidade
Em menos de três anos, o sistema de ingresso aos cursos de graduação na Unicamp apresentou duas inovações de grande impacto: reformulação nas provas do vestibular e implantação do Programa de Formação Interdisciplinar Superior (ProFIS). A estes, somaram-se outros dois importantes passos, desta vez voltados para estudantes estrangeiros: adesão ao Programa Estudante Convênio–Graduação (PEC-G) e participação no Programa Emergencial Pró-Haiti em Educação Superior. Juntas, estas iniciativas consolidam um modelo que reúne mérito acadêmico, ação afirmativa e expansão da internacionalização.
As mudanças no vestibular tiveram como objetivo promover a atualização acadêmica e programática, além de aprimorar a seletividade do processo seletivo. Aprovadas em dezembro de 2009, as alterações entraram em vigor no vestibular 2011. Com o novo modelo, a avaliação de leitura e escrita a partir da prova de redação foi ampliada. O candidato passou a produzir três textos de gêneros diversos, todos de execução obrigatória, a partir de textos-fonte. No modelo anterior, o candidato selecionava uma de três propostas e preparava apenas um texto.
“O novo formato reforçou a integração entre leitura e escrita e ampliou as possibilidades de avaliação, aumentando a confiabilidade da seleção para níveis apropriados para uma prova de pré-seleção, como é a nossa primeira fase”, pondera o coordenador da Comissão Permanente para os Vestibulares (Comvest), Maurício Kleinke. Além disso, como os gêneros dos textos a serem elaborados podem variar muito, reduziu-se a possibilidade do treinamento em apenas uma proposta de texto, contribuindo para que a formação nessa área, no ensino médio, buscasse também se aprimorar.
Já na prova de Conhecimentos Gerais o número de questões a serem respondidas também mudou, passando de 12 dissertativas para 48 de múltipla escolha. “Essa mudança ampliou a diversidade de conceitos a serem avaliados e melhorou o processo seletivo, diminuindo os efeitos de sorte ou azar”, analisa Kleinke. As provas da segunda fase foram agrupadas de maneira a estimular a avaliação integrada do conhecimento e a interdisciplinaridade na formulação das questões. O novo modelo passou a aplicar três provas de 24 questões dissertativas, realizadas durante três dias consecutivos, com quatro horas a cada dia.
Os dados disponíveis indicam que as mudanças implantadas tiveram impacto positivo. O número de estudantes da rede pública matriculados em cursos da Unicamp bateu recorde já no vestibular de 2011. Foram 1.111 alunos que cursaram todo o ensino médio em escolas da rede pública, o que equivale a 32,1% dos matriculados naquele ano, contra 1.003 em 2010, ou 29,4% dos admitidos naquele período. Praticamente o mesmo índice foi alcançado no vestibular de 2012, quando 32% dos alunos matriculados na graduação haviam feito o ensino médio em escolas públicas. Já entre os inscritos, o percentual de estudantes da rede pública atingiu a marca de 27% em 2011 e 28% em 2012. O vestibular 2012 registrou recorde de inscritos, com 61.500 candidatos, o que confirma a Unicamp como referência nacional.
As mudanças no vestibular vieram se somar ao Programa de Ação Afirmativa e Inclusão Social (PAAIS). Implantado em 2005, o programa confere a estudantes que tenham cursado o ensino médio integralmente na rede pública, 30 pontos adicionais à nota final da segunda fase e mais 10 pontos aos candidatos autodeclarados negros e indígenas que também tenham feito o ensino médio em escolas públicas. Em 2012, os candidatos deste segmento representaram 8,3% dos inscritos e 8,9% dos matriculados.
Outra medida significativa foi a implantação do ProFIS, uma das respostas da Universidade em relação à inovação curricular e à igualdade no acesso e permanência no ensino superior. Aprovado em setembro de 2010, o programa criou 120 novas vagas de graduação destinadas aos melhores alunos das 94 escolas públicas de ensino médio em Campinas. A seleção ocorreu pela nota obtida no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e a primeira turma ingressou já em 2011.
“O ProFIS constitui uma iniciativa inédita para selecionar alunos que eram excluídos ou tinham chance reduzida no sistema tradicional de seleção, sem abdicar do mérito acadêmico”, define o pró-reitor de Graduação e idealizador do programa, Marcelo Knobel. Em 2008 e 2009, por exemplo, 55% das escolas públicas da cidade não tiveram nenhum aluno matriculado na Unicamp.
Além de criar uma nova forma de ingresso na universidade pública, o ProFIS visa oferecer aos estudantes uma visão geral do conhecimento universitário, antes de se decidirem por uma carreira específica. Para isso, durante dois anos os alunos cursam disciplinas de caráter amplo, em todas as áreas do conhecimento. “São cursos especialmente organizados para que os estudantes adquiram uma formação cultural e científica, além de se preparem para escolher a sua área específica de formação acadêmica e profissional”, diz o coordenador do ProFIS, Francisco Gomes. Após esses dois anos iniciais, os alunos podem escolher um curso de graduação na Unicamp para ingressar sem necessidade de prestar o vestibular.
A primeira seleção, em 2011, trouxe alunos de 76 das 94 escolas da cidade, de um total de 705 inscrições válidas. Já em 2012 foram selecionados candidatos de 82 escolas, de 925 inscrições válidas. “O ProFis está mudando minha visão de mundo”, garante Alexandre Lorca Serafini, de 20 anos. Ele ingressou na primeira turma, em 2011, depois de cursar o ensino médio na Escola Estadual Jamil Gadia, que fica no Parque da Figueira.
“A mudança é muito grande, porque na escola o ensino era muito fraco”, diz o estudante. “Mas aqui os professores são incríveis, estou aprendendo o que é estudar de verdade, a interpretar textos, a argumentar cientificamente e até a conversar melhor”, conta. Fã de Steve Jobs, a ponto de ter lido duas vezes a biografia do criador da Apple, ele já decidiu que vai fazer Engenharia da Computação.
No intuito de viabilizar a permanência dos alunos e a conclusão dos cursos, o programa oferece uma ampla rede de assistência estudantil que inclui ajuda de custo com a alimentação dentro do campus e bolsas de estudo para todos, no valor de R$ 670,00. Além disso, no início de 2011 foi oferecida uma turma específica da Oficina de autorregulação da aprendizagem para os alunos desenvolverem habilidades de estudo, entre outras ações. “Desta forma, o curso busca não só possibilitar a equidade no acesso, mas principalmente a permanência no ensino superior”, diz o coordenador do ProFIS.
Balanço
Para acompanhar a implantação do programa, seus resultados e impactos, foi desenhada uma metodologia de avaliação continuada que tentará seguir os beneficiários por pelo menos uma década. Essa função vem sendo desempenhada pelo Núcleo de Estudos de Políticas Públicas (NEPP), sob a coordenação da pesquisadora Ana Maria Carneiro, que vem produzindo informações relevantes para a gestão do programa. Um balanço de resultados preliminares dos dois primeiros anos de atividades aponta um saldo positivo. Segundo Ana Maria, dois objetivos foram plenamente alcançados. “O primeiro foi a própria implantação do programa num prazo exíguo, e o segundo foi a inclusão social no ingresso ao ensino superior”, explica.
No que se refere ao aspecto raça/cor/etnia, cerca de 40% dos alunos do ProFIS são não brancos (pardos, pretos e indígenas), um percentual 2,7 vezes superior ao percentual de matriculados através do vestibular e ligeiramente acima da distribuição de raça/cor da população de 18 a 24 anos do Estado de São Paulo, que possui 38% de indivíduos não brancos segundo dados do Censo 2010.
“Em relação ao histórico escolar, além de terem cursado o ensino médio completo em escola pública, o que é um pré-requisito do programa, 92,5% cursaram também o ensino fundamental na rede pública”, constatou Ana Maria. O ProFIS também ampliou as admissões de egressos da rede pública na Unicamp em cerca de 2,2% em 2011 e em 3,4% em 2012.
Em relação à renda familiar mensal, os alunos matriculados do ProFIS apresentam renda média 3,6 vezes menor que a renda média da população de 18 a 24 anos do Estado de São Paulo com acesso ao ensino superior. A renda dos alunos do ProFIS é também bastante inferior à renda dos demais alunos da Unicamp. Enquanto a maioria dos alunos do ProFIS tem renda mensal familiar de até 5 salários mínimos (82,4% em 2011 e 74,2% em 2012), estes percentuais entre os alunos que ingressaram pelo vestibular são 60,4% em 2012 e de 82,3% entre os que ingressaram pelo vestibular usando o PAAIS.
Atenção especial vem sendo dada ao quesito “permanência dos alunos”. Em relação à primeira turma, dos 120 matriculados, 22 saíram até junho de 2012, significando, portanto, uma taxa de evasão de 18,3%, o que estaria dentro dos níveis médios de evasão da Unicamp (entre 15% e 20%). Destes 22, pelo menos 7 ingressaram em algum curso de graduação regular, sendo 6 deles na própria Unicamp através do vestibular, o que não deixa de ser um resultado positivo do programa.
As ações voltadas para acesso à graduação envolvem ainda outras duas iniciativas destinadas a estudantes estrangeiros. O Programa Emergencial Pró-Haiti em Educação Superior, desenvolvido em parceria com o Ministério da Educação, permite o ingresso de estudantes do Haiti para uma graduação “sanduíche” em diversas áreas, com duração de um ano e meio e bolsa de R$ 750 mensais da Capes. O acordo visa contribuir na reconstrução daquele país, arrasado pelo terremoto de janeiro de 2010. Desde o ano passado, 41 jovens haitianos passaram a estudar na Unicamp.
A outra iniciativa diz respeito à adesão da Unicamp ao Programa Estudante Convênio–Graduação (PEC-G), um dos instrumentos de cooperação que o governo brasileiro oferece para outros países em vias de desenvolvimento, especialmente da África e da América Latina. Atualmente, estão matriculados 30 estudantes provenientes de 13 países: 3 de Guiné Bissau, 3 de Angola, 7 de Cabo Verde, 1 do Congo, 1 da Argentina, 1 da Bolívia, 1 da Costa Rica, 5 do Equador, 1 do Haiti, 1 do Panamá, 1 da Nicarágua, 1 da Venezuela e 4 do Paraguai.