Unicamp
Jornal da Unicamp
Baixar versão em PDF Campinas, 05 de novembro de 2012 a 11 de novembro de 2012 – ANO 2012 – Nº 545Nanopartículas
incorporam fármaco
Pesquisador consegue carreamentoconjunto do gene e do medicamento
O câncer converteu-se em um problema de saúde pública mundial. É a doença genética responsável pelo maior número de mortes em países desenvolvidos e a segunda maior causa mortis em países em desenvolvimento. Dentre os diversos tipos de câncer, o de mama e o de próstata se destacam por serem dos mais incidentes na população mundial.
Novas terapias vêm sendo desenvolvidas, entre elas a terapia gênica, que corresponde a entregar o material genético necessário nas células doentes, e o carreamento de fármacos, que corresponde à entrega direta do fármaco ao seu alvo, evitando possíveis efeitos colaterais.
Para viabilizar o transporte do material genético e dos fármacos nessas terapias, podem-se utilizar os chamados Carreadores Lipídicos Nanoestruturados (CLN) e as Nanopartículas Lipídicas Sólidas (NLS), nanopartículas formadas por lipídios, desenvolvidas para função de carregar moléculas com atividade biológica, como material genético, fármacos e proteínas às células alvo de forma efetiva e segura.
Em trabalho desenvolvido no Laboratório de Biomembranas, do Departamento de Bioquímica do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, o biotecnólogo Allan Radaic, orientado pela professora Eneida de Paula, realizou pesquisas com os objetivos de desenvolver e aperfeiçoar um novo método de produção de CLN e de NLS, chamado de extrusão de microemulsão, e de produzir partículas capazes de carrear de forma conjunta genes e fármacos.
Nos casos estudados por ele, envolvendo cânceres de próstata e mama, foram considerados o denominado gene codificante para PTEN e o fármaco mitoxantrona. Os resultados experimentais mostraram que essas nanopartículas foram capazes de incorporar o fármaco mitoxantrona de forma eficiente e de interagir com o material genético portador do gene codificante para PTEN, protegendo-o da ação de enzimas degradadoras de DNA.
O pesquisador constatou também que o carreamento concomitante do fármaco mitoxantrona e do gene da PTEN diminui a viabilidade celular em linhagens de câncer de mama (MCF-7) e de próstata (PC-3), sem que ocorram efeitos na viabilidade de linhagem celular não cancerígena (3T3).
O método utilizado por Allan inova na produção laboratorial, isto é, em pequena escala, das partículas carreadoras, o que viabiliza economicamente as pesquisas. Mas a diferenciação maior do trabalho está no fato de ter conseguido o carreamento conjunto do gene e do fármaco, que foi crucial ao vencer a resistência ao fármaco nas células do câncer da mama. Esta simultaneidade não encontra paralelo na literatura.
A propósito dos resultados, ele esclarece que a eficiência do método é evidenciada pela baixa viabilidade das células de câncer após o tratamento in vitro, conseguindo resultados promissores em comparação com os da literatura. O objetivo do estudo foi o de contribuir para o desenvolvimento dessas novas terapias que precisam ainda vencer uma série de barreiras para que se tornem viáveis.
Origem
As células do corpo humano se multiplicam normalmente segundo determinada taxa de crescimento. O câncer ocorre quando há multiplicação exagerada das células, em decorrência da falta ou excesso de determinados proteínas. A terapia gênica se baseia em levar o gene faltante ou barrar as proteínas que se formam em excesso nas células doentes. Os cânceres da próstata e da mama podem se manifestar por deficiência de certas proteínas, dentre as quais, a proteína PTEN se destaca por ter a função de controlar a multiplicação das células.
Com a deleção do gene codificante para PTEN do genoma, as células podem se multiplicar sem restrição e, então, originar o câncer. Neste caso, o tratamento pode ocorrer pela reposição do gene deletado, o que leva à recomposição da proteína em falta, decorrendo do processo a morte induzida da célula cancerígena, denominada apoptose.
Etapas
O gene para proteína PTEN se liga à superfície das partículas lipídicas enquanto que o fármaco selecionado (mitoxantrona) fica retido no seu interior, podendo ambos serem conduzidos especificamente às células cancerígenas. Essas partículas são constituídas por lipídios e um detergente, que podem estar em proporções variadas, segundo formulações adequadas, o que lhes confere características bioquímicas e biológicas diferentes.
O primeiro passo do pesquisador foi dedicar-se ao desenvolvimento de um método para produção dessas partículas em escala reduzida, denominada extrusão de microemulsão. O processo viabiliza a produção em pequenas quantidades de partículas com características diversas, permitindo testar a eficiência de várias formulações diferentes. No decorrer do desenvolvimento do método de fabricação, a pesquisa concentrou-se em duas formulações de nanopartículas lipídicas (NLS e CLN) que se revelaram de maior eficiência carreadora. “Meu trabalho centrou-se principalmente nisso”, diz ele.
Allan explica que muitas das nanopartículas lipídicas já desenvolvidas e descritas na literatura não conseguem, ainda, realizar a sua função de forma eficiente, o que determina a necessidade de testar novas formulações. Esses testes se viabilizam com a produção de pequenas quantidades, caso do método desenvolvido, devido à diminuição dos custos de produção de cada formulação.
Nessa procura, o pesquisador foi levado a descobrir que uma das partículas produzidas poderia carrear um gene e um fármaco simultaneamente e que essa tripla combinação (nanopartícula, gene e fármaco) permite vencer a resistencia da célula à ação do fármaco. Uma das limitações da quimioterapia é a de que, depois de varias aplicações, pode se desenvolver um câncer resistente aos fármacos utilizados e os resultados mostraram que a administração simultânea do gene e do fármaco leva à quebra dessa resistência.
Ao final do estudo in vitro ele pôde concluir que é possível diminuir a viabilidade das células de câncer da próstata apenas carreando o gene na NLS. No caso do câncer da mama resistente ao fármaco mitoxantrona, há necessidade de carrear simultaneamente gene e fármaco, daí a importância do desenvolvimento de uma partícula que consiga simultaneamente unir-se aos dois. E foi exatamente este achado que ele considerou inovador.
Publicação
Dissertação: “Desenvolvimento de nanopartículas lipídicas para carreamento conjunto do gene para pten e mitoxantrona em células de câncer de mama e de próstata”
Autor: Allan Radaic
Orientadora: Eneida de Paula
Unidade: Instituto de Biologia (IB)