Edição nº 545

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 05 de novembro de 2012 a 11 de novembro de 2012 – ANO 2012 – Nº 545

Resíduo é usado
em tratamento de esgoto



Um resíduo descartado pelas indústrias de transformação mineral foi empregado com êxito durante experimento para tratamento natural de esgoto na Unicamp. No estudo conduzido pelo agrônomo Delci Magalhães Poli, os resíduos da bauxita serviram como suporte para que vegetais cultivados em tanques aquáticos atuassem na remoção de impurezas do esgoto doméstico. O sistema, eficiente e de baixo custo, foi desenvolvido pelo agrônomo como parte de seu mestrado defendido junto ao Instituto de Geociências (IG).

A bauxita é uma das principais matérias-primas para a fabricação de alumínio, abrasivos em geral, cimento, produtos quimicos e metalúrgicos. No Brasil, país que possui as maiores reservas mundiais deste material, os resíduos ou crostas da bauxita ainda são descartados de maneira inadequada por muitas indústrias, revela o pesquisador Delci Poli. “Nós utilizamos a crosta da bauxita como um substrato para fixação das raízes dos vegetais que vão atuar no tratamento do esgoto”, explica.

De acordo com ele, seu estudo simulou o tratamento de esgoto em tanques aquáticos, comumente conhecidos como “leitos cultivados construídos” ou “wetlands”, do termo em inglês cuja tradução livre é “terra úmida”. “Este tipo de tratamento de esgoto pode utilizar diferentes meios de fixação, como areia, bambus, plásticos ou pedra brita. Empregamos o resíduo da bauxita porque é um material que até então não foi especificamente retirado da natureza para este objetivo, ao contrário da brita, por exemplo. Ademais, este resíduo ainda não tem uma destinação correta”, justifica o estudioso.

Remoção de nutrientes

Além da fixação das raízes dos vegetais, o substrato utilizado no estudo se mostrou eficiente para a retirada satisfatória de nutrientes presentes no esgoto.  “A remoção de nutrientes é importante para evitar a multiplicação de algas, bactérias e vegetais aquáticos, que poderiam causar poluição no ambiente”, informa Delci Poli.

“Em diversas situações do tratamento de esgoto convencional acontece de haver redução de matéria orgânica, mas ela não é acompanhada, muitas vezes, pela redução de nutrientes, como o fósforo e nitrogênio. E uma vez que são lançados estes nutrientes, há incentivo de todo um aumento de massa aquática vegetal, causando poluição”, detalha.

Ao contrário de alguns sistemas convencionais, o ‘wetland’ promove a retirada de matéria orgânica, mas também está focado na redução de nutrientes. Deste modo, evita-se, por exemplo, o processo de eutrofização nos cursos d’água, fenômeno caracterizado pelo aumento de nutrientes que favorecem o desenvolvimento de organismos poluidores no ambiente aquático.

Passivo

O trabalho foi orientado pelo engenheiro José Teixeira Filho, docente convidado do IG e diretor da Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri) da Unicamp. “A pesquisa de Delci vem na perspectiva de buscar alternativas para um dos principais problemas sociais do país, que é o tratamento de esgoto. Hoje o Brasil tem muita uma dificuldade em enfrentar isso; e o passivo é impressionante”, situa o orientador, que coordena na Unicamp a linha de pesquisa Recursos Hídricos.

Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) publicada ano passado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) apontam que pouco mais da metade dos domicílios do país - 54,9% - são beneficiados com a coleta de esgoto. Neste contexto, o sistema proposto poderia ser empregado, principalmente, como alternativa viável para o tratamento de pequenos volumes de efluentes gerados em comunidades isoladas, condomínios, atividades no meio rural, escolas e indústrias.

“Conseguimos chegar a situações de tratamento de esgoto tão boas quanto o de outros processos. A vantagem é que este sistema não exige mão de obra especializada, apresenta baixo valor de implantação, operação e manutenção, e utiliza como substrato um material de custo muito baixo”, confirma Teixeira Filho.

Empecilho

Por outro lado, pondera o orientador, o principal empecilho no país para a implementação de sistemas como estes, utilizando o modelo de leitos cultivados, ainda é a falta de critérios, que determinariam, por exemplo, os parâmetros e as configurações de projetos. “Há dificuldade em aceitar os ‘wetlands’ porque o país não dispõe de critérios para projetos. Existem experimentos eficientes e viáveis em todo o mundo utilizando estes sistemas”, aponta.

“Neste estudo nós estamos preocupados, também, com a questão social, ou seja, em como a sociedade pode incorporar este conhecimento, adquirido a partir da compreensão da ciência básica. O próximo passo será buscar critérios de projetos por meio do desenvolvimento de ciência aplicada para implementação de plantas de tratamento de esgotos na área de engenharia”, propõe. 

 

Publicação

Dissertação: “Leitos cultivados utilizando crostas de eletrofusão da bauxita”
Autor: Delci Magalhães Poli
Orientador: José Teixeira Filho
Unidade: Instituto de Geociências (IG)