Edição nº 626

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 25 de maio de 2015 a 07 de junho de 2015 – ANO 2015 – Nº 626

Telescópio


Captando 
intenções no cérebro

Pesquisadores ligados à Universidade do Sul da Califórnia e ao Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) descrevem, na revista Science, como um implante de eletrodos no cérebro de um paciente tetraplégico registrou as intenções de movimento do voluntário, e transferiu essa informação para um braço robótico. 

Como explica nota divulgada pelo Caltech, implantes testados anteriormente ligavam-se à região motora do cérebro, gerando movimentos abruptos e pouco graciosos do braço-robô. O novo implante, colocado numa área chamada córtex parietal posterior (PPC, na sigla em inglês), detecta a intenção de mover-se, não a ordem imediata para que o movimento aconteça, o que permite “movimentos mais fluidos e naturais”.

“Registramos atividades da população neural com arranjos de microeletrodos implantados no PPC de um paciente tetraplégico”, diz o artigo na Science. “Foi possível decodificar imagens motoras dessas populações neurais, incluindo objetivos imaginados, trajetórias e tipos de movimento”. De acordo com a nota publicada pelo Caltech, o paciente que se submeteu ao implante foi capaz de usar um braço robótico num movimento “fluido” de aperto de mão e, também, de jogar joquempô. 

Ferramenta de pedra de mais de 3 milhões de anos, anterior ao gênero Homo

Ferramentas 
antes dos humanos

As ferramentas de pedra mais antigas já descobertas são anteriores ao surgimento do gênero Homo, ao qual pertence a espécie humana atual e espécies pré-históricas como o neandertal e o Homo habilis, diz artigo publicado na revista Nature. As ferramentas, descobertas no Quênia, datam de 3,3 milhões de anos atrás. Os mais antigos instrumentos de pedra associados ao gênero Homo são de 2,6 milhões de anos. 

Os autores do artigo, de uma equipe internacional, afirmam que a descoberta de ferramentas com mais de 3 milhões de anos “marca um novo início para o registro arqueológico conhecido”. 

Os autores especulam que o formato das ferramentas indica que elas estavam adaptadas para um tipo de movimento dos braços mais próximo ao dos modernos chimpanzés do que ao dos seres humanos.

 

Levedura
de ópio

A biotecnologia está mais próxima de produzir uma levedura capaz de transformar glicose, ou açúcar comum, em substâncias opioides, a família de drogas à qual pertencem ópio, morfina e heroína. Leveduras encontradas na natureza já são usadas para converter açúcar em álcool, numa etapa da produção de bebidas como vinho e cerveja. 

Na semana passada, pesquisadores da Universidade da Califórnia em Berkeley anunciaram ter criado uma levedura capaz de executar os estágios iniciais da conversão de açúcar em ópio. Os estágios finais já haviam sido obtidos em pesquisas anteriores – o que fica faltando, então, é construir uma levedura geneticamente modificada capaz de executar o processo por inteiro. O trabalho mais recente é descrito no periódico Nature Chemical Biology.

Tradicionalmente extraídos da papoula, opioides têm importância medicinal como analgésicos, mas também são traficados ilegalmente. A possibilidade de que essas substâncias possam vir a ser produzidas de modo tão simples e abundante quanto bebidas alcoólicas já causa preocupação, como mostra artigo publicado no serviço noticioso Science Insider, da revista Science, que lembra que há 16 milhões de usuários ilegais de opioides no mundo, com milhares de mortes por overdose registradas a cada ano. 

Ouvido pelo Insider, Kenneth Oye, especialista em política de biotecnologia do MIT, disse que “existe um verdadeiro potencial de as coisas darem muito errado” com essa tecnologia. “Se houver uma rota integrada, de um recipiente só, da glicose à morfina, isso será incontrolável quando vazar”.

 

Testosterona 
na Olimpíada

Com a aproximação dos Jogos Olímpicos de 2016, um debate delicado, mas pouco conhecido, volta a ganhar peso nos meios esportivos: o que qualifica uma pessoa a competir como mulher? A questão surgiu décadas atrás, em meio a temores de que homens disfarçados poderiam tentar competir ilegalmente nas categorias esportivas femininas, desfrutando de vantagens indevidas em quesitos como força física e velocidade.

Essa suspeita acabou levando à busca por um biomarcador exato e livre de ambiguidades, capaz de distinguir entre os sexos. Essa busca se mostrou infrutífera, por conta de casos de pseudo-hermafroditismo e de certas peculiaridades genéticas, o que levou ao reconhecimento de que “não há um critério científico capaz de distinguir todos os homens de todas as mulheres”. 

Por fim, as autoridades olímpicas adotaram um nível limite de testosterona, o chamado hormônio masculino, para que uma atleta possa competir nas categorias femininas. A justificativa é de que mulheres com “níveis masculinos” de testosterona levariam uma vantagem injusta sobre as demais competidoras.

Artigo publicado na Science da última semana, no entanto, questiona a ideia de que é possível falar em níveis de testosterona “tipicamente masculinos” ou “tipicamente femininos”, ao menos no universo dos atletas de elite, afirmando que os dois únicos estudos de grande fôlego sobre o assunto chegaram a resultados contraditórios.  Os autores sugerem que testes sexuais de base biológica deveriam ser abolidos de vez, e que se deveria adotar a política de que mulheres que foram criadas como meninas e se consideram do sexo feminino devem poder competir nos esportes femininos.

 

Viajante da
Era do Bronze

A chamada Garota de Egtved, sepultada num caixão de carvalho há mais de 3 mil anos na vila dinamarquesa de Egtved, viajou muito em seus últimos dois anos de vida. Análises dos cabelos, dentes e unhas do corpo de uma jovem da elite da Era do Bronze, morta com cerca de 17 anos de idade, revelaram detalhes sobre como devia ser a vida da “alta sociedade” da época. A investigação é descrita no periódico Scientific Reports, do grupo Nature.

Os níveis do elemento estrôncio nos dentes sugerem que a Garota nasceu fora da Dinamarca. Os isótopos atômicos da lã de suas roupas indicam que o tecido foi importado. Os autores do trabalho, encabeçado por Karin Frei, do Museu Nacional da Dinamarca, acreditam que a menina e seus trajes vieram do sul da Alemanha.

Os elementos químicos presentes nos cabelos longos da Garota permitem reconstituir suas viagens nos últimos 23 meses de sua vida, de acordo com a Scientific Reports. Os elementos que aparecem nos segmentos de cabelo e de unhas que cresceram nos meses imediatamente anteriores à morte mostram que ela esteve em algum lugar distante de Egtved pouco antes de falecer. Os cabelos revelam, ainda, uma dieta variada, mas marcada por períodos de escassez de proteína.

 

Novas epidemias
causadas por ratos

Um trabalho de aprendizado de máquina, publicado no periódico PNAS, revelou mais de 50 espécies de roedores que são prováveis portadoras de doenças contagiosas para seres humanos. 

Os autores do estudo, vinculados a instituições dos Estados Unidos, usaram técnicas avançadas de computação para encontrar as características biológicas e ecológicas mais comuns das espécies de roedores que transportam doenças que podem ser transmitidas para pessoas e, aplicando o modelo produzido, foram capazes de identificar portadores conhecidos com 90% de precisão, além de encontrar mais de meia centena de espécies que ainda não são consideradas portadoras, mas que se encaixam no perfil e que, portanto, têm alta probabilidade de virem a causar contágio em populações humanas.

Essas novas espécies são comuns em partes dos Estados Unidos e da Ásia Central, e os autores do trabalho sugerem que ele pode vir a gerar “um importante guia para a descoberta de reservatórios de doenças”.

 

Pássaros 
percussionistas

O pardal de Java (Lonchura oryzivora) batuca enquanto canta, produzindo um acompanhamento de percussão para sua música, diz artigo publicado no periódico PLoS ONE. “Pardais de Java machos coordenam o clicar dos bicos com a sintaxe das sequências de notas de suas canções”, escrevem os autores, vinculados a instituições japonesas. “Análises demonstram que eles produzem os cliques frequentemente no início das canções, e antes ou depois de notas específicas”, prossegue o artigo.

Os autores afirmam ainda que há semelhanças no estilo de percussão entre pássaros de um mesmo grupo social, o que sugere que o comportamento é, ao menos em parte, aprendido.