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Estudo mostra que bancos públicos
atenuaram efeitos da crise de 2008
Dissertação mostra como ações anticíclicas
das
instituições foram importantes no Brasil e na Índia

MANUEL
ALVES FILHO
A despeito de suas especificidades,
os bancos públicos no Brasil e na Índia cumpriram importante
papel para atenuar os efeitos da crise financeira de 2008,
iniciada no mercado norte-americano de hipotecas. Ao contrário
das instituições privadas, que tiveram um comportamento marcadamente
cauteloso, estes adotaram ações anticíclicas que foram decisivas
para garantir os fluxos de crédito durante o período mais
conturbado. A conclusão faz parte da dissertação de mestrado
apresentada recentemente pela economista Ana Luiza Guimarães
Lodi ao Instituto de Economia (IE) da Unicamp, sob a orientação
da professora Daniela Magalhães Prates. A autora do trabalho
contou com bolsas da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior (Capes), órgão do Ministério da Educação,
e da Fundação Economia de Campinas (Fecamp).
De
acordo com Ana Luiza, a sua pesquisa partiu do princípio de
que as instituições financeiras públicas são necessárias aos
países, mesmo quando as economias atingem um patamar mais
elevado de desenvolvimento. “Ao contrário do que pensam alguns
economistas, a presença marcante desses bancos em vários países
não decorre simplesmente de falhas do mercado. Os bancos públicos
podem desempenhar várias funções, entre as quais o papel anticíclico
em fases de desaceleração econômica”, explica a economista.
Ela conta que resolveu comparar
os dois países porque ambos estão crescendo em evidência no
cenário internacional e apresentam sistemas bancários mistos,
embora na Índia a presença de instituições públicas seja ainda
mais marcante que no Brasil. Lá, a participação dos bancos
públicos no que se refere a ativos alcança 70%. Aqui, esse
índice ultrapassa 30%, sendo que sobe para 40% quando o assunto
é o saldo das operações de crédito, conforme dados de 2009.
A importância dos sistemas públicos nas duas nações, diz Ana
Luiza, manteve-se alta até mesmo depois da reforma por que
passaram a partir dos anos 90, no contexto da chamada liberalização
financeira.
No Brasil, muitos bancos foram
privatizados naquele período, enquanto na Índia, apesar da
venda de parte do capital de várias instituições públicas,
o governo continuou mantendo o controle sobre elas. “Ou seja,
mesmo depois das reformas, a presença dos bancos públicos
nos dois países continuou relevante, principalmente na Índia”,
afirma a economista. E foi justamente a combinação de sistema
público e privado que permitiu às duas nações enfrentarem
as consequências da crise financeira de maneira mais efetiva,
de acordo com a pesquisadora.
Ana
Luiza esclarece que assim que a turbulência internacional
se tornou sistêmica, os bancos privados de Brasil e Índia
evitaram se envolver em atividades de maior risco. Restou
às instituições públicas, portanto, cumprir esse papel. Com
o advento da crise, continua a autora da dissertação, os dois
países viviam uma fase favorável no mercado de crédito. O
agravamento do quadro, a partir de setembro de 2008, obrigou
os governos dos dois países a adotarem ações para atenuar
os impactos. Tanto Brasil quanto Índia reduziram as taxas
de juros, sendo que o primeiro demorou um pouco mais para
tomar a decisão.
As medidas empreendidas na
Índia afetaram o sistema bancário como um todo, dado que,
com o rebaixamento das taxas de juros, o custo do crédito
também sofreu queda. No Brasil, alguns bancos se envolveram
em iniciativas mais específicas, como a Caixa Econômica Federal,
que reforçou seu papel de destaque no segmento de crédito
imobiliário. “Foi nesse período, por exemplo, que o governo
federal lançou o programa Minha Casa, Minha Vida”, assinala
Ana Luiza. Além disso, o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) também ampliou o desembolso para
a indústria, conferindo dessa forma maior vitalidade ao setor.
“Ou seja, foram os bancos públicos que empreenderam as medidas
anticíclicas das quais tratei no meu trabalho. Sem a presença
desse sistema, os impactos da crise provavelmente seriam maiores
nos dois países”, avalia a economista.
As conclusões da pesquisa,
acredita a pesquisadora, contribuem para o debate acerca das
funções e da importância dos bancos públicos para um país,
principalmente em contextos nos quais os bancos privados,
notadamente os estrangeiros, adotam comportamento de extrema
cautela. “Alguns autores acreditam que os bancos públicos
existem por falhas do mercado. Outros, que a presença dessas
instituições é importante, mesmo em economias mais desenvolvidas.
Eu concordo com essa segunda visão. Penso que deva existir
uma complementariedade entre um sistema e outro. Normalmente,
cabe aos bancos públicos se envolver em atividades de maior
risco, como o financiamento a obras de infraestrutura”, avalia
Ana Luiza.
A economista informa que para
desenvolver a sua investigação ela se valeu de ampla pesquisa
bibliográfica e da análise de dados fornecidos pelo Banco
Central do Brasil e do seu congênere na Índia. Ana Luiza revela
que teve maior dificuldade para trabalhar com as informações
relativas ao sistema bancário indiano porque eles não são
apresentados na mesma periodicidade que no Brasil. Enquanto
aqui os dados são organizados mês a mês, lá eles são arranjados
trimestral ou anualmente.
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■ Publicação
Dissertação: “O papel
dos bancos públicos do Brasil e da Índia no contexto da crise
econômica mundial”
Autora: Ana Luiza Guimarães Lodi
Orientadora: Daniela Magalhães Prates
Unidade: Instituto de Economia (IE)
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