Joana Lopes Pereira, mais
conhecida por Joaninha, tem 72 anos. Mineira de Turmalina, é uma mulher
pequena, olhos miúdos e brilhantes. Portadora da doença de Chagas
há anos. Diz que às vezes se sente triste, mas que gosta de sentir
isso porque tem Jesus no seu coração. Joaninha, sempre muito falante,
mostra-se interessada em todas as atividades do Grupo Flor da Terceira Idade,
onde está há dois anos. Só não danço
porque sou evangélica, diz. Conta que participou do Coral, mas, por
algum motivo, saiu.
Uma das melhores coisas que aconteceram em sua vida foi ter entrado para o grupo.
Aqui a gente conversa, conta casos, assiste a palestras e aprende uma porção
de coisas novas. Considero as colegas daqui como se fossem minhas parentes. Perguntado
sobre como está a recuperação de sua saúde, explicou
que só Ele (Jesus Cristo) sabe do futuro da gente. A
grande dor de Ana Campos Oliveira, a paciente mais idosa do grupo, com 85 anos,
não é uma dor física, mas da alma: a saudade do marido, José
de Oliveira, com quem fora casada por 57 anos e que há oito Deus
levou ele. Diz que não costuma pensar muito nisso que é
para não padecer mais. Sofre de pressão alta e as razões
nem mesmo ela não sabe. Ana acredita que sua saúde melhorou bastante,
desde que entrou para o grupo. Dança com certa dificuldade ao som do violão
tocado por Ismar Avelar Barros, um dos organizadores do Coral formado pelo grupo.
Olhos miúdos e muito vivos, Ana
conta que sente falta de quando se sentava ao lado do marido para longas conversas
e ouvir músicas de quando eram ainda muito jovens. Puxa na memória
e começa então a cantarolar antigas canções como Amélia,
de Ataulfo Alves e Mário Lago, e Carinhoso, de Pixinguinha e João
de Barro. Não
é um grupo de pessoas estranhas, mas uma família. A frase
é de Terezinha Ferreira Gomes, de 65 anos, portadora de doença de
chagas e osteoporose. Ao contrário de Joaninha, adora dançar e participa
de tudo o que o grupo faz. Sinto que isso aqui não é um tratamento,
mas sim vida, entretenimento, alegria e paz, ressalta. ´Terezinha
é uma das pacientes que durante algum tempo recebeu tratamento psiquiátrico
e que recebeu alta recentemente. Imagino que eles (os médicos) acharam
que eu já tava boa. Ela acredita que isso se deu por causa dos trabalhos
com grupo. Aprendi e me libertar e a não ficar pensando muito nos
problemas. Tenho coisa mais importante pra fazer do que ficar me lamentando pelos
cantos, conta rindo, dançando e abraçando as outras colegas. Dona
Idalina Mendes Correia, 68 anos, freqüenta o grupo há dois. Há
vinte anos ficou viúva. Diz não ser uma pessoa triste, mas
muito nervosa. Talvez seja essa a causa da minha pressão alta, deduz.
Conta que o grupo a tem ajudada muito. Não danço, mas gosto
de cantar e fazer os trabalhos manuais que me dão. O mesmo acontece
com Rosa Maria Ruas de Brito, 57 anos, cega por causa do diabete adquirida quando
tinha 17 anos. Tecladista do Flor da Terceira Idade, Rosa confessa ser uma pessoa
deprimida. Para ela, no entanto, o grupo é o meu ponto de apoio e
do prazer de viver. E desabafa: Tenho até medo que isto aqui
tudo um dia acabe. Não
chore, não junte os dedos em súplica, não se revolte: é
preciso envelhecer. (Gabrielle S. Colette/1873-1954) As
histórias de vida delas são quase sempre carregadas de muito
trabalho, angústia, solidão e algumas poucas alegrias. Principalmente
quando atingem o período da terceira idade, e outro mal as faz padecer
de uma doença que afeta entre 15% e 20% da mulheres e de 5% a 10% dos homens:
a depressão. Sem
tratamento adequado e contínuo acompanhamento médico, os sintomas
podem persistir por semanas, meses e até anos a fio. Há casos até
em que o indivíduo chega a tentar o suicídio, pelo menos uma vez,
e alguns conseguem o seu intento. Preocupado
com o bem-estar dos pacientes que freqüentam o Hospital da Unicamp, o Serviço
de Assistência Social desde 1985 está desenvolvendo um trabalho paralelo
com os idosos Grupo Flor da Terceira Idade cuja proposta é
fazer com que aprendam a superar ou driblar os momentos de depressão. Quase
sempre a depressão é causada pelo envelhecimento, inatividade ocupacional,
solidão, além da própria doença - psíquica
ou crônica -, que afetam o raciocínio, os sentimento e a saúde
do indivíduo. Constituído de atividades lúdicas, de entretenimento
e lazer que inclui música, trabalhos manuais e dança
da Assistência Social do HC tem dado bons resultados, segundo a assistente
social Maria Helena Zangirolano. Temos
pacientes aqui que há tempos estavam em tratamento psiquiátrico,
do qual receberam alta porque o estado de saúde deles melhorou de maneira
considerável, conta. Um desses exemplos é Terezinha Ferreira
Gomes, de 65 anos, que sofre de doença de Chagas. Não
há dúvida que a recuperação dos pacientes é
atribuída a essas atividades porque, pelo menos por algumas horas,
a paciente deixa de pensar na sua doença, e passa viver o presente, incentivada
à sociabilidade, a privilegiar o diálogo e a cultivar a auto-estima,
avalia Maria Virgínia Camilo, assistente social. Pelo simples fato da pessoa,
ao longo do período de tratamento, deixar de pensar no mal que a aflige,
já é um passo para a sua recuperação, se não
de todo, mas pelo menos em parte. A convivência no grupo é também
outro fator importante porque, para que a pessoa passe a defender suas idéias,
apuram o espírito crítico e propõem mudanças. E
suma, começam a ter um outro tipo de vida mais saudável, completa
Virgínia. Sabe-se que com um tratamento correto, entre 70% e 90% dos pacientes
conseguem se recuperar da depressão. |