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Tese investiga os elementos
peculiares da obra do escritor mineiro

O fantástico em Murilo Rubião


ANTONIO ROBERTO FAVA


Sonho ou realidade? Verdade ou ilusão? Durante três anos o estudante Fábio Dobashi Furuzato se propôs a investigar o fantástico na obra do escritor mineiro Murilo Rubião (1916-1991). Sinônimo de uma literatura que de certa forma se contrapunha ao chamado realismo literário, o fantástico ou o sobrenatural é um gênero que habitou a literatura de Edgard Alan Poe a J. J. Veiga, passando por Gabriel Garcia Márquez e Júlio Cortazar. O que Fábio pretendia era decifrar como o fantástico se incorpora na obra de Rubião, escritor que o impressionara desde o primeiro contato com o seu vigoroso e expressivo texto e, também, pelas epígrafes bíblicas contidas em todos os seus contos.

Autor da dissertação de mestrado A Transgressão do Fantástico em Murilo Rubião, apresentada recentemente no Instituto de Estudos da Linguagem (IEL), sob a orientação da professora Vilma Áreas, Fábio explica que definir o que é fantástico na literatura "é algo um tanto ambíguo". Pode-se dizer, de modo mais simples, que o termo fantástico é usado para determinar um texto - conto ou romance - que contenha elementos que transgridam as leis da causalidade.

São elementos fartamente encontrados nos textos de Murilo Rubião: o maravilhoso, o sobrenatural, o inexplicável, o estranho, os rompimentos com o real. "E isso é fácil de se verificar nos contos de Rubião. Entre eles, A Armadilha, Teleco, O coelhinho, O Convidado e O Edifício", explica o pesquisador. O pesquisador acrescenta que o fantástico "é a hesitação experimental por um ser que conhece apenas as leis naturais, em decorrência de um determinado fato aparentemente sobrenatural. Enfim, o conceito de fantástico se determina com relação a elementos do real e do imaginário".

Obra complexa - Murilo Rubião - que admitiu influências de Machado de Assis, da Bíblia e da mitologia grega - confessou ser um escritor de produção reduzida. Sua obra aproxima-se da de Franz Kafka (1883-1924), embora Rubião afirme, segundo Fábio, nunca tê-lo lido, até publicar o seu primeiro livro, O ex-mágico, em 1947. Escreveu pouco, apenas 33 contos, publicados em sete livros. Mas, segundo o pesquisador, Rubião trabalhava muito, com a preocupação de aperfeiçoar e aprimorar cada vez mais as suas histórias. Para se ter uma idéia de como o escritor mineiro reescrevia seus contos, de modo incessante, basta dizer que um de seus textos, O Convidado, publicado pela primeira vez em 1974, levou 26 anos para ser concluído.

Rubião era um escritor que, apesar de sua pequena produção, até hoje é bastante estudado pela academia. "Se fôssemos compará-lo a Clarice Lispector ou Guimarães Rosa, Rubião é ainda pouco analisado. Mas confrontado a outros autores do mesmo gênero, é um autor reconhecido, talvez pouco popular para o público leitor, já que sua literatura é um tanto difícil", diz Fábio. No entanto, houve um tempo em que fora bastante lido: quando sua obra passou a integrar a lista de livros dos vestibulares da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da PUC de Belo Horizonte. Apesar disso, Fábio é de opinião que os estudiosos de sua obra ainda não se deram conta da complexidade do universo de sua obra.

"Algo que considero inédito, no meu trabalho, é a constatação de que os contos de Murilo Rubião, apesar de terem certa uniformidade, são muito diferentes entre si, dada a diversificação de acontecimentos e imagens, que nos deixam extremamente perplexos", diz Fábio. Em alguns contos, por exemplo, narra acontecimentos completamente sobrenaturais. "Há textos em que Rubião leva o sobrenatural ao extremo. Outros, porém, como Elisa, que nada têm de sobrenatural - mas uma sucessão de coisas absurdas que, pela lógica, bem que poderiam acontecer".

O incômodo que causam os contos de Rubião é, talvez, provocado pela mensagem que o autor queira passar ao leitor. "Acho que essa é uma das questões mais importantes de sua literatura. Acredito que, religioso como era, a fé dava a ele uma espécie de segurança e de conforto, que ele estampava em seus textos. A impressão que se tem é que quando se desilude com a religião, o mundo começa a lhe parecer absurdo - então a vida parece ser igualmente absurda". A obra de Rubião, ao contrário de muitas que estão por aí, não foi feita para assustar ou provocar arrepios.

"Seus textos, de modo geral levam à perplexidade. Não sei se levam ou não uma mensagem positiva. A sensação que se tem é que Murilo Rubião era um homem desiludido, porque perdeu a fé religiosa naquilo que, até certo ponto da vida, era importante para ele", conclui Fábio Dobashi.

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