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A autoajuda no mundo dos ‘lobos’

RAQUEL DO CARMO SANTOS

Obras de autoajuda expostos em livraria: no topo dos mais vendidos (Foto: Antoninho Perri)Os livros de autoajuda alcançam números impressionantes no mercado editorial brasileiro, figurando no topo do ranking. Esse tipo de leitura encontra cada vez mais adeptos em busca de orientação para questões complicadas como morte, abandono e conflitos, entre outras. Mas, o preconceito em torno do assunto, sobretudo na academia, ainda é forte. Por isso, a antropóloga Talita Pereira de Castro, em sua pesquisa de mestrado apresentada no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), investigou a produção editorial destes livros e, para sua surpresa, muitos autores não classificam suas obras como voltadas para a autoajuda. Pelo contrário, eles garantem que a concepção ao escrever sobre determinados assuntos não teve o objetivo de orientar ou ensinar como lidar com situações difíceis, mas sim apenas relatar suas experiências.

“Esta questão reforça a tese de que existe um mercado do gênero literário em expansão, pois é certo que este tipo de leitura vende milhares de exemplares. Mas, por outro lado, há um estereótipo negativo que permeia essas publicações, impedindo que os próprios autores aceitem o rótulo de autoajuda como são classificados pelos editores”, afirma.

Para entender melhor essas questões, Talita Castro, orientada pela professora Guita Grin Debert, fez um recorte no tema sobre a periodização da vida, ou seja, analisou mais de dez títulos nacionais que tratavam da crise da vida adulta ou também chamada crise da meia-idade, que supostamente ocorre com homens e mulheres na faixa etária entre 40 e 50 anos. A antropóloga entrevistou ainda diversos autores de livros e recorreu a matérias jornalísticas de revistas e jornais, além de observar o tema tratado em novelas. Propositalmente, ela não entrevistou leitores, uma vez que o objetivo era focar a constituição do sujeito da perspectiva da produção dos livros.

“O material analisado me permitiu concluir que há um movimento de produção cultural para caracterizar uma possível crise que mulheres e homens passam na fase adulta da vida, à semelhança do que ocorre na adolescência. Nos Estados Unidos, por exemplo, existem títulos do gênero que sugerem até uma crise dos 25 anos, fase em que o jovem sai da universidade e tenta se inserir na área profissional desejada. O que se percebe é a ideia de uma vida pautada por crises, como uma maneira de sustentar o mercado de publicações”, explica a socióloga, que pretende aprofundar os estudos nesta área em pesquisa de doutorado.

A ideia de crise da meia-idade é antiga. Nos livros de autoajuda, expressões do tipo “idade do lobo ou da loba” começaram a ganhar corpo em meados da década de 1990, com a publicação do livro “Quarenta: A idade da loba”, de Regina Lemos. O livro retrata as mudanças no universo feminino ocorridas durante a década de 1960, tornando-se bastante conhecido e dando sequência a outras obras na mesma linha. Neste caso, Talita fez apenas a análise do livro, uma vez que a autora é falecida. Anterior a este, o escritor Elyseu Madegan Junior lançou a obra “A idade do lobo” que vendeu mais de 200 mil exemplares, levando o autor a publicar um segundo título, “Homens 40 graus”, também sucesso editoral. Mesmo tendo pesquisado, Talita não encontrou referências oficiais da origem das expressões.

Os autores retratam as formas de reação do homem e da mulher e, como era de se esperar, as diferenças são evidentes. Segundo Talita, as mulheres tendem a passar pelo momento com resultados muito mais positivos que os homens. Se no universo feminino, a crise representa uma retomada e uma forma de superação de muitos conflitos, para o sexo masculino, lidar com as emoções é algo crucial. Em todas as publicações aparece a figura do lobo bobo, ou seja, a imagem de um homem frágil e infantilizado que não consegue superar frustrações e medos de desemprego, impotência sexual e outros conflitos, acabando invariavelmente perdido em suas decisões.

“O lobo bobo aparece nos relatos como aquele que reprime suas emoções ao longo dos anos e não consegue controlá-las no momento de crise. Muitos acabam abandonando as esposas e buscam mulheres mais jovens como forma de autoafirmação. O que se observa é que o homem precisa mais da esposa para superação da fase, do que a mulher do marido. A mulher é caracterizada como poderosa, que continua a seduzir, a despeito das transformações físicas que marcam o período”, avalia.

Em suas análises, Talita encontrou características específicas para a mulher brasileira. Alguns elementos apoiados no visual e na beleza podem constituir uma marca exclusiva no Brasil, os quais diferem do universo feminino americano, onde este tipo de literatura também é bastante difundida. Trata-se de outro ponto que a socióloga pretende explorar nas próximas pesquisas ao comparar os livros de autoajuda publicados no Brasil e no exterior.

 

 
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