Pesquisa mostra resistência ao
projeto de JK implantar o parque automobilístico nacional
O Brasil sobre quatro rodas
LUIZ SUGIMOTO
Foi um garoto de apenas 18 anos e muita visão, chamado Alberto Santos Dumont, quem importou o primeiro carro motorizado para o Brasil, um Peugeot de 1.200 francos, em 1891. Antes de "pai da aviação", Santos Dumont também foi pioneiro em corridas de automóveis na França. Já tinha voado com o 14 Bis em 1906 e padecia de cansaço e envelhecimento precoces, causadas por esclerose múltipla, quando Henry Ford, em 1919, instalou uma linha de montagem no centro de São Paulo e anunciou: "O automóvel está destinado a fazer do Brasil uma grande nação".
Impulso definitivo foi dado em 1956
Depois da chegada também da General Motors (1925) e de muitas estradas abertas, o barulho dos motores tornou-se peculiar do cotidiano paulista. Entre 1920 e 1939, só no Estado de São Paulo, o número de carros de passeio saltou de 5.596 para 43.657 e o de caminhões de 222 para 25.858. Mas as fábricas apenas montavam seus automóveis no País, não produziam as peças. Com o início da 2ª Guerra Mundial, as importações ficaram prejudicadas e a frota de veículos, ultrapassada. Coube a Getúlio Vargas adotar as primeiras medidas concretas levando à criação do parque automotivo brasileiro, proibindo a importação de veículos montados e dificultando a de peças de montagem.
O impulso definitivo foi dado em 1956 por Juscelino Kubitschek, que neste seu primeiro ano de governo inaugurou, em São Bernardo do Campo, a primeira fábrica de caminhões com motor nacional da Mercedes-Benz e a fábrica da Volkswagen. Viriam em seguida a também alemã DKW, a francesa Simca e a americana Willys, como está na história do automóvel no Brasil, contada detalhadamente em páginas da internet (www.saopaulo.sp.gov.br/invista e www.histoautomovel.hpg.ig.com.br/industriabrasil, para mencionar duas).
Em ampla pesquisa realizada em 1959, o Ibope mostrou que a prioridade à indústria automobilística nacional, dada por JK no seu projeto de trazer "50 anos de progresso em cinco", enfrentou resistência em setores importantes, principalmente o rural e mesmo de parte da indústria que pregava ênfase em produtos básicos como aço, borracha e petróleo. Nos meses de agosto e setembro, o Ibope ouviu Câmara dos Deputados, Senado, Comércio, Indústria, Autarquias e Sociedades Mistas, a então Federação das Associações Rurais do Estado de São Paulo (Faresp) e o público em geral. A pesquisa foi patrocinada pela Metalon S.A.
Descrédito - Apesar de amplo apoio político, que garantia cem por cento de aprovação às medidas no Senado, JK ainda encontrava oposição na Câmara, onde 26% viam a indústria do automóvel como fator perturbador para o progresso industrial do Brasil, índice que ficava em 10% no comércio, indústria e autarquias, e subia a 43% na Faresp. Em níveis parecidos, a instalação do parque era considerada prematura por esses setores. Na média, um terço dos entrevistados achava que as facilidades concedidas pelo governo eram injustificadas.
O fato de que os veículos nacionais eram "muito caros" ou "caros" era verdade admitida por ampla maioria, e acima de 30% dos pesquisados duvidavam também da qualidade em relação aos similares do exterior. Em média, 47% não viam como possível a absorção das 100 mil unidades previstas para aquele ano de 1959; 44% colocavam fé nas notícias sobre um colapso na indústria automobilística devido à falta de mercado.
No período de 1957 a 1974, a produção brasileira acumulou 5.415.014 unidades, entre automóveis, caminhões, ônibus, camionetas e utilitários. Havia onze fábricas no país: as alemãs Volkswagen e Mercedes-Benz; as americanas Ford, GM, Chrysler e Cummins; as italianas FNM e Fiat (esta em implantação); a sueca Saab-Scania; a japonesa Toyota; e a brasileira Puma (que usava motor VW). A invasão das japonesas e coreanas, a partir de 1994, compõe outra história que o Ibope certamente vai contar.
O homem do Cadillac
(agosto de 1951)
Ter um Cadillac passou a significar, desde há algum tempo, ser-se senhor de uma invejável situação financeira ou estar-se envolvido em negócios escusos. Os poderes públicos se preocupam mais com o segundo aspecto da questão, enquanto as garotas de Copacabana só deram atenção ao primeiro. Então se o "tipo" que conduzisse o imponente automóvel fosse "uma estampa de homem" tudo já estava resolvido na cabeça de todas as "footing-girls" daquele bairro. Enquanto isso a imprensa se preocupa com o número de carros daquela marca que desembarcam no porto desta Capital.
Esferográficas e tinteiros
Em junho de 1944, o Ibope estimava que um terço da população do Rio de Janeiro usava canetas tinteiro. Era pesquisa encomendada pela Sheaffer's, que segundo o instituto deveria se render a uma concorrente: "A grande maioria dos revendedores afirma que a caneta Sheaffer's é tão boa quanto a Parker, mas não vale a pena perder tempo em convencer disso a um comprador. (...) O fenômeno Parker, segundo apuramos, é semelhante ao do dentifrício Kolynos, ao sabonete Gessy em São Paulo e dos doces e conservas Peixe. Constituem sólidas casamatas de conquista difícil".
Duas décadas depois, as canetas esferográficas, embora começassem a conquistar o mercado, ainda não eram totalmente fabricadas no País. Dentre as dezesseis empresas, nenhum conseguia produzir as esferas: "Essa importação eleva o custo do produto e dificulta o processo de desenvolvimento do setor, em conseqüência das barreiras alfandegárias. O diâmetro da esfera varia entre 0,8mm e 2mm. A preferência do consumidor é pelas de menor diâmetro, que oferecem menor possibilidade de borrar o papel. O diâmetro das esferas da "Bic" (0,8mm) é considerado o mais aperfeiçoado", comentava o Ibope em pesquisa de setembro de 1964.
A produção de canetas desse tipo, naquele ano, foi de 3.259.200 unidades, destacando-se a Faber (1.305.000) e a Bic (1.000.000). O Ibope ainda observava: "O brinde comercial de fim de ano surgiu recentemente e tornou-se um hábito, oferecendo grande campo de desenvolvimento para o setor de esferográficas. Há empresas que dão brindes durante todo o ano".
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Fecho éclair em calça de homem
Numa época em que cada homem possuía em média 2,7 ternos, por considerar esse traje o mais civilizado, a introdução do zíper no lugar dos botões das calças masculinas enfrentou grande preconceito. Em pesquisa de 1954, realizada em São Paulo e no Rio, o Ibope mostrou que o uso de "fecho éclair" em vestuário masculino era contestado até entre as mulheres: 32% eram contrárias à utilização, por acharem que não ficava bem (15%), não era apropriado (13%), era feio (12%) ou indecente (10%).
Quando de outra pesquisa, em 1959, os homens mantinham o hábito dos ternos, sendo que 62% preferiam os feitos em alfaiate, mesmo pagando vinte por cento a mais que aqueles comprados prontos em lojas como Exposição, Garbo e Ducal. Apenas 20% tinham usado zíper em lugar dos botões da "vista", a maior parte em calças rancheiras ou esportivas.
"Considerando as razões expendidas (...) verifica-se que, ao lado da conceituação favorável de que a aplicação do zíper em substituição aos botões torna "mais prática" a abertura, alinha-se a conceituação desfavorável de que o zíper "não é um artigo próprio para homens". (...) É necessário desfazer esse preconceito", enfatizava o Ibope.
Outras que deram Ibope
Em fevereiro de 1944, 57,2% dos homens entrevistados em São Paulo usavam bigode. A grande maioria (71%) fazia a barba em casa, por economia (38%), comodidade (30%), higiene (27%) e para ganhar tempo (14%). O produto mais utilizado era o sabonete (41%) e depois o sabão para barba em bastão (30%). Os que usavam cremes (20%) preferiam as marcas Willian's (41%) e Colgate (21%). As lâminas eram Gillette (71%) e Futebol (19%). Mas muitos homens (23%) ainda apelavam para a navalha.
- O Ibope constatou que, em 1954, 90% dos cariocas bebiam café e 75%, refrigerantes. Os refrigerantes mais bebidos eram Guaraná Antártica (46%), Guaraná Brahma (20,6%), Coca-Cola (7,5%), Água Tônica Antártica (1,9%), Crush (1,9%) e Grapette (1,4%).