PAUILO
CÉSAR NASCIMENTO
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O
professor Hugo Fragnito, do IFGW, coordenador, na Unicamp, do Centro de Pesquisa
em Óptica e Fotônica (CePOF): resultados promissores |
Uma
nova geração de amplificador óptico está nascendo
na Unicamp. O dispositivo permitirá ampliar em no mínimo 300 vezes
a atual capacidade de transmissões de telefonia e de Internet por fibra
óptica e tornar mil vezes mais rápida a velocidade da rede. A tecnologia
capaz desses feitos chama-se Fiber Optic Parametric Amplifier (Fopa), ou amplificador
paramétrico de fibra óptica, e o Instituto de Física Gleb
Wataghin (IFGW) da Universidade é um dos quatro laboratórios no
mundo a desenvolvê-la.
Instalados
a cada 50 quilômetros ao longo da rede telefônica entre cidades ou
até no fundo de oceanos nas conexões internacionais, os amplificadores
revitalizam os sinais de luz do laser, que perdem potência ao longo da transmissão
no interior da fibra óptica.
Essa
função regeneradora é executada por amplificadores dopados
com érbio, ou Erbium Doped Fiber Amplifiers (EDFA). Átomos desse
elemento químico, introduzidos na composição química
da sílica utilizada na produção das fibras, permitiram, na
última década, duplicar para 80 o número de canais ou bandas
de lasers capazes de serem amplificados simultaneamente.
Congestionamento
Porém, mesmo capazes de comportar hoje taxas de transmissão
de até 1 Terabit por segundo (Tb/s) ou mil gigabits, suficientes
para quase 1 bilhão de ligações telefônicas simultâneas
, esses equipamentos, mantidas as suas atuais características tecnológicas,
não conseguiriam atender a demanda crescente de tráfego na rede,
estimulada sobretudo pelo uso da Internet.
Principalmente
no cenário da multimídia, serviços que dependem de banda
larga, como a transmissão de voz, dados e imagem, simultaneamente e em
tempo real, estão sendo implementados e utilizados em escala cada vez maior
pela sociedade, podendo levar ao colapso da rede, observa o professor Hugo
Fragnito, do IFGW, coordenador, na Unicamp, do Centro de Pesquisa em Óptica
e Fotônica (CePOF), um núcleo de atividades comuns integrado ainda
pelo Instituto de Física da USP de São Carlos e pelo Instituto de
Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen).
A
solução para evitar o iminente congestionamento atende pelo nome
de Fiber Optic Parametric Amplifier (Fopa) ou amplificador paramétrico
de fibra óptica. Hugo e outros nove pesquisadores dedicam-se a aperfeiçoar
a tecnologia, capaz de permitir transmissões de até 300 Tb/s por
uma única fibra óptica, em conexões de longa distância,
e milhares de Tb/s em ligações de curta distância. Mas o que
torna o Fopa tão especial e com tamanho poder de revolucionar ainda mais
as telecomunicações?
O Fopa, explica o docente, não utiliza
o érbio em seu funcionamento, mas vale-se de um fenômeno físico
conhecido como efeito não linear para conseguir amplificar a onda luminosa
do laser em larguras de banda de transmissão muito superiores às
do EDFA.
A não linearidade é
responsável pela dispersão do intenso feixe de luz laser na parede
de sílica da fibra óptica. Quanto mais lasers se colocam no interior
da fibra, mais dispersão de luz ocorre, a tal ponto que os sinais de transmissão
começam a ficar distorcidos.
Durante
um bom tempo esses efeitos indesejáveis limitaram a capacidade de expansão
de transmissão da fibra, mas acabaram sendo aproveitados para amplificar
sinais, conta Hugo. O mais interessante é que a descoberta
dessa propriedade em nosso laboratório ocorreu por acaso, revela.
Surpresa
Há três anos, uma empresa solicitou a ajuda do IFGW para decifrar
a ocorrência de um grande número de distorções na transmissão
de alguns canais de laser pela fibra óptica que fabricava. A tarefa foi
delegada ao então aluno de pós-graduação José
Manuel Chávez Boggio, que estudava a interação entre laser
e ruído em fibras para sua tese de doutorado.
Descobrimos
que a interferência, por causa do efeito da não linearidade, estava
sendo amplificada em uma largura de banda gigantesca, bem maior que a largura
de banda do érbio. Foi uma grande surpresa para todos, relata José,
membro da equipe do CePOF/Unicamp. Decidimos, então, investigar se
o fenômeno poderia amplificar o sinal do laser da mesma forma que os ruídos
e chegamos ao Fopa.
A descoberta no IFGW ocorreu praticamente no mesmo
período em que pesquisadores da Bell, centro de pesquisa da empresa norte-americana
Lucent, alcançavam resultados semelhantes, esclarece o cientista. Atualmente,
além da Unicamp e da Bell, dedicam-se ao tema os laboratórios de
uma universidade dos EUA e de uma instituição sueca.
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O
pesquisador José Manuel Chávez Boggio: decifrando a ocorrência de um grande número
de distorções na transmissão de alguns canais de laser |
A
amplificação paramétrica, na verdade, é um efeito
conhecido desde os primórdios da fibra óptica, nos anos 80. Mas
nunca se pensou que tivesse alguma utilidade, por conta dos efeitos nocivos da
amplificação de ruídos, lembra Hugo. O que fizemos
foi aproveitar esses efeitos para explorar melhor a imensa capacidade de transmissão
das fibras, desenvolvendo meios para atenuar as interferências.
A
equipe da Unicamp está na fase de prototipagem do Fopa, estágio
que antecede o desenvolvimento de um produto pré-industrial. Para chegar
a essa etapa, Hugo prevê que serão necessários cerca de três
anos de trabalho laboratorial e investimentos da ordem de US$ 6 milhões.
Estamos à procura de empresas interessadas em se associar à
Unicamp nessa pesquisa, anuncia o professor.
Até aqui, foram parceiros
da empreitada o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações
(CPqD), a empresa Ericsson e a Fundação de Amparo à Pesquisa
do Estado de São Paulo (Fapesp). Juntas as instituições investiram
cerca de US$ 2 milhões no projeto no último triênio.
Do
impulso elétrico ao feixe de luz
A fibra óptica
é um filamento de vidro da espessura de um fio de cabelo, capaz de transmitir
a luz a enormes distâncias. Quando alguém fala ao telefone, a voz
é traduzida para a linguagem dos impulsos elétricos, pelo próprio
aparelho. Porém, quando essa mensagem é transmitida através
de fibra óptica, esses impulsos são convertidos em impulsos de luz,
por meio de uma fonte de faixa de infravermelho conectada à fibra.
A
aplicação dessa tecnologia revolucionou a comunicação
de dados por causa dos benefícios se comparada ao uso de cabos de cobre
convencionais. A comunicação óptica tem muitas vantagens:
ela permite a transmissão de uma quantidade bem maior de informações,
a distâncias bem mais longas; tem menor custo de implantação
e operação; os componentes são bem menores e a interferência
eletromagnética é reduzida.
Uma tecnologia
denominada Wavelength Division Multiplexing (WDM) ou Multiplexação
por Divisão de Comprimento de Onda, fez com que, em vez de se utilizar
uma fibra para cada laser de sinal, como no início do sistema, fosse possível
transmitir vários lasers pela mesma fibra óptica. Assim, a multiplexação
permite que diversas bandas de transmissão, cada uma com dezenas de milhões
de ligações ao mesmo tempo, possam ser enviadas por uma única
fibra óptica.
Há dez anos, cada fibra
óptica levava um único raio de luz e transmitia 600 milhões
de bits por segundo (bps). Hoje, já se pode canalizar 100 lasers dentro
da fibra ótica e transmitir 1 trilhão de bps.
Aplicações A
aplicação mais imediata do Fopa, segundo Hugo, é no desenvolvimento
de pré-amplificadores e amplificadores em linha. Mais potentes, os dispositivos
poderiam ser instalados em intervalos de distâncias maiores, a cada 100
ou 200 quilômetros, ou só no ponto de recepção de sinal,
o que diminuiria o número dos atuais amplificadores posicionados ao longo
da rede.
Além de tornar a rede mais robusta e confiável,
reduziria o custo das operadoras de telecomunicações com instalação
e manutenção dos equipamentos, afirma Hugo.
Ele
prevê a aplicação do Fopa até mesmo para a telefonia
celular, na comunicação entre as estações transmissoras
hoje denominadas rádio-base. De acordo com ele, sinais de rádio
não serão capazes de suportar o crescente volume de transmissão
de voz, dados e imagens entre os usuários de celulares, e será necessário
substituir esse meio de conexão entre a estações por fibras
ópticas com a tecnologia da amplificação paramétrica.
Fibras
com essas características também poderão permitir, daqui
a alguns anos, a adoção de sistemas totalmente ópticos em
substituição aos processos eletrônicos de recebimento e distribuição
de sinais. São aplicações que, se bem sucedidas, prometem
revolucionar a atual arquitetura das redes.
Hoje em dia a óptica
é utilizada apenas para o transporte da informação da origem
ao destino. Para a conversão do sinal óptico, interpretação
da informação nele contida e redirecionamento da mensagem ainda
são utilizados equipamentos eletrônicos, como chaves e roteadores.
É o que ocorre nas centrais telefônicas, responsáveis por
gerenciar o tráfego na rede, esclarece o pesquisador.
No
momento em que esses equipamentos precisam ler eletronicamente os sinais é
que a rede começa a ficar mais lenta. Portanto, qualquer coisa que se fizer
para eliminar a eletrônica do caminho deixará a rede mais rápida,
mais confiável, mais eficiente e com maior capacidade de transmissão,
enfatiza.
Quando, então, os sinais estiverem correndo apenas
pelas fibras ópticas, alguns recursos de telecomunicações
pela Internet que, por enquanto, são apenas um esboço do que poderiam
efetivamente representar, terão condições de ter toda a sua
potencialidade adequadamente explorada. Exemplo é a videoconferência,
que ainda não conquistou mercado porque a rede atualmente não consegue
transmitir voz e imagem com a qualidade necessária. |