LUIZ
SUGIMOTO
O
brasileiro que perde o emprego em idade avançada
deveria ser contemplado com o seguro-desemprego até atingir o tempo para
aposentadoria. A idade avançada, o número de dependentes e as diferenças
regionais no custo de vida influiriam no valor do seguro. Ao beneficiado se daria
a opção de sacar as prestações em cota única,
a fim de montar negócio próprio, com a devida fiscalização
e orientação técnica e administrativa. Ex-presidiários
teriam direito ao benefício. Emigrantes retornados, também. O bóia-fria
receberia o seguro-desemprego nos períodos de entressafra.
Estas
são algumas conclusões de um estudo comparativo entre os modelos
de seguro-desemprego do Brasil, Estados Unidos e Espanha, realizado pela economista
Rosane Beatriz Hasenkamp. Ela apresentou a dissertação de mestrado
O seguro-desemprego frente às transformações
do mercado de trabalho brasileiro em 29 de julho, no Instituto de
Economia (IA) da Unicamp, orientada pelo professor Marcio Pochmann. O objetivo
não é exatamente apresentar propostas, mas trazer subsídios
que levem a uma discussão em torno do redesenho do modelo brasileiro,
justifica a pesquisadora.
O nosso sistema
pode ser resumido em poucas linhas. Têm direito ao seguro-desemprego todos
os trabalhadores demitidos que serviram ao setor formal e contribuíram
com a previdência social por um período mínimo de seis meses.
Conforme o tempo de carteira assinada, o desempregado pode receber de 3 a 5 prestações
do seguro. O valor da prestação, calculado sobre a média
dos últimos salários, varia de 1 a 1,87 salário mínimo.
O financiamento vem da contribuição de 0,65% dos rendimentos das
empresas privadas, 1% sobre a receita das empresas públicas e 1% sobre
as despesas das empresas não-lucrativas.
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A
economista Rosane Beatriz Hasenkamp: “Deveríamos aprimorar o seguro-desemprego”
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A Espanha mantém
duas categorias de seguro-desemprego, a contributiva e a assistencial. Na primeira,
o trabalhador contribui com 1,1% do salário, e a empresa com 5,2% sobre
a folha de pagamento. Dependendo do tempo de contribuição, o desempregado
receberá entre 60% e 70% da média dos últimos rendimentos,
por um período que varia de 120 a 720 dias. Mas é na categoria assistencial,
bancada pelo governo e voltada aos desempregados que esgotaram a prestação
contributiva e outros em situação especial, que estão os
exemplos mais relevantes para o Brasil.
Nos
Estados Unidos existem nada menos que 55 modelos de proteção ao
desempregado, quantidade que se deve à autonomia garantida a cada estado.
Em 75% dos estados, o empregado não dá qualquer contribuição.
Os recursos vêm de uma contribuição feita pelas empresas a
um fundo estadual, uma taxa que vai de 0% a 10%, dependendo do grau de rotatividade
de mão-de-obra: quanto maior o rodízio de trabalhadores na empresa,
maior a taxa. Este modalidade de contribuição, aliás, está
prevista na regulamentação brasileira, mas continua à espera
de lei ordinária para ser colocada em prática. Da mesma forma, outros
exemplos norte-americanos poderiam ser adaptados ao Brasil.
O
perfil
A Espanha inovou garantindo ao demitido com mais de 52 anos,
que não consegue reingressar no mercado, o usufruto do seguro-desemprego
até que possa se aposentar. Quem tem mais de 45 anos recebe 18 prestações
adicionais pelo seguro assistencial. Além disso, o governo impede que as
empresas façam ajustes em seus quadros através do corte dos mais
velhos. Quem está perdendo o emprego é o trabalhador antigo, sem
grau de instrução, sem chances de concorrer. É o desemprego
de exclusão. No Brasil, o indivíduo vira pipoqueiro num mercado
informal que já abriga 40% da nossa força de trabalho, observa
Rosane Hasenkamp.
Tal como o modelo espanhol,
o norte-americano diferencia o desempregado de acordo com o perfil. Os dois países
levam em conta não apenas a idade, mas também o número de
dependentes menores. Nos EUA, onde o segurado recebe de 32% a 57% dos rendimentos
da ativa, por até 26 semanas, o suplemento semanal pode chegar a US$ 85
por filho menor. No Brasil, onde este tipo de incremento se torna crucial,
o valor é um só. Se o trabalhador de baixa instrução
é a maior vítima do desemprego, também sabemos que existe
uma relação inversa entre grau de instrução e número
de filhos, critica a economista.
Cota
única
Outra inovação na Espanha e EUA: desqualificada
para o mercado formal, uma pessoa pode receber todas as prestações
do seguro em cota única, reunindo quantia suficiente para se estabelecer
como autônomo. Antes, porém, o beneficiado passa por uma avaliação
para definir o tipo de negócio a que está afeito e recebe orientação
técnica, administrativa e psicológica; depois, é fiscalizada
sua dedicação em tempo integral à atividade. Penso
em estudar o impacto saudável que a cota única traria ao nosso mercado
informal, creio que regularizaria boa parte dele. Mas o seguro precisaria ser
concedido por prazo maior, a fim de que o desempregado tenha em mãos uma
quantia razoável, admite.
Rosane
lembra, também, que o valor da prestação é muito baixo
no Brasil. O seguro-desemprego paga no máximo 1,87 salário
mínimo. Para quem recebia até três mínimos, é
um rendimento importante. Ocorre que foram demitidos muitos trabalhadores acima
de dez salários, para os quais este valor se torna simbólico. Esses
limites mínimos e máximos também carecem de reavaliação
e talvez pudessem se pautar, como na Espanha e EUA, em cima dos salários
na ativa. Considere-se, ainda, que uma família pode viver com menos de
dois salários mínimos no Piauí, mas nunca em São Paulo,
acrescenta a pesquisadora.
Casos especiais
A Espanha oferece cobertura aos trabalhadores agrícolas eventuais,
que recebem o seguro-desemprego no período de entressafra. O bóia-fria
brasileiro, que só consegue trabalho durante o plantio e colheita, não
consegue fechar o tempo exigido de seis meses para adquirir o benefício.
Este prazo obrigatório poderia ser reduzido, mesmo que implicasse
redução no valor do benefício. A situação agrária
tem grande responsabilidade sobre a tragédia no nosso mercado de trabalho
e esta medida ajudaria a fixar o homem no campo, acredita Rosane.
O
modelo espanhol, ainda dentro desta preocupação social, estende
o seguro ao ex-presidiário, que assim ganha mais condições
de recomeçar a vida. Os ex-detentos em nosso país são
discriminados triplamente: 80% têm descendência negra, baixa escolaridade
e ainda saíram da cadeia. Se é difícil na Espanha, imagine
a dificuldade para arrumar uma colocação aqui, constata a
economista. Ela recomenda mais dois cuidados, um deles tomado pelos espanhóis
em relação aos emigrantes retornados:
Até
1986, a Espanha era bem mais pobre e incentivava a saída do trabalhador
para outros países; agora, na volta, retribui com o seguro até que
ele se encaixe novamente no mercado local. Os brasileiros que muitas vezes se
dão mal nos Estados Unidos ou Japão, quando do seu retorno ao Brasil,
nada lhes é previsto no seguro-desemprego, sendo que de certa forma sua
saída aliviou nosso mercado, aponta Rosane.
Parada única
Para finalizar, a pesquisadora ressalta que há muito a aprender
com os Estados Unidos em termos de estrutura na assistência ao desempregado,
sobretudo na articulação entre atendimento, treinamento e pagamento,
visto que no Brasil se exige uma peregrinação por setores diversos
até a obtenção do benefício. Eles têm
o que chamam de parada única. Num só local, o sujeito
é cadastrado, entrevistado, orientado, pago e encaminhado por profissionais
com a competência para se informar sobre as vagas abertas nos estados e
confrontá-las com o perfil dos candidatos. Muitos defendem a mera extinção
do seguro-desemprego brasileiro, quando na realidade deveríamos aprimorá-lo.
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