MANUEL ALVES FILHO
A proposta de desenvolver de um padrão de TV digital alternativo, feita recentemente pelo ministro das Comunicações, Miro Teixeira, tornou o debate em torno do assunto ainda mais acirrado. Especialistas da área têm assumido posições diferentes sobre o que um padrão brasileiro de TV pode significar para o país. Alguns deles alertam para as desvantagens de o Brasil não adotar uma das tecnologias já existentes. Segundo eles, a opção poderia isolar a nação do restante do mundo, criando uma indesejável reserva de mercado e elevando o preço dos televisores. Pior: o Brasil perderia importantes mercados externos. Por outro lado, há quem considere o desenvolvimento de um padrão próprio um estímulo à pesquisa e ao desenvolvimento de novas tecnologias.
As discussões em torno da implantação da TV digital no Brasil estão sendo travadas desde 1995. Neste período, técnicos, pesquisadores e representantes da indústria e de emissoras de televisão vêm analisando os aspectos técnicos, econômicos e sociais relativos ao empreendimento. Os três padrões de transmissão em operação no mundo já foram testados por aqui. De modo geral, o ATSC (norte-americano), o DVB-T (europeu) e ISDB-T (japonês) apresentaram vantagens e desvantagens entre si, dependendo do aspecto considerado.
Os professores Max Henrique Costa, José Geraldo Chiquito e Dalton Soares Arantes, todos pertencentes ao Departamento de Comunicações (Decom) da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) da Unicamp, têm oferecido contribuições regulares à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), órgão que vem conduzindo os estudos em torno da TV digital. Na opinião deles, é discutível a idéia de criar um padrão brasileiro, que seja diferenciado dos já existentes. "Seria mais interessante aproveitar uma das tecnologias disponíveis e usar a nossa competência para trabalhar nas partes "abertas" dos padrões já existentes, em particular no desenvolvimento de softwares, antenas inteligentes e várias outras possibilidades de evolução desses sistemas", sugere Max Costa.
Os docentes da Unicamp reconhecem que o Brasil reúne pessoal capaz de desenvolver um padrão tupiniquim, mas têm dúvidas se esse seria o melhor caminho. "Embora a TV digital ainda esteja operando de forma incipiente nos países desenvolvidos, não se deve subestimar o esforço e o acúmulo de experiência para se chegar ao estágio atual. Se o Brasil se propuser a desenvolver um padrão próprio, é provável que quando atingir um estágio de desenvolvimento razoável, os países desenvolvidos estarão muito à frente, uma vez que não permanecerão estáticos" advertem Dalton Arantes e José Chiquito.
Para Dalton Arantes, a efervescência gerada pela proposta do ministro das Comunicações pode ter desdobramentos interessantes. O professor chama a atenção para o fato de a pauta de exportação brasileira estar ficando envelhecida. Segundo ele, a maioria dos produtos nacionais tem baixo valor agregado. "A maior parte das empresas está voltada para mercado local. Uma das notáveis e honrosas exceções é a Embraer, que aceitou e está vencendo o desafio de disputar o mercado internacional, gerando empregos e riqueza para o país. É por isso mesmo que não podemos pensar que, por sermos um país pobre, não devemos nos envolver com a área de alta tecnologia", diz.
Ainda usando a fabricante de aviões como exemplo, o professor da Unicamp destaca que a Embraer não desenvolve todas as partes das aeronaves que produz. "As turbinas e a eletrônica embarcada, por exemplo, são compradas de outros países. O que a empresa faz é trabalhar nos segmentos certos, agregando tecnologia e valor aos seus produtos. No caso da TV digital, creio que devemos trilhar o mesmo caminho, evitando o isolamento e criando mercado externo", reforça Dalton Arantes.
Leia também: Sistema tem vários padrões