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Tecnologia e inovação no setor elétrico

(Fotos: Antonio Scarpinetti) As inovações tecnológicas e não tecnológicas ocorrem espontaneamente nas empresas por razões variadas. A explicação é relativamente simples: quando uma empresa faz algo que lhe confere alguma vantagem (redução de custos, diferenciação de produtos, qualidade etc.), isso afeta as condições das demais empresas.

Quanto mais as empresas necessitarem ou vislumbrarem oportunidades, mais elas procurarão inovação. Esse processo dinâmico é inerente às economias de mercado. O setor elétrico brasileiro introduziu, no final dos anos 90, a obrigação para as empresas de geração, transmissão e distribuição (GTD) de aplicação de 1% das receitas líquidas em pesquisa e desenvolvimento (P&D) e em eficiência energética.

Em linhas gerais, esse percentual divide-se em quatro fatias: para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico; para o Ministério de Minas e Energia; para projetos de eficiência energética (apenas distribuidoras); e para execução de atividades de pesquisa e desenvolvimento por parte das próprias empresas, o chamado P&D Aneel. Até hoje as empresas teriam recolhido algo em torno a R$ 4,5 bilhões.

Especificamente para as fatias correspondentes a eficiência energética e P&D Aneel, esse valor foi de cerca de R$ 1,5 bilhão. Ao longo do tempo, a curva é crescente, estando hoje na faixa de R$ 670 milhões ao ano. O investimento em P&D por parte das empresas é compulsório. Para fiscalizar isso, a Aneel tem uma área específica em sua estrutura que regulamenta o uso e zela pela correta aplicação dos recursos. Por seu lado, as empresas criaram suas áreas de P&D para garantir que os investimentos cumpram as regras, já que há risco de glosa e punição. É o que se chama de “risco regulatório”.

Para completar o quadro, até o final de 2008 todo benefício econômico que uma empresa do setor pudesse obter a partir das inovações que ela ajudava a gerar era perdido pela política de modicidade tarifária. O resultado é que, durante dez anos, o P&D foi visto pelas empresas como um fardo. Entre o porrete e a cenoura, optamos pelo primeiro.
A modicidade tarifária, como política geral, é medida fundamental em um setor como esse. Por outro lado, a modicidade tarifária integral aplicada ao P&D compulsório é um mau negócio para todo mundo.

Perdem todos: as empresas não têm estímulo para investir em P&D e inovação. Perde o setor elétrico porque são baixos os impactos na balança comercial e no próprio crescimento da indústria de equipamentos e serviços de energia elétrica. Finalmente, perde a sociedade, que deixa de usufruir dos benefícios da inovação.

Sem estímulo ao inovador, a inovação não vai ocorrer ou o fará só pelo esforço heroico de alguns gestores e dirigentes visionários. Se não há o benefício (produtividade, qualidade), não há o que distribuir à sociedade.

Duas mudanças recentes do marco regulatório (do final de 2008) abrandaram essa situação: a Aneel tornou o controle dos projetos menos burocrático e autorizou as empresas a se apropriarem de 50% a 70% dos benefícios econômicos gerados pelo esforço de P&D, desde que se trate de tecnologias a serem comercializadas, mas não utilizadas pelas próprias empresas GTD (que, diga-se, representa a maior parte do resultado do investimento em P&D).

Além disso, a Aneel apresentou dez temas prioritários para estimular as empresas a concentrar esforços em algumas áreas. Essas medidas são um avanço, mas um avanço tímido e pouco efetivo. A timidez está justamente em insistir na não remuneração do esforço da inovação feita para uso da empresa (produtividade, qualidade). A baixa efetividade está em forçar que as empresas joguem todo o investimento para produzir e comercializar tecnologia (porque aí elas podem se apropriar de parte do benefício gerado). Teremos dezenas de empresas GTD tentando entrar em mercados oligopolizados de equipamentos e softwares relacionados a energia. Ainda que alguns negócios venham a ser bem-sucedidos, não há como imaginar dezenas de “fábricas” de tecnologia competindo pelos mesmos mercados.

É preciso aperfeiçoar o marco regulatório para efetivamente colocar a inovação no centro das estratégias das empresas. Ganham todos: empresas, pelo retorno do investimento; indústria, que ganhará densidade e diversidade; e sociedade, que teria melhores serviços a custos relativamente mais baixos.

 

SERGIO SALLES-FILHO
é professor titular do Departamento de Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp

 

 

 
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