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Unicamp debate proposta de
ampliação de vagas na graduação
Programa pretende possibilitar o ingresso de 120 estudantes
oriundos de escolas públicas de Campinas
MANUEL
ALVES FILHO
A
Unicamp iniciou na última semana um amplo debate interno acerca
de um projeto inovador que objetiva criar 120 novas vagas
de graduação. A proposta, formulada pela Pró-Reitoria de Graduação
(PRG), foi apresentada inicialmente aos diretores de faculdades
e institutos. Nas próximas semanas, a matéria será levada
para discussão em outros colegiados e esferas da Universidade.
Batizada de Programa de Formação Interdisciplinar Superior
(Profis), a iniciativa pretende atingir em um primeiro momento
os melhores alunos oriundos das 96 escolas públicas de ensino
médio de Campinas. “Ao submetermos o Profis à apreciação da
comunidade interna, esperamos receber contribuições que possam
aperfeiçoá-lo”, afirma o pró-reitor de Graduação, professor
Marcelo Knobel.
De acordo com ele, a formulação
da minuta do programa demandou um ano de análises e pesquisas.
O pró-reitor de Graduação assinala que a ideia central da
proposta de ampliação do número de vagas no ensino de graduação
é possibilitar o acesso à Unicamp de estudantes egressos das
escolas públicas. “Existe uma auto-exclusão por parte desses
jovens, que imaginam não ter condições de entrar na Universidade.
Isso pode ser verdade em alguns casos, mas não no geral. Os
dados disponíveis indicam que, quando se inscrevem, esses
estudantes se saem bem em nosso vestibular. Atualmente, 30%
dos ingressantes vêm da rede pública, essencialmente a mesma
proporção que ocorre entre os candidatos inscritos. No entanto,
sabemos que mais de 80% dos jovens que se graduam no ensino
médio estudaram na rede pública, o que caracteriza um grave
fenômeno de auto-exclusão”, detalha Knobel.
Pela proposta apresentada,
prossegue o pró-reitor, o Profis constituirá uma forma de
ingresso paralela ao vestibular, que não sofrerá qualquer
alteração em razão do possível advento dessa modalidade. “É
bom destacar que o número de vagas oferecidas por meio do
processo seletivo convencional não será afetado pelo programa.
O mesmo se aplica ao PAAIS [Programa de Ação Afirmativa e
Inclusão Social, que concede um bônus na nota do vestibular
a estudantes provenientes de escolas públicas e aos que se
declaram pretos, pardos ou indígenas (que também tenham cursado
o ensino público)]”, pontua Knobel. A ideia original é que
a definição dos 120 alunos a serem beneficiados pelo Profis
seja feita com base no desempenho deles no Exame Nacional
do Ensino Médio (Enem), aplicado pelo Ministério da Educação.
Assim, seria selecionado,
por hipótese, o primeiro colocado de cada estabelecimento
de ensino (96 estudantes) e os 24 melhores segundos colocados
na performance geral. “Claro que a lista final poderá não
obedecer exatamente a essa ordem, visto que é possível que
alguns desses melhores estudantes passem em algum vestibular
ou tenham outros projetos para suas vidas. De toda forma,
as vagas deverão ser preenchidas pelos melhores colocados
no Enem dessas escolas. Penso que esse formato é interessante
porque privilegia tanto o mérito quanto a diversidade”, analisa
o pró-reitor de Graduação. Outro aspecto importante do programa,
na visão de Knobel, é a sua proposta curricular, que não encontra
paralelo em outras experiências no Brasil.
A sugestão é que os 120 alunos
selecionados para participar do Profis ingressem numa espécie
de núcleo comum, onde receberão uma formação interdisciplinar
aprofundada durante dois anos, em período integral. Uma proposta
preliminar de currículo mínimo foi sugerida após exaustivas
análises por parte de uma comissão de trabalho que teve à
sua frente o professor Lício Velloso, assessor da PRG e docente
da Faculdade de Ciências Médicas (FCM). Entre as disciplinas
que provavelmente comporão o currículo estão ética, matemática,
física, química, português, biologia, filosofia, história
da arte etc. Além disso, esses alunos também terão tempo e
condições para estudar e participar, entre outros, de projetos
de iniciação científica e atividades extracurriculares.
“Ao final dos dois anos, aqueles
que apresentarem melhor desempenho terão vagas asseguradas
em nossos cursos tradicionais, nos quais ingressarão no primeiro
ano. Queremos oferecer a oportunidade para que esses jovens
continuem seus estudos superiores na própria Unicamp. Caso
não haja essa possibilidade, por conta da performance ou mesmo
em razão da definição de outros projetos de vida por parte
de alguns desses alunos, eles receberão um certificado referente
à participação no programa. O fato é que todos receberão uma
formação geral de qualidade, que buscará despertar um olhar
crítico sobre os mais variados aspectos da sociedade e do
conhecimento”, detalha.
Caso venha a ser aprovado
nas diversas instâncias da instituição, o Profis funcionará
como projeto-piloto em um primeiro instante, como esclarece
o pró-reitor de Graduação. A intenção é acompanhar de perto
tanto os estudantes quanto as atividades, de modo a fazer
com que a proposta seja aprimorada e eventualmente ampliada
no futuro. “Mesmo sendo um programa relativamente pequeno,
o Profis deverá produzir um impacto importante na inclusão
desses jovens no ensino superior público de qualidade. Se
levarmos em consideração que 6 mil estudantes concluem anualmente
o ensino médio na rede estadual de ensino de Campinas, as
120 vagas que pretendemos oferecer já alcançariam 2% desse
contingente, o que é um percentual bastante representativo”,
considera.
Knobel destaca que o número
de vagas proposto inicialmente para o Profis reflete o caráter
de programa-piloto com impacto orçamentário mínimo. “120 alunos
é a capacidade das maiores salas de aula disponíveis para
uso no programa. Também tivemos o cuidado de estudar em profundidade
os catálogos de graduação e as disciplinas já existentes.
Assim, a proposta não prevê a criação de novas disciplinas
e nem a contratação de professores específicos para atuação
no programa. A ideia é usar a estrutura já existente na Universidade,
com alguma eventual pequena adaptação. No geral, o Profis
não provocará qualquer impacto representativo no orçamento
da instituição”, reforça o pró-reitor de Graduação.
Uma pergunta que certamente
surge em relação ao Profis é o motivo de ele estar voltado,
pelo menos em sua primeira versão, somente a estudantes do
ensino público de Campinas. Conforme Knobel, a explicação
é bastante simples. Por se tratar de um projeto-piloto de
caráter inovador, ele precisará ser acompanhado de perto pela
Universidade em todas as duas dimensões. Ademais, acrescenta
o docente, os estudantes que participarão da nova experiência
certamente necessitarão de algum tipo de apoio para poder
dar sequência aos seus estudos, como auxílios para transporte
e alimentação. “O cuidado com que a Unicamp vê esse projeto,
em virtude das suas qualidades e promessas, e a visão de que
não deve onerar o orçamento para ser levado adiante, indicaram
a necessidade de restringi-lo às escolas de Campinas, pelo
menos neste instante. Sendo de Campinas, esses jovens não
precisarão de tanto suporte, visto que já vivem com suas famílias
na cidade”.
Caso o Profis se mostre uma
iniciativa de sucesso, diz Knobel, a Unicamp certamente fará
esforços para buscar financiamentos para ampliá-lo. “Nada
impede, nesse caso, que pensemos em aumentar o número de vagas
e até mesmo levar a experiência para outros campi da Universidade.
Entretanto, o importante agora é fazer com que o programa
se torne exequível, para acompanharmos a sua dinâmica”. O
pró-reitor de Graduação não se arrisca a prever um prazo para
a implantação do Profis. De acordo com ele, os processos de
discussão e aprovação da proposta são intrinsecamente lentos.
“O tema será amplamente debatido pela comunidade interna e
depois submetido às instâncias formais de deliberação, entre
elas o Conselho Universitário (Consu). Nossa expectativa é
que o projeto possa ser aprovado o quanto antes”.
Para
reitor, programa preserva
o mérito e respeita a diversidade
O
reitor da Unicamp, professor Fernando Ferreira Costa,
considera que o Profis, atualmente em discussão nos
órgãos colegiados da Universidade, tem múltiplos objetivos
em relação ao incremento da excelência acadêmica no
ensino superior brasileiro. “Ao mesmo tempo em que preserva
o mérito como principal critério para o ingresso dos
estudantes na Universidade, a proposta que está sendo
apresentada à comunidade interna respeita a diversidade
do ensino médio público, porque seleciona os melhores
alunos em cada uma das diferentes escolas públicas de
Campinas”, afirma.
De acordo com ele, durante dois anos
a Unicamp possibilitará a esses estudantes ampla e profunda
formação geral, com base num abrangente leque de disciplinas,
que vão da física à literatura e artes. “Ou seja, eles
receberão uma formação geral e abrangente, condição
cada vez mais necessária no mundo atual e em qualquer
profissão, e que é impossível de ser oferecida pelos
cursos convencionais”. Ao final desse período inicial,
lembra o reitor, os estudantes poderão escolher, com
base em seu desempenho, um entre os cursos existentes
na Unicamp. “É importante destacar que a proposta apresentada
não trará prejuízo ao mecanismo normal de ingresso,
isto é, ao vestibular da Unicamp, que continuará sendo
realizado normalmente com o mesmo número atual de vagas
segundo as regras institucionais vigentes”, acrescenta. |
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