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Proteínas em glândulas salivares formam
barreira de proteção a portadores de HIV

Pesquisadores da FOP constatam ação
protetora em pacientes HIV positivos autopsiados

LUIZ SUGIMOTO

Andréia Aparecida da Silva em laboratório da Universidade de Sheffield: “A janela está aberta um enorme leque de pesquisas” (Foto: Divulgação)Faz apenas 10 anos que se descobriu uma família de proteínas denominadas Plunc, às quais vêm sendo atribuídas as mesmas funções das proteínas do sistema imune inato – que atua como primeira linha de defesa contra a entrada de agentes infecciosos no organismo. Uma pesquisa de doutorado desenvolvida na Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP), da Unicamp, identificou as Pluncs em glândulas salivares de pacientes HIV positivos que foram a óbito, sugerindo, por meio das autópsias, que elas funcionariam como única barreira de proteção disponível aos imunossuprimidos. 

“A família Plunc abre a janela para um enorme leque de pesquisas visando entender melhor como essas proteínas agem não apenas em relação à Aids, mas a todo tipo de lesão infecciosa”, afirma Andréia Aparecida da Silva, agora doutora em estomatopatologia (diagnóstico de doenças da boca) e professora do Centro de Estudos Superiores de Maceió (Cesmac). A autora da tese foi orientada pelo professor Pablo Agustín Vargas e estagiou diretamente com os cientistas que identificaram as Pluncs em humanos, o casal Lynne e Collin Bingle, da Universidade de Sheffield, na Inglaterra.

Andréia Aparecida da Silva com Lynne Bingle, da Universidade de Sheffield: “A janela está aberta um enorme leque de pesquisas” (Foto: Divulgação)Andréia Silva explica que a Plunc é a sigla em inglês para Palate, lung and nasal epithelium clone (Palato, pulmão, nasal clone epitelial), descoberta em 1999 por Wayde Weston, que observou a proteína expressa em epitélios do palato, pulmão e fossas nasais de camundongos. “Seu objetivo era estudar os genes envolvidos com o fechamento do palato – o céu da boca, formado a partir de dois ossos nas extremidades que depois se unem na região central. Já em 2000, os professores Lynne e Collin Bingle identificaram Plunc na saliva, no epitélio do pulmão e em glândulas salivares de humanos”.

Epitélio é o tecido que reveste a superfície externa do corpo, órgãos e cavidades internas, funcionando como eficiente barreira contra a entrada de agentes invasores. “Foi durante meu estágio que eles recorreram à imunoistoquímica (uma técnica de coloração para proteína) a fim de verificar a expressão de Plunc nas glândulas salivares de pacientes com Aids. Em estudos prévios, a coloração foi mais forte na cavidade nasal, por onde entra a maioria das impurezas, levando os Bingle a relacionar a proteína com o sistema imunológico inato”.

De acordo com Andréia Silva, o casal de pesquisadores ingleses seguiu estudando epitélios da traquéia e brônquios de humanos, e também de outros animais como vaca e porco, descrevendo vários tipos de Plunc. “Eles perceberam pequenas modificações genéticas e chegaram a uma família constituída por dez proteínas – quatro de genes curtos e seis de genes longos. De forma geral, todas protegem o organismo contra agentes patogênicos”.

Grupo com HIV
A autora da tese conta que a proposta de analisar pacientes autopsiados com HIV nasceu de uma conversa informal sobre Plunc entre o professor Pablo Vargas e os Bingle, em Sheffield. Tanto o pesquisador da FOP como os ingleses acharam interessante averiguar como essas proteínas são expressas nas glândulas salivares maiores de pacientes que foram a óbito devido à Aids.

De 1996 a 1999, o docente da Unicamp coletou as glândulas salivares maiores de pacientes HIV positivos, que foram autopsiados no Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina da USP. “O objetivo do professor Pablo Vargas era verificar se essas glândulas salivares – as maiores da cavidade oral – também estavam comprometidas com algum tipo de infecção, a exemplo de outros órgãos dos pacientes. E ele comprovou que sim”.

Coube a Andréia Silva, então, demonstrar a expressão das Pluncs em glândulas salivares desses pacientes autopsiados, apresentando lesões infecciosas causadas por micobacteriose e citomegalovirose (doenças oportunistas decorrentes da imunossupressão) – e comparar esta expressão com a de pacientes que foram a óbito por outras doenças. “Observamos que, quando há lesão infecciosa nas glândulas salivares maiores, é maior a expressão da proteína, sugerindo que ela está agindo para conter a infecção, em que pese a deficiência no sistema imunológico do portador de Aids”.

A autora trabalhou com blocos de parafina correspondentes a 35 glândulas parótidas, 37 submandibulares e 27 sublinguais de autopsiados com HIV, e de 10 pacientes HIV negativos (grupo controle). O estudo apontou a expressão de duas proteínas curtas nas três glândulas maiores e de uma proteína longa nos ductos das glândulas salivares. “Na verdade, estive na Inglaterra duas vezes: a primeira para submeter o material à imunoistoquímica e, a segunda, para a hibridização in situ, técnica bem mais sensível que apontou positividade em todos os casos do grupo controle”.

Pacientes vivos
Um passo seguinte, como adianta Andréia Silva, será descobrir quanto de proteína Plunc está presente também na saliva, haja vista que na boca existem várias proteínas que protegem contra infecção da Aids. “A doença não é transmitida pela saliva, quando se bebe no mesmo copo do paciente. Se existe Plunc na glândula salivar, ela também existe na saliva, e é preciso saber o quanto ela atua contra a infecção”.

A pesquisadora está na expectativa de iniciar já no próximo semestre o trabalho junto aos pacientes portadores de HIV vivos, coletando amostras de saliva em centro montado no próprio Cesmac e enviando o material para análises na FOP e na Universidade de Sheffield. “Acabei de receber mensagem da professora Lynne Bingle anunciando sua vinda para Piracicaba em agosto, a fim de padronizar uma técnica para quantificação de Plunc na saliva.

Andréia Silva lamenta que não possa participar diretamente das novas análises, uma vez que está trabalhando em Maceió. “O importante é que a porta está aberta, inclusive na Inglaterra. Em relação à família Plunc, os pesquisadores correm para descobri-la em outros órgãos. Temos muita pesquisa pela frente”.

Mecanismos de defesa ficam comprometidos

Em sua tese de doutorado, Andréia Aparecida da Silva informa que a literatura relata inúmeras lesões de origem infecciosa, cística, neoplásica e inflamatória nas glândulas salivares de pacientes HIV positivos. Ela menciona alguns exemplos, como a turberculose, histoplasmose, citomegalovirose e por Mycobacterium avium-intracellulare. Esta é a primeira pesquisa investigando a participação das proteínas da família Plunc nas glândulas salivares maiores de pacientes autopsiados com Aids em fase avançada.

A autora da tese explica que os principais componentes do sistema imune inato são as barreiras físicas e químicas, tais como os epitélios e as substâncias antimicrobianas produzidas nas superfícies epiteliais. Seus mecanismos formam a primeira linha de defesa do organismo e são capazes de promover rápidas respostas frente ao agente agressor, mas nem sempre têm a capacidade de eliminar a infecção.

De qualquer forma, o sistema imune inato é de fundamental importância nas fases iniciais da infecção, funcionando como uma barreira e facilitando uma posterior resposta imune adaptativa mediada por células T. Em pacientes com HIV, este sistema imunológico vai sendo lenta e progressivamente deteriorado, deixando-os suscetíveis a uma série de doenças oportunistas que podem levar à morte.

As infecções oportunistas que acometem estes pacientes podem ser de origem bacteriana, fúngica, viral ou de protozoários. Em decorrência das inúmeras alterações que ocorrem no sistema imune, os portadores da doença também apresentam linfopenia, redução da função das células T com perda de células de memória, neoplasias e diminuição da hipersenbilidade do tipo tardio, dentre outras deficiências nos mecanismos de defesa.

Números da AIDS
Os primeiros casos de AIDS foram registrados nos EUA e em cerca de 20 anos a doença se transformou em uma epidemia de grandes proporções. Até 2007, cerca de 33,2 milhões de pessoas foram infectadas pelo HIV, sendo 30,88 milhões de adultos e 2,55 milhões de crianças menores de 15 anos. Mais de 90% dos portadores vivem em países subdesenvolvidos, segundo estimativas do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (Unaids) e a Organização Mundial da Saúde (OMS). As taxas de infecção estão ainda em ascensão em muitos países da África Subsaárica, sendo a principal causa de morte neste continente.

No Brasil, existem cerca de 660 mil indivíduos HIV positivos notificados pelo Ministério da Saúde até o ano de 2007 e, destes, 474.273 já desenvolveram a doença.  São dados que equivalem a 1/3 da população que vive com HIV na América Latina. Também até 2007, foram notificados aproximadamente 193 mil óbitos por Aids no país.

Segundo o Ministério da Saúde, cerca de 80% dos casos em crianças com até 13 anos de idade são decorrentes da transmissão vertical. Já a estimativa para mulheres grávidas infectadas pelo HIV é da ordem de 16.410, ou seja, 0,4% do total das gestantes. Destas, apenas 40% recebem tratamento antirretroviral. O HIV é adquirido através do sêmen, sangue e leite materno, podendo ser transmitido por relações heterossexuais, homossexuais ou bissexuais masculinos, usuários de drogas ilícitas, receptores de sangue e hemoderivados.

 
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