 A 
                        informalidade não pode ser entendida como uma segmentação 
                        do mercado, mas sim como um modo de vida. Trata-se de 
                        uma condição dinâmica e moderna, que, também por causa 
                        dessas características, mostra-se resistente às tentativas 
                        de formalização. A conclusão faz parte da dissertação 
                        de mestrado do economista André Calixtre, apresentada 
                        recentemente ao Instituto de Economia (IE) da Unicamp. 
                        O trabalho foi orientado pelo professor José Ricardo Barbosa 
                        Gonçalves e contou com bolsa de estudo concedida pelo 
                        Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 
                        (CNPQ), órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).
A 
                        informalidade não pode ser entendida como uma segmentação 
                        do mercado, mas sim como um modo de vida. Trata-se de 
                        uma condição dinâmica e moderna, que, também por causa 
                        dessas características, mostra-se resistente às tentativas 
                        de formalização. A conclusão faz parte da dissertação 
                        de mestrado do economista André Calixtre, apresentada 
                        recentemente ao Instituto de Economia (IE) da Unicamp. 
                        O trabalho foi orientado pelo professor José Ricardo Barbosa 
                        Gonçalves e contou com bolsa de estudo concedida pelo 
                        Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 
                        (CNPQ), órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).
                       De acordo com Calixtre, que trabalha no Instituto de 
                        Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), fundação vinculada 
                        à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da 
                        República, seu estudo faz uma discussão acerca dos conceitos 
                        empregados para definir a informalidade numa economia 
                        como a brasileira. “Nesse sentido, a pesquisa tem um cunho 
                        teórico amplo, mas também oferece uma tentativa de aplicação 
                        prática a partir das suas conclusões”, afirma. Normalmente, 
                        prossegue o autor da dissertação, uma vertente tende a 
                        analisar a informalidade como uma categoria de mercado 
                        definida pela produtividade. Outra a entende como uma 
                        relação que expressa o assalariamento segundo a posição 
                        na ocupação ou como a relação de trabalho manifesta-se 
                        sob contratos. 
                      O economista revela que procurou organizar na dissertação 
                        a forma como essas visões aparecem nos debates. Conforme 
                        Calixtre, o termo informalidade foi cunhado pela primeira 
                        vez pelo antropólogo Keith Hart, por ocasião de uma pesquisa 
                        desenvolvida em Gana, na África, no final da década de 
                        60. Ao observar a economia local, Hart notou que ali havia 
                        algo diferente da economia de mercado. “Ele percebeu o 
                        dinamismo da informalidade, classificando-a de forma original 
                        como um modo de vida. Penso que aí está a chave para entender 
                        toda a questão. A informalidade não pressupõe os fundamentos 
                        do racionalismo típico, porém faz parte da vida moderna. 
                        Pressupõe a rapidez e transitoriedade dos laços sociais; 
                        é, portanto, anti-tradicional”, sustenta.
                        Depois 
                        do advento da teoria de Hart, prossegue o economista, 
                        as análises em torno do tema caminharam para o dualismo. 
                        Muitos analistas passaram a ver a informalidade como a 
                        reprodução do que é arcaico, contrapondo-se desse modo 
                        ao que é moderno. “No meu trabalho, eu tento romper com 
                        essa posição e retomar a teoria de Hart. Para isso, empreguei 
                        as críticas que Maria da Conceição Tavares [economista] 
                        e Francisco de Oliveira [sociólogo] fizeram a esse dualismo. 
                        No mesmo sentido, também me vali dos estudos de Florestan 
                        Fernandes [também sociólogo]. O recurso aos clássicos 
                        conferiu ao trabalho um caráter ensaístico”, explica Calixtre.
Depois 
                        do advento da teoria de Hart, prossegue o economista, 
                        as análises em torno do tema caminharam para o dualismo. 
                        Muitos analistas passaram a ver a informalidade como a 
                        reprodução do que é arcaico, contrapondo-se desse modo 
                        ao que é moderno. “No meu trabalho, eu tento romper com 
                        essa posição e retomar a teoria de Hart. Para isso, empreguei 
                        as críticas que Maria da Conceição Tavares [economista] 
                        e Francisco de Oliveira [sociólogo] fizeram a esse dualismo. 
                        No mesmo sentido, também me vali dos estudos de Florestan 
                        Fernandes [também sociólogo]. O recurso aos clássicos 
                        conferiu ao trabalho um caráter ensaístico”, explica Calixtre.
                       Segundo o autor da dissertação, os dualistas se amparam 
                        na seguinte análise sobre as economias subdesenvolvidas: 
                        a economia informal é arcaica e se reproduz à sua maneira, 
                        enquanto a formal é moderna e se reproduz também à sua 
                        maneira, sendo que uma representa o bloqueio das possibilidades 
                        de desenvolvimento da outra. “No seu trabalho intitulado 
                        ‘Além da Estagnação’, Conceição Tavares derruba esse argumento. 
                        Já naquela época, final da década de 60, ela advertia 
                        que a economia do subdesenvolvimento como um todo é dinâmica. 
                        Além disso, Florestan Fernandes também assinalou que esse 
                        antagonismo inexiste. Segundo ele, numa sociedade que 
                        nasceu do subdesenvolvimento, o arcaico se moderniza e 
                        o moderno torna-se arcaico constantemente”, diz.
                       Apesar de o Brasil ter conseguido superar a escravidão 
                        e o colonialismo, prossegue Calixtre, as relações pessoais 
                        continuam sendo determinantes para entender a lógica do 
                        funcionamento da economia. “O que quero dizer com isso 
                        é que o resquício de personalismo natural da Colônia se 
                        atualizou e virou uma força importante. Por isso busco 
                        sair da compreensão de que a informalidade pode ser definida 
                        apenas como uma relação contratual, ou por segmentos de 
                        produtividade do trabalho no mercado. Existe uma condição 
                        informal que tem dinamismo próprio e que é criativa. Trata-se, 
                        portanto, de uma condição de vida que resiste às tentativas 
                        de formalização. No Brasil, esse aspecto é muito claro”, 
                        considera.
                       Prova disso, conforme o economista, é que, a despeito 
                        de a formalização ter crescido em períodos recentes, a 
                        informalidade não diminuiu de tamanho. Na última década, 
                        ao contrário, ela evoluiu em termos absolutos, ainda que 
                        se tenha relativamente reduzido. Questionado se esse índice 
                        representaria que o brasileiro assumiu para si a informalidade 
                        como algo natural, Calixtre esclarece que modo de vida 
                        não é escolhido pelas pessoas. “Qualquer trabalhador informal 
                        gostaria de ter carteira de trabalho assinada. Ocorre, 
                        porém, que a despeito de ele estar feliz ou não com a 
                        sua condição, a economia impõe um dinamismo de constante 
                        atualização do arcaico no moderno. Nesse sentido, não 
                        há contraposição entre essas duas dimensões, visto que 
                        elas convivem mutuamente. Uma depende da outra para sobreviver”, 
                        reforça.
                       Segundo o autor da dissertação, as tentativas do Estado 
                        de ampliar a formalização enfrentam resistência da própria 
                        economia. Um vendedor de cachorro quente, diz, deixaria 
                        a informalidade se tivesse oportunidade. “Ocorre que as 
                        políticas públicas lançadas até aqui não conseguiram atingir 
                        os objetivos para os quais foram criadas. Qualquer empresa 
                        para ter crédito precisa de um CNPJ [Cadastro Nacional 
                        de Pessoa Jurídica]. Como o informal não tem o cadastro, 
                        consequentemente não tem acesso a financiamento. O país 
                        ainda precisa criar mecanismos inovadores de políticas 
                        públicas para tentar de fato mudar os sinais da informalidade”. 
                      
                      Calixtre informa que no final do seu trabalho ele coloca 
                        a questão sobre a possibilidade de se formalizar o informal. 
                        “É uma pergunta que está em aberto. Se o informal resiste 
                        à tentativa de mudança, como é que se faz para alterar 
                        a sua dinâmica, a fim de evitar que esta seja geradora 
                        de desigualdade e de exclusão? Este é um desafio próprio 
                        do Estado, que, diga-se, também é marcado pelo arcaico 
                        e pelo moderno”. Provocado a olhar em perspectiva para 
                        essa problemática, o economista afirma que o futuro é 
                        incerto. A informalidade, enfatiza o pesquisador, sempre 
                        se mostrou presente na economia brasileira. Ela faz parte, 
                        por assim dizer, da formação do nosso povo.
                        “Tomemos 
                        como exemplo a década de 70, quando o país vivia o auge 
                        da industrialização, um período de pleno emprego. Naquela 
                        época, segundo o censo demográfico, 30% dos trabalhadores 
                        urbanos de São Paulo declararam que recebiam renda abaixo 
                        de um salário mínimo. Ora, ou todos eram aprendizes ou 
                        eram informais”. O modo de vida informal, insiste o pesquisador, 
                        faz parte da transição do trabalho escravo para o assalariado, 
                        que acabou por gerar um dinamismo próprio. “É nessa trajetória 
                        que me apoio para dizer que se trata de um modo de vida 
                        que se reproduz desde a Colônia. É um modo de vida que 
                        vem se atualizando e se configura com força social relevante”, 
                        analisa.
“Tomemos 
                        como exemplo a década de 70, quando o país vivia o auge 
                        da industrialização, um período de pleno emprego. Naquela 
                        época, segundo o censo demográfico, 30% dos trabalhadores 
                        urbanos de São Paulo declararam que recebiam renda abaixo 
                        de um salário mínimo. Ora, ou todos eram aprendizes ou 
                        eram informais”. O modo de vida informal, insiste o pesquisador, 
                        faz parte da transição do trabalho escravo para o assalariado, 
                        que acabou por gerar um dinamismo próprio. “É nessa trajetória 
                        que me apoio para dizer que se trata de um modo de vida 
                        que se reproduz desde a Colônia. É um modo de vida que 
                        vem se atualizando e se configura com força social relevante”, 
                        analisa.
                       Calixtre reconhece que seu trabalho foge do modelo usual 
                        de dissertação, tanto na forma quanto no conteúdo. “Foi 
                        um estudo difícil de desenvolver e de defender. Tentei 
                        contribuir com o possível para marcar posição sobre a 
                        importância da reflexão acadêmica. Nesse sentido, penso 
                        que também a pesquisa também pode ser entendida como ambiciosa. 
                        Todavia, é importante admitir que ela carrega os defeitos 
                        naturais dessa ambição e da tentativa de colocar algo 
                        novo em debate, sem a devida maturidade intelectual para 
                        a tarefa. O importante é que fiz o que gostaria de ter 
                        feito, e para isso contei com a valiosa orientação da 
                        José Ricardo Barbosa Gonçalves e dos professores integrantes 
                        da banca de qualificação e de defesa”.
                        
                      ................................................
                        ■ Publicação 
                      Dissertação: “A condição informal: reflexões 
                        sobre o processo de informalidade no Brasil contemporâneo” 
                        
                        Autor: André Calixtre 
                        Orientador: José Ricardo Barbosa Gonçalves 
                        
                        Unidade: Instituto de Economia (IE)