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Coleção da Editora da Unicamp
é referência na área da história social
Docentes do IFCH falam sobre a
“Várias Histórias”, que já conta com 33 títulos
Na
entrevista que segue, os professores Silvia Hunold Lara
e Fernando Teixeira da Silva, ambos do Instituto de Filosofia
e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp, falam sobre a importância
da Coleção Várias Histórias (Editora da Unicamp) no âmbito
de estudos no campo da história social. Fernando Teixeira
da Silva acaba de substituir Silvia Hunold Lara na coordenação
editorial da coleção, cujo primeiro título foi lançado
em 1999. Ao longo desse período, já foram publicadas 33
obras, muitas das quais referências na área.
Jornal da Unicamp – Em que consiste a “Coleção
Várias Histórias”?
Silvia Hunold Lara –Trata-se de uma iniciativa
de um grupo de pesquisadores da Unicamp que há muitos anos
vem se dedicando à História Social. Criada em 1999, como parte
das atividades do Centro de Pesquisa em História Social da
Cultura [Cecult] – do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas
[IFCH] da Unicamp, ela tem servido como um importante canal
para divulgar pesquisas recentes de pós-graduação sobre a
História do Brasil que tratem da diversidade da formação cultural
brasileira. Quase todos abordam temas clássicos da história
brasileira do século XIX e início do XX, mas que são visitados
de modo inovador, mantendo um diálogo renovado com a história
da experiência dos trabalhadores no Brasil, compartilhando
e ampliando as premissas historiográficas e teóricas da nova
história social que se desenvolveu no Brasil a partir dos
anos 1970-1980.
Um conjunto significativo
de títulos da coleção trata de aspectos da experiência
escrava no Brasil, em especial de questões legais e jurídicas
da escravidão e da abolição, como é o caso de O Direito
dos escravos, de Elciene Azevedo, lançado em março. Outro
conjunto significativo de livros da coleção realiza uma
abordagem histórica da literatura, elenco ao qual vem se
somar agora a obra de Daniela Silveira, Fábrica de Contos,
também lançado em de março.
JU – Considerando
que até o momento são 33 livros publicados, podemos afirmar
que se trata do projeto editorial mais significativo para
quem se interessa pela história social desse período?
Fernando Teixeira da Silva – De fato, 33
livros publicados (com mais dois no prelo) em 12 anos é um
feito nada desprezível, sobretudo se levarmos em conta coleções
similares em editoras universitárias brasileiras. Uma característica
importante da “Várias Histórias” é o fato de que os volumes,
pela própria natureza da coleção, guardam certa convergência
de posições. O nome da coleção não é casual: colocando os
sujeitos – tanto coletivos, como escravos e trabalhadores
livres urbanos e rurais, quanto indivíduos, tais como Evaristo
de Moraes, Angelo Agostini e Luiz Gama, no centro da investigação
histórica, as pesquisas focalizam diferentes aspectos da experiência
social, contando as várias histórias que compõem o que geralmente
se chama, genericamente e apenas no singular, de “História
do Brasil”. Ao visitar cronologias e temas diversos, a coleção
procura analisar consensos e dissensos, identidades e diferenças,
continuidades e mudanças que deram forma às relações sociais
no Brasil – constituindo, assim, nesse sentido, uma boa mostra
do que se faz nesse campo no Brasil e, em particular, na área
de pós-graduação em História Social da Unicamp.
JU – Quais os
critérios adotados para a aprovação de um trabalho a ser publicado
pela Coleção?
Silvia Hunold Lara – A maior parte dos títulos
até agora publicados pela coleção foi produzida como dissertações
de mestrado e, principalmente, teses de doutorado, ou ainda
como resultado de debates ligados aos principais eixos temáticos
e historiográficos das pesquisas desenvolvidas no Cecult.
A cada dois anos, mais ou menos, há um processo seletivo,
realizado por uma banca externa de especialistas, para escolher
os melhores trabalhos orientados pelos pesquisadores vinculados
ao Cecult.
Antes da publicação, os selecionados
fazem uma breve revisão de seus textos e passam também pelo
crivo da Fapesp, que tem apoiado a publicação de praticamente
todos os títulos da coleção. Deste modo, quando o trabalho
vem a público, seu autor já terá passado por diversas avaliações,
a começar dos debates realizados nas linhas de pesquisa da
pós-graduação, onde mestrandos e doutorandos colocam em discussão
os resultados preliminares de suas investigações. Esse longo
processo avaliativo, acreditamos, é uma das credenciais da
“Várias Histórias”. Quanto às coletâneas, elas tratam de temas
diretamente ligados aos projetos coletivos em andamento no
Cecult. Em geral, abordam temas pouco estudados pela historiografia,
compondo-se de artigos de alunos de pós-graduação e de pesquisadores
mais experientes que se reúnem para discutir, por escrito,
temas específicos.
Diferentemente de outras coletâneas
publicadas no Brasil, elas não resultam de seminários e colóquios:
os encontros de discussão acontecem no processo de elaboração
de cada um desses volumes coletivos. Neste sentido, ao contrário
de ser um apanhado de textos sem qualquer lógica ou diálogo
entre si, nossas coletâneas partem de projetos bem estruturados
que lançam previamente problemas para todos os participantes
e os articulam em eixos precisos de análise.
JU – Qual a efetiva
contribuição e impacto dessa Coleção na formação e na pesquisa
de outros historiadores? E em que medida ela tem levado estudantes
a iniciarem projetos de pesquisa sobre esse período?
Fernando Teixeira da Silva – Não temos um
estudo sobre o impacto da coleção – mas sabemos que ela se
tornou um ponto de referência na área da história social,
no Brasil e no exterior, conforme mostram os contatos que
mantemos com pesquisadores de instituições dentro e fora do
país. O mais interessante é que ela é composta por obras de
jovens pesquisadores – historiadores que se formaram em um
ambiente de pesquisa coletiva, como dissemos, que caracterizou
desde sempre o Programa de Pós-Graduação em História da Unicamp
e o Cecult em particular.
Constituindo-se como um canal
para divulgar essas pesquisas recentes, a coleção aproveita
a vitalidade de projetos inovadores e solidamente ancorados
na análise de grande diversidade de fontes. Certamente, ela
também deve funcionar como um incentivo para a qualidade dos
trabalhos produzidos pelos nossos estudantes de pós-graduação.
Uma boa medida do impacto da coleção é o fato de que praticamente
todos os títulos editados até 2002 tiveram uma segunda edição
e vários contaram com segundas impressões.
JU
– Vocês têm uma ideia sobre a adoção de títulos da Coleção
na graduação e pós-graduação de cursos de História?
Fernando Teixeira da Silva – Como já dissemos, várias
obras se tornaram referência em seus campos temáticos. Há
um conjunto importante de títulos sobre a história da escravidão
e do pós-abolição que marcou a historiografia. Outro conjunto
de destaque é o que trata das relações entre história, literatura
e política e de temas correlatos, como o teatro de revista,
com alguns títulos que são referência no campo da História
e da Teoria Literária. Um terceiro elenco é formado por títulos
que tratam da relação entre costumes chamados populares e
os saberes institucionais, como a medicina e o direito, que
ajudou a abrir novos caminhos de análise nesses campos. Há
ainda um quarto grupo, dedicado à análise da experiência dos
trabalhadores livres, da experiência operária, que se contrapõe
às tradições mais ortodoxas que presidiram os estudos sobre
esses temas até bem pouco tempo.
Não temos um estudo sobre
a adoção de títulos em cursos, mas um indicador importante
é o fato de que vários títulos de nossa coleção tornaram-se
referências importantes em alguns campos de estudo, aparecendo
sistematicamente em projetos de pesquisa, monografias e teses
de graduação e pós-graduação, na Unicamp e em outras universidades.
JU – E sobre a recepção
nacional e internacional da coleção, há algum estudo ou informação?
Silvia Hunold Lara – Como dissemos, não temos
estudos sobre o impacto nacional ou internacional da coleção.
Mas basta frequentar um congresso ou reunião no Brasil ou
no exterior que trate de temas da História Social do Brasil
que se poderá encontrar referência a uma obra da “Várias Histórias”...
Um título da coleção, Encruzilhadas da liberdade, está sendo
traduzido e em breve será publicado nos Estados Unidos. Além
disso, muitos dos nossos títulos foram resenhados por especialistas,
com elogios, em revistas nacionais e internacionais bastante
prestigiosas.
JU – Quais temas
ou períodos ainda não foram suficientemente explorados ou
abordados nos livros que integram a “Várias Histórias”?
Fernando Teixeira da Silva – Muitos, sem
dúvida. Os temas e períodos abordados estão relacionados aos
interesses individuais e coletivos da área de História Social
do Programa de Pós-Graduação em História da Unicamp e do Cecult.
Há, por exemplo, pouquíssimos estudos sobre o período colonial
– aliás, pouco frequentado pelos historiadores sociais. Gostaríamos
também de ver mais títulos sobre questões culturais vinculados
à história do trabalho livre, tais como religiosidade e relações
raciais. Mas nossas esperanças e apostas estão depositadas
nos próximos jovens historiadores que defenderão suas dissertações
e teses, e na nossa própria capacidade de criação e renovação.
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