Tese avalia resistência de estruturas
de concreto em situação de incêndio
Estudo concentra-se na observação de
quanto do material se desprende em lascas
O
comportamento do concreto em situação de incêndio orienta
linha de pesquisa desenvolvida no Laboratório de Estruturas
e Construção Civil, do Departamento de Estruturas da Faculdade
de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp,
em projeto temático da Fapesp desenvolvido conjuntamente com
as unidades de engenharia civil da USP de São Paulo e de São
Carlos. As investigações são coordenadas na Universidade pelo
professor Armando Lopes Moreno Junior. Ele orientou tese de
doutorado de Adriana Aparecida Ambrosio de Souza, que desenvolveu
método de ensaio para avaliar a tendência de desprendimento,
de forma explosiva, de lascas de concreto quando em situação
de incêndio. A pesquisadora avaliou a eficiência de seu método
de ensaio em concretos com misturas usuais em nosso país e
em concretos com resistências de até seis vezes maior que
a normalmente utilizada.
Durante
as situações de incêndio, são as reações da macroestrutura
do material, como os lascamentos – chamados de spalling quando
ocorrem de forma explosiva –, que podem contribuir para acelerar
eventual ruína, seja devido à exposição da armadura ou diminuição
da seção dos elementos estruturais.
O lascamento
é um fenômeno que ainda não tem procedimentos normatizados
para verificação em laboratório. Este fato motivou a autora
da tese a desenvolver trabalho que resultou em proposta de
um procedimento de ensaio que permite avaliar a tendência
ao lascamento de misturas de concreto em situação de incêndio.
Os resultados a levaram à conclusão de que esse fenômeno está
relacionado principalmente ao tipo de agregado utilizado e
à umidade do material. Mais que isso, ela concluiu que o procedimento
proposto é eficaz na avaliação e determinação do tipo de dano
causado no concreto submetido a altas temperaturas.
Os resultados
comprovaram a possibilidade de explosão do concreto em situação
de incêndio em que alguns materiais de alta resistência avaliados
sofreram lascamentos explosivos quando aquecidos em acidente
simulado em laboratório. A metodologia desenvolvida permite
descartar a utilização de certas misturas, não adequadas às
situações de incêndio, que percam resistência ou provoquem
ferimentos a ocupantes ou bombeiros.
Em decorrência
da proposta e paralelamente, a pesquisadora se propôs a desenvolver
procedimento que pudesse ser transformado em norma brasileira.
Os resultados obtidos levaram a elaboração da primeira versão
do projeto de norma encaminhado à Associação Brasileira de
Normas Técnicas (ABNT), onde está em discussão para que se
inicie um processo que poderá gerar, segundo Adriana, a adoção
de um procedimento que certamente incorporará outras sugestões.
A autora
esclarece que a normatização prescreverá procedimentos que
garantam o comportamento dos vários tipos de concreto face
às situações de fogo. Ela chama a atenção para o fato de que,
em relação à segurança ao fogo, as Normas Técnicas NBR (Norma
BrasileiraRegulamentada) – da ABNT apresentam conceitos baseados
em normas internacionais adaptadas às condições nacionais.
A pesquisadora
estudou concretos usuais nas obras da região de Campinas,
preparados nas dosagens oferecidas pelas usinas. Esses concretos
apresentam variação do cimento, dos agregados e dos aditivos.
Ela lembra que na região se usa basalto, pedra mais resistente
que o calcário, e que neles a composição de carbonatos e silicatos
têm composição variável e dependente da jazida de origem.
O estudo
concentrou-se na observação de quanto do material se desprende
em lascas, de forma explosiva ou não. Esse desprendimento,
inclusive, possibilita a exposição ao fogo das barras de aço
do elemento estrutural que podem sofrer ruptura prematuramente,
diminuindo o tempo necessário de evacuação dos ocupantes.
Adriana esclarece que os danos no aço exposto se dão já a
partir dos 500 graus, ao passo que no concreto ocorrem próximos
aos mil graus.
O ensaio
proposto, explica, possibilita o redimensionamento de mistura
de concreto que apresente o problema em laboratório, alterando
quantidades de materiais ou acrescentando outros de forma
a garantir segurança em situação de incêndio da estrutura
ao prevenir o lascamento explosivo.
Experimentos
Para as observações experimentais
foram preparados prismas de concreto em dosagens usuais com
dois tipos de brita (pedra) utilizadas no país. Uma vez curados
e secos, os prismas são então devidamente fixados em uma janela
do forno de aquecimento, que simula, eletronicamente, a elevação
de temperatura em razão do tempo durante um incêndio (padrão).
Ligado o forno, a temperatura atinge 600 graus em apenas 5
minutos e continua a crescer de maneira mais branda, até alcançar
cerca de 1.250 graus em 120 minutos. O ensaio restringe-se
aos primeiros 60 minutos.
Adriana explica que existem
curvas padrões de aquecimento construídas em função do tempo
e da temperatura que simulam incêndios em edifícios ou mesmo
em túneis. Com base nelas é possível estabelecer o tempo de
aquecimento que permite alcançar a temperatura desejada. Nessas
condições, ela avaliou 72 amostras de concreto.
Uma vez naturalmente frias,
as amostras são então submetidas à avaliação visual do lascamento
e da fissuração. No trabalho, foi tentada uma quantificação
do fenômeno por grau de fissuração e de perda de massa. A
mensuração, segundo a pesquisadora, deve gerar muita discussão
no meio técnico científico, antes que se proponha uma padronização
e é alvo, atualmente, de intensa discussão pelo grupo de pesquisadores
da Unicamp.
Apesar de os danos causados
pelo aquecimento no concreto não terem determinação quantitativa,
Adriana afirma: “Fizemos a classificação das ocorrências observadas
e estamos propondo um procedimento que possa conduzir a uma
normatização técnica”. Ou seja, para verificar se um concreto
tem a tendência ao lascamento, ele poderá vir a ser submetido
a testes de laboratório que permitam determinar o seu comportamento
em função da classificação desenvolvida e, se for o caso,
propor alterações na mistura com vistas à redução de danos.
A pesquisadora explica que
a normatização apresentaria uma classificação de danos em
relação a fissuras ou lascamentos em função da resistência
de cada mistura avaliada. Com isso, se poderá propor, em vista
da resistência desejada, o que deve ser feito para diminuir
o dano provocado pelo fogo.
Adriana esclarece que no Brasil
não existem padrões estabelecidos para esses fins, o que não
permite comparar resultados. Segundo ela, essa normatização
na realidade não existe em nenhum país. Em relação aos trabalhos
que estão sendo desenvolvidos, alguns pesquisadores fizeram
análises de laboratório que não se tornaram procedimentos;
outros estão tentando melhorar suas propostas para conseguir
a normatização.
Adriana lembra que essa linha
de pesquisa é recente no Brasil e por isso há ainda muito
a desenvolver e estudar – ela foi uma das pioneiras nesses
estudos já na iniciação científica, há cerca de dez anos.
“O que já pesquisamos em relação a concreto é muito pouco,
porque tudo que se muda na sua formulação influencia em suas
características. Por exemplo, a alteração do teor de água
com vistas à obtenção de um concreto mais poroso influi no
comportamento em relação ao fogo. Na preparação do concreto
usa-se cimento, agregado, água, areia, e aditivos vários nas
mais diferentes dosagens para atender às mais diversas finalidades”,
acrescenta. Hoje não se produzem mais concretos sem aditivos
e os utilizados para aumentar a resistência têm, por exemplo,
influência no comportamento em relação ao aquecimento. Todos
os fatores intervenientes têm que ser levados em consideração
nos estudos, o que não é fácil, considera a pesquisadora.
Em razão das sugestões apresentadas
durante a defesa da tese e seguindo tendência atual, Adriana
está montando um projeto para o pós-doutorado com vistas à
utilização de materiais reciclados ou do meio ambiente misturados
ao agregado para aplicá-los na construção. “Vamos começar
a verificar o comportamento desses materiais em relação ao
fogo. Podemos fazer misturas em várias proporções com o agregado
e até trocá-lo totalmente”, revela.
Entre os vários materiais
alternativos, podem ser utilizados cacos de cerâmicas, tijolos,
telhas, porcelana e borracha de pneus. Ela lembra que hoje
existem no mercado bancos de resíduos, pois os materiais descartáveis
em um processo não são mais jogados e tudo é comercializado.
Por fim, o professor Armando
Moreno constata que “nos últimos 50 anos, temos visto o crescente
interesse internacional dos pesquisadores na investigação
do comportamento do concreto em situação de incêndio. Em nosso
país, o interesse é recente. Recente também é a normatização
sobre o tema. O avanço se dá em termos de normatização e simulação
numérica, mas ainda muito deve ser feito em termos de simulação
em laboratório. Talvez, o grande empecilho seja o elevado
custo destes equipamentos, tanto é que ainda não existem no
Brasil grandes fornos para avaliação de elementos estruturais
em situação de incêndio”.
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Publicação
Tese: “Processo de ensaio para verificação
em laboratório da tendência ao lascamento do concreto em situação
de incêndio”
Autora: Adriana Aparecida Ambrosio de Souza
Orientador: Armando Lopes Moreno Junior
Unidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura
e Urbanismo (FEC)
Financiamento: Fapesp
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