Uma política pública para a educação alimentar
Walter
Belik
Dag Mendonça Lima
O
sistema público de saúde brasileiro gasta alguns bilhões
de reais tratando de doenças que poderiam ser facilmente
evitadas através da informação e educação alimentar. Em
boa parte dos países da Europa, as crianças recebem informações
na escola sobre a produção e a qualidade dos alimentos que
consomem. Nesses países, a publicidade de alimentos está
banida do horário nobre da TV e os apresentadores de programas
infantis estão proibidos de anunciar qualquer tipo de alimento
ou bebida. No Brasil, em nome da liberdade de informação,
crianças e adolescentes são bombardeadas com todo tipo de
apelo anunciado por super-heróis, craques de futebol e artistas
para que se juntem ao clube dos novos consumidores.
Vivemos atualmente no país
uma fase que os técnicos denominam de transição epidemiológica
na qual estamos passando da alta prevalência de doenças
infecciosas, sempre associadas à desnutrição para novas
enfermidades, de características degenerativas muito associadas
ao estilo de vida urbano. O crescimento econômico dos últimos
anos e a redução dos níveis de pobreza lançaram um alerta
sobre a necessidade de conhecer e controlar melhor aquilo
que o brasileiro come.
Tomando-se como base a Pesquisa
de Orçamentos Familiares de 2003, podemos observar que para
cada real adicional de renda, o brasileiro tende a gastar
uma parcela significativa em alimentos. Curiosamente, a
alimentação fora de casa tende a aumentar em uma proporção
até mesmo maior que o próprio consumo domiciliar, dado o
atrativo que essa representa no imaginário das classes mais
pobres. Entre 2003 e 2008 aproximadamente 20 milhões de
brasileiros saíram da pobreza e, nesses anos todos, o consumo
de alimentos não para de crescer. Dados extraídos da Abras
– Associação Brasileira de Supermercados dão conta que as
vendas físicas de alimentos no auto-serviço cresceram 8,98%
em 2008 (no ano da crise) e no ano de 2009, até o mês de
agosto, essas vendas registram um aumento real de 5,30%.
O consumo de alimentos envolve
um processo social que engloba múltiplas maneiras de acesso
de bens e serviços, definindo a identidade do indivíduo,
estilos de vida e status social, apresentando uma maneira
de se descartar e diferenciar, a partir do que consome,
o grupo ao qual pertence. A necessidade do consumo diz respeito
não somente às necessidades mais básicas para a manutenção
da saúde e da vida através do estabelecimento das funções
vitais, mas também pela relação e grande apelo que a mídia
exerce sobre os consumidores. A mídia agrega aos produtos
satisfação individual no consumo de certos alimentos, e
também faz despertar interesse no consumo de novos alimentos
através de estratégias de marketing bastante eficientes.
Nesse sentido, avaliar a
influência da mídia no comportamento de consumo do público
comum, e em especial do público infantil, é condição básica
para avaliar os níveis de ingestão de alimentos ou grupos
de alimentos que podem de alguma maneira não ser adequados
para o consumo, podendo provocar algum prejuízo à saúde
desta parcela da população. No Brasil esta discussão está
em processo adiantado e teve como origem uma consulta pública
proposta pela Anvisa em 2006. A previsão é de que até o
final de 2010 o Congresso aprove recomendações e normas
de marketing e publicidade, especialmente aquelas voltadas
para o público infantil.
Em meio a essa discussão
o Nepa (Núcleo de Estudos e Pesquisas em Alimentação da
Unicamp), em parceria com o Idec – Instituto de Defesa do
Consumidor, está divulgando os resultados de uma pesquisa
realizada em 14 países de três continentes sobre o conteúdo
nutricional dos lanches consumidos nas principais redes
de fast-food. As conclusões demonstram os efeitos negativos
da propaganda e a baixa preocupação dessas empresas com
relação à informação e a apresentação de alternativas saudáveis
aos consumidores.
Para apresentar os resultados
desse trabalho, e conhecer o que pensam os especialistas
e os órgãos de regulação, o Nepa organizou no último dia
16 de outubro, dia mundial da alimentação, a mesa-redonda
“Mudanças nos Hábitos de Consumo e Saúde”. Como sabemos,
o tema é bastante controverso e a Unicamp não poderia estar
à margem desta discussão.