CARLOS
HENRIQUE DE BRITO CRUZ
A recente criação,
pela Unicamp, de uma Agência de Inovação
para azeitar e intensificar sua tradição
de parcerias estratégicas com os setores
de produção de bens e serviços
públicos ou privados
sugere uma reflexão sobre o estágio
inovativo da indústria nacional, sua
competitividade atual e a responsabilidade
que tem nisso a universidade brasileira, sobretudo
aquela que é capaz de gerar conhecimento
novo.
No último meio século
o Brasil construiu um respeitável parque
produtivo que prima pelo tamanho e pela diversidade.
Além das áreas clássicas
da indústria de transformação,
como a metalúrgica, a siderúrgica,
a automotiva, a de papel e celulose etc, o
país tem se destacado, mais recentemente,
em domínios antes só acessíveis
a umas poucas nações, como a
aeronáutica e a exploração
do ciclo completo do petróleo, sem
falar no avanço espetacular do agronegócio
nos últimos trinta anos.
Paralelamente, o Brasil
tem sido capaz de produzir ciência na
fronteira do conhecimento. Um claro sinal
disso é sua participação
em publicações científicas
internacionais, que aumentou de 0,3% para
1,5% desde 1980 e cabe lembrar que
artigos científicos equivalem a pesquisas
realizadas. Ao mesmo tempo, graças
à construção de um sólido
sistema de pós-graduação
a partir da década de 70, o Brasil
está entre os raros países capazes
de formar seis mil doutores por ano
boa parte deles engenheiros aptos a formular,
gerar e desenvolver inovação.
Então por que o país,
com tais indicadores positivos atividade
industrial diversificada, universidades que
pesquisam e aproximadamente 80 mil cientistas
qualificados , continua a padecer do
problema crônico da baixa competitividade
em muitas de suas áreas produtivas?
A explicação não é
difícil e pode ser obtida num comparativo
com, por exemplo, a Coréia do Sul,
país que tem um terço da população
brasileira, densidade industrial menor mas
que pratica uma cultura de inovação
que ainda nos falta. O segredo da indústria
coreana, assim como acontece em outros países
de industrialização avançada,
foi empregar tantos cientistas quantos possível
cerca de 90% dos disponíveis
no mercado coreano os quais se dedicam
diariamente a desenvolver pesquisa e desenvolvimento,
enquanto a indústria brasileira, dispondo
rigorosamente do mesmo número de cientistas,
contenta-se em empregar apenas um décimo
deles.
Não se trata, evidentemente,
de falta de percepção ou de
conservadorismo dos industriais brasileiros.
Nunca foi fácil investir em pesquisa
e desenvolvimento num cenário de intranqüilidade
econômica, juros altos e moeda instável.
Trata-se de um investimento caro e de retorno
lento. Nos últimos oito anos a situação
tornou-se menos inóspita com a relativa
estabilidade da moeda, embora os juros continuem
a ser um grave fator de desestímulo.
Sobretudo a partir de 1998 a cultura da inovação
logrou introduzir-se em alguns estamentos
da indústria brasileira e o próprio
Estado esboçou uma política
a meu ver bem sucedida de apoio
às atividades de P&D que incluiu
a criação de fundos de apoio
(os fundos setoriais) e a elaboração
de uma Lei de Inovação cujo
andamento no Congresso parece depender, agora,
da vontade política do novo governo.
De todo modo basta ver a
quantidade e a qualidade dos debates que se
realizam sobre o tema, no país, para
compreender que a inovação é
hoje, entre nós, um processo tão
necessário quanto irreversível.
É, mesmo, uma questão de sobrevivência.
A universidade pública, cuja função
principal sempre foi ensinar e produzir profissionais
competentes, graças, aliás,
ao diferencial da pesquisa que produz, pode
e deve ser o parceiro estratégico do
setor produtivo nesse processo. Isto é
algo que deixa para trás o modelo clássico
da interação universidade-empresa
baseado no conceito de que os laboratórios
acadêmicos fariam a inovação
de que a indústria necessita, quando
essa vocação, nos países
competitivos, é da própria indústria
e não se separa de seus fins.
Se ninguém conhece
melhor as demandas de mercado do que a própria
empresa, a universidade pode ser para ela
um aliado precioso na identificação
de oportunidades tecnológicas, na formulação
de projetos cooperativos, na estimulação
de empresas ou setores de base tecnológica,
na implantação ou no fortalecimento
de atividades de P&D e até mesmo
na captação de recursos para
projetos de interesse comum. São pontos
que constam da plataforma de trabalho da Agência
de Inovação (www.inova.unicamp.br)
que a Unicamp acaba de instalar em seu campus
de Campinas, e que desde já mantém
suas portas abertas à sociedade e ao
empresariado interessado nas atividades de
inovação.