Largando
a enxada
Moradores rurais encontram empregos
de melhor qualidade fora da agricultura
mpurrados
para fora do campo por causa da incorporação
de modernas tecnologias - principalmente aquelas destinadas
a operações de colheita e pós-colheita
- e pela queda da área cultivada em importantes
culturas como café, grãos e oleaginosas
(algodão, arroz, feijão e trigo) na agropecuária
paulista ao longo dos anos 90, uma legião de moradores
rurais encontrou ocupações profissionais
de qualidade equivalente ou até melhor àquelas
que exerciam anteriormente na agricultura. Com exceção
do emprego feminino nos serviços domésticos,
os resultados foram bastante positivos para uma série
de atividades não-agrícolas.
A
constatação é do engenheiro agrônomo
Otavio Valentim Balsadi, que analisou a qualidade do emprego
agrícola e não-agrícola da população
rural economicamente ativa no Estado de São Paulo
nos anos 90, em sua dissertação de mestrado
defendida na Unicamp. Orientado pelo professor José
Graziano da Silva, do Instituto de Economia (IE), o estudo,
pela qualidade e ineditismo, foi considerado este ano
a melhor dissertação em economia rural pela
Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural (Sober).
Ao
proporcionar remuneração superior à
da agricultura, utilizar mão-de-obra familiar que
fica ociosa na propriedade rural, principalmente da mulher,
e complementar a geração de emprego e renda
nos casos em que a agricultura já não consegue
absorver toda a população economicamente
ativa do meio rural, as ocupações não-agrícolas
cumprem um importante papel no alívio da pobreza
no campo, embora possam apresentar condições
de acesso mais exigentes, como educação
e qualificação profissional.
Pelo
seu estágio de urbanização e desenvolvimento,
São Paulo, entre os estados brasileiros, é
o que apresenta melhores condições de trabalho
para os empregados rurais ocupados em atividades não-agrícolas,
bem acima dos resultados verificados em alguns países
latino-americanos, observa o autor.
Condições
favoráveis Para os homens empregados
residentes rurais, os resultados obtidos por Balsadi para
os índices de qualidade do emprego mostraram que
todos os grupos de ocupações não-agrícolas
por ele pesquisados (da indústria de transformação,
comércio não-especializado, serviços
não-domésticos e serviços domésticos)
apresentaram melhores condições de trabalho
do que os grupos de trabalhadores agrícolas permanentes
e temporários. Apenas o grupo dos operadores agrícolas
(em que a operação de equipamentos automatizados
exige maior grau de qualificação profissional)
superou os de serviços domésticos e construção
civil, em termos de qualidade do emprego.
Em
outras palavras, para os homens empregados residentes
no meio rural, as ocupações agrícolas
tiveram pior qualidade de trabalho do que as não-agrícolas,
com exceção dos operadores agrícolas.
A inserção dos homens em empregos não-agrícolas
significou a obtenção de melhores condições
de trabalho em comparação aos empregos agrícolas,
mesmo que a atividade fosse na construção
civil e nos serviços domésticos, como caseiros,
explica Otavio, que é analista da Fundação
Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade), órgão
da Secretaria Estadual de Economia e Planejamento.
Para
as mulheres residentes no meio rural não metropolitano,
observa Balsadi, o ingresso nas atividades não-agrícolas
só não significou a obtenção
de melhores condições de trabalho quando
o emprego era nos serviços domésticos, justamente
o grupo de ocupações mais significativo
para elas, responsável por quase 50% dos empregos
não-agrícolas das mulheres rurais. Por outro
lado, pondera ele, a inserção na indústria
de transformação, nos ensinos público
e privado, no comércio não-especializado
e nos serviços não-domésticos ofereceu
condições bem mais favoráveis do
que o trabalho na agricultura.
Grande
desafio Otavio salienta que os resultados de
sua pesquisa têm um desdobramento interessante no
que se refere à formulação de políticas
de geração de emprego e renda para a população
residente no meio rural.
Se,
por um lado, o fomento às atividades não-agrícolas
tem um efeito muito positivo em termos de melhoria da
qualidade do emprego e, por conseqüência, das
condições de vida dos trabalhadores com
residência rural, por outro, ainda resta um grande
desafio, que é como definir políticas que
gerem mais empregos na agricultura e, ao mesmo tempo,
melhorem as condições de trabalho para as
pessoas nela empregadas, enfatiza o engenheiro agrônomo.
Segundo
ele, essa necessária integração das
atividades agrícolas e não-agrícolas,
gerando empregos de melhor qualidade, em projetos de desenvolvimento
local e regional sustentáveis, ainda está
por ser enfrentada pelas políticas públicas.
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A
mudança estrutural do trabalho no campo
Nos
anos 90, consolidou-se no Estado de São Paulo uma
mudança estrutural em curso desde meados
da década de 80 nas ocupações
da população economicamente ativa residente
no meio rural. No período 1992-98, houve um grande
aumento da participação, tanto dos homens
quanto das mulheres, em atividades não-agrícolas.
Esse
movimento ganhou tal magnitude no Estado que, no final
dos anos 90, mais de 50% da população economicamente
ativa (PEA) com residência rural ocupava-se em atividades
não-agrícolas, conforme pesquisas desenvolvidas
pelo Projeto Rurbano, do Núcleo de
Estudos Agrícolas (NEA) do IE da Unicamp. Como
resultado desse êxodo, a PEA agrícola no
Estado de São Paulo passou de 1.261 mil pessoas
ocupadas em 1992, para 944 mil em 1998, segundo os dados
da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(PNAD).
Com
esse quadro geral de mudanças estruturais na PEA
rural paulista, marcada pelo contínuo crescimento
das ocupações não-agrícolas,
tornou-se fundamental avaliar se o emprego não-agrícola
dos residentes rurais oferecia melhores condições
de trabalho em relação ao emprego nas tradicionais
atividades agropecuárias, justifica Otavio
Balsadi, a respeito da motivação de seu
estudo.
No
desenvolvimento da pesquisa, ele se valeu de informações
da PNAD para os residentes na região não
metropolitana e definiu três grupos de ocupações
agrícolas (trabalhadores permanentes, trabalhadores
temporários e operadores agrícolas) e sete
não-agrícolas (serviços domésticos,
serviços não-domésticos, indústria
de transformação, comércio não-especializado,
motoristas, professores e construção civil).
Para a comparação dos grupos de ocupações
agrícolas e não-agrícolas foi construído
um índice de qualidade do emprego (IQE), a partir
de indicadores ligados ao rendimento na atividade principal,
grau de formalização do trabalho e benefícios
recebidos pelos empregados (auxílio-transporte,
tíquete-alimentação, assistência
médica, entre outros).
Ao
final da coleta e cruzamento de dados, os resultados mostraram
um quadro mais favorável para os grupos de ocupações
não-agrícolas dos residentes rurais, com
exceção dos serviços domésticos
para as mulheres.
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