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A arquitetura a serviço do ensino
Livro de docente da FEC mostra
importância
das edificações para aprendizado de alunos
Está
estabelecido na literatura internacional que um ambiente arquitetônico
como o de uma escola pode interferir na aprendizagem do aluno,
o que prova que a arquitetura escolar é um tema de elevada
importância a ser considerado quando um projetista é chamado
a fazer o seu trabalho. Tarefa simples não é, ainda mais quando
este profissional tem que lidar com pouco espaço, pouco dinheiro
e pouco tempo. Neste caso, o conhecimento sobre a arquitetura
escolar, nos seus aspectos mais amplos de conforto, funcionalidade
e beleza, apoia o projetista na busca de um ambiente ideal
para abrigar as atividades de ensino.
Anos depois de ter recebido o seu primeiro grande desafio
como estudante de arquitetura da Universidade de Melbourne,
Austrália, para idealizar um projeto de uma escola, Doris
Kowaltowski, hoje professora titular da Faculdade de Engenharia
Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp, teve a chance
de retribuí-lo com sua experiência. Ela acaba de publicar
o livro Arquitetura Escolar: o Projeto do Ambiente de Ensino,
lançado pela Editora Oficina de Textos, primeira obra da professora
em carreira solo.
A docente
detalha em 272 páginas os aspectos a serem observados antes
de se executar um projeto. O livro teve a contribuição de
colegas de Doris do Departamento de Arquitetura e Construção,
como as professoras Lucila Labaki, Stelamaris Rolla, Regina
Ruschel e Silvia Mikami. Os desenhos que ilustram os conceitos
foram criados pelo também arquiteto professor Francisco Borges
Filho.
Arquitetura
Escolar deverá atrair profissionais que projetam escolas,
universitários, escolas que repensam seus projetos, pesquisadores
e interessados no assunto. O livro tem apoio financeiro da
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp)
e já está à venda nas livrarias e na Editora que o lançou.
O trabalho
é dedicado a Marlei do Nascimento, professora do ensino fundamental
que participou do primeiro projeto Fapesp sobre o ambiente
escolar com a autora do livro. “Com ela, homenageamos os alfabetizadores
que atuam em escolas públicas. Essas pessoas são verdadeiras
heroínas no ensino”, diz Doris. Além disso, a apresentação
do livro é assinada pela arquiteta Cibele Haddad Taralli,
professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade
de São Paulo.
Para
Doris, elementos como funcionalidade, identidade com a pedagogia
e infraestrutura configuram a distinção e o reconhecimento
do ambiente escolar em suas múltiplas funções, e a discussão
sobre a qualidade do ambiente de ensino leva ao questionamento
de “como o projeto arquitetônico pode contribuir para aumentar
essa qualidade”.
A obra
apresenta teorias de pedagogia e metodologias de ensino, discute
a composição de ambientes escolares formados por alunos, professores,
equipamentos, móveis e a arquitetura em sua volta. Aborda
a história da arquitetura escolar no mundo, e introduz suas
tendências e conceitos.
No
contexto escolar, a arquiteta recomenda que haja, antes de
se projetar, um processo analítico e participativo com professores,
alunos, pais e comunidade, para formar uma discussão mais
robusta que estimule o projetista a fazer inserções diferenciadas.
É desejável ainda um processo educativo com a comunidade que
receberá o prédio, para entender o potencial da nova edificação
escolar. “Um ambiente é composto de elementos arquitetônicos,
mas não deve ser exclusivamente tradicional, com sala de aula,
corredor e uma quadra, por exemplo. Muitos consideram isso
escola. Para mim, é muito mais. Tem que acomodar as atividades
pedagógicas, para que contribuam para um aprendizado mais
rico.”
A professora
relembra o desafio de Melbourne, em que projetou uma escola
numa situação urbana central, com um terreno muito pequeno.
À época, tinha lido muito sobre um ambiente ideal. A construção
horizontalizada, relata, sempre foi considerada a melhor.
“Então me dei um desafio e fiz uma escola em que o pátio ficava
no teto, para horizontalizar as atividades criadas.”
Doris
se formou com honras. Fez então o mestrado na Universidade
de Berkeley, Califórnia (depois partiu para o doutorado na
mesma universidade, dedicando-se à arquitetura escolar e aos
seus aspectos humanizadores), onde discutiu o ambiente escolar,
as novas pedagogias da década de 1970 e como a arquitetura
escolar deveria reagir às tendências. Era uma época de incertezas,
conta, em que se procurava aprimorar o ensino, a priori nos
EUA, isso com uma dinâmica muito rápida.
Os profissionais
ficavam perdidos, porque havia uma inclinação à arquitetura
escolar ser neutra em certo sentido e ao mesmo tempo flexível,
com o professor configurando o ambiente com a necessidade.
“Isso foi um desastre!”, sinaliza Doris. “Aqueles prédios
eram quase barracões vazios com divisórias flexíveis, que
podiam ser postas e retiradas em minutos. Entretanto, os professores
e as classes perderam seus territórios próprios e, em alguns
casos, usavam-se móveis para criar nichos.”
Na sua
avaliação de hoje, é possível que aquele tenha sido um problema
de processo do projeto. Os professores não foram instruídos
a usar os prédios e nem se sentiram à vontade de mudar as
divisórias para criar ambientes mais adequados. “Logo, a flexibilidade
é um conceito valioso em arquitetura pois a sociedade muda,
bem como as ideias e os equipamentos. A cada dia se ensina
diferente do que se ensinava há 50 anos”, refere.
“Esse
conceito deve ser sempre considerado mas não pode ser neutro
e precisa dar indicações aos usuários.”
A infraestrutura
também deve ser projetada para ampliar a flexibilidade de
uso dos espaços. Antigamente havia apenas uma tomada nas salas
de aula. Hoje há várias e, além disso, rede wireless para
as pessoas usarem os ambientes mais plenamente em diferentes
momentos.
Brasil
O Brasil tem uma longa história de arquitetura escolar. Houve
épocas em que ela foi quase um monumento das cidades. Os prédios
tinham um alto investimento do Estado e do município, sendo
em geral construídos na praça principal, junto à Prefeitura
e à igreja matriz. Eram representados por uma arquitetura
eclética, destinando-se mais à elite. “Com a democratização,
o crescimento urbano e as políticas de ensino para todos,
houve períodos em que os Estados e municípios tiveram que
se apressar por construir escolas para oferecer vagas”, contextualiza
Doris. Com isso, criaram-se as escolas-padrões. Até agora
a situação é esta. Os Estados estão investindo em projetos
mais racionais.
Em São Paulo, há uma longa
tradição de que o Estado dá suporte a estas construções. “Tivemos
a Companhia de Construções Escolares (Conesp), depois substituída
pela Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE)”, informa
ela. Esta Fundação tem uma expertise acumulada sobretudo porque
ela administra todas as obras, reformas e manutenções das
escolas estaduais. Com esta experiência, a FDE sabe o que
não funciona. Isso foi repassado aos projetos. Agora ela apoia
o processo de projeto junto com arquitetos. Quando é época
de contratá-los, acompanha o processo de projeto e os orienta
em todas as etapas.
“Esta arquitetura, que não
é mais a padrão, também é baseada em padrões”, pontua Doris.
O arquiteto recebe o trabalho e ganha uma lista de ambientes,
como programa arquitetônico, e sabe que não pode sair do estipulado.
“Isso é problemático porque bons profissionais devem ter liberdade
de interpretar o programa para soluções de qualidade.”
A professora comenta que orientou
uma pesquisa de mestrado com apoio da Fapesp em que foram
entrevistados arquitetos que tinham feito projetos há pouco
com a FDE. Foi-lhes indagado como trabalhavam com a Fundação.
Alguns disseram que tentavam agregar algo ao solicitado. “Isso
mostra o carinho que têm com a arquitetura escolar.”
Doris recomenda que os arquitetos
se debrucem sobre questões complicadas. Esse processo no pré-projeto
tem que ser bem cuidadoso e o seu desenvolvimento precisa
de um feedback. “Levá-lo ao conhecimento da comunidade, para
que ela o visualize, a fim de saber se funciona, é um retorno
valoroso. Depois é preciso refletir, arrumar e repensar, reagindo
se os resultados são inesperados. São vários instantes de
análise.”
A docente realça que são pelo
menos 35 os parâmetros para o projeto escolar, não podendo
faltar o conforto ambiental, a acessibilidade plena e a sustentabilidade.
A sala de aula deve ser o espaço mais importante. Dentro dela,
existem 18 modalidades de aprendizado, entre elas o estudo
independente, em pequenos grupos, o dirigido pelo professor
e a distância. “Essas atividades não podem ocorrer numa sala
5m X 5m com cadeirinha, mesinha e lousa. Deve haver variedade
de formato de espaços”, alerta. Outra coisa: “se a entrada
não for convidativa, isso não criará uma relação da escola
com a comunidade”.
No último capítulo, a obra
aborda os processos de projeto nas etapas que se pretende
melhorar. A sustentabilidade é tratada como item de primeira
grandeza nos prédios atuais. Pensando nisso, a FDE introduziu
no Brasil o certificado da sustentabilidade, no qual os projetos
escolares devem se pautar.
O livro conclui que a arquitetura
escolar necessita reflexão a partir da complexidade de suas
variáveis, inclusive em diferentes metodologias de ensino,
na dinâmica da sociedade, na situação urbana ou rural que
se coloca. Esta arquitetura serve à sociedade do futuro. “Precisa
ser especial, correta, estética e um abrigo positivo, dando
suporte ao ensino de qualidade. Gostaríamos que a arquitetura
fosse um lugar para as comunidades, as crianças e os professores.
Que eles vissem o local como um espaço de prazer, pertencimento
e suporte a convivências, em particular aquelas que ficam
na memória”, expõe Doris.
Jundiaí tem trabalho
de excelência na área
A docente relata que está
ministrando uma disciplina com a professora Labaki sobre
arquitetura bioclimática, ensinando aos futuros arquitetos
um olhar atento sobre ambiente escolar, sobretudo no que
diz respeito ao conforto térmico. Neste semestre sugeriram
aos alunos solucionar problemas das escolas municipais de
Jundiaí que, segundo Doris, possui um trabalho de excelência
em arquitetura escolar. A cidade, afirma, passa por um sistema
de manutenção em que cada escola recebe, duas vezes ao ano,
a visita de uma equipe de mão de obra especializada que
desembarca com todas as ferramentas para melhorar o prédio.
Em uma semana deixam a escola “novinha em folha”. É um trabalho
de restauro em que os professores esperam a sua vez de receber
as instalações.
Uma inovação que Jundiaí
fez, dentro de um projeto de memória institucional, foi
pedir às professoras para estimularem as crianças a realizar
desenhos sobre sua escola, selecionados pelos próprios alunos
e reproduzidos em escala maior nos muros, que são – na visão
de Doris – a identidade da escola. A Secretaria de Educação
de lá busca outras melhorias e veio à Unicamp pedir ajuda,
lembra a arquiteta, para introduzir um projeto padrão na
cidade. Os alunos terão pela frente um trabalho com certo
nível de padronização para racionalizar uma construção,
mas ao mesmo tempo dando identidade e qualidade para cada
escola implantada.
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Publicação
Livro “Arquitetura Escolar: o Projeto do Ambiente
de Ensino”
Autora: Doris Kowaltowski
Editora: Oficina de Textos
Financiamento: Fapesp
Páginas: 272
Preço: R$ 75,00
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