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Estudo identifica perfil genético de
bactéria causadora de câncer gástrico
H. pylori é responsável por várias
doenças que atingem principalmente o estômago
A
em sua tese de doutorado, recentemente defendida na Faculdade
de Ciências Médicas (FCM), o perfil genético de cepas da bactéria
Helicobacter pylori (H. pylori) no câncer gástrico precoce
e no avançado, em pacientes submetidos à endoscopia digestiva
alta ou à cirurgia no Centro de Diagnóstico de Doenças do
Aparelho Digestivo (Gastrocentro) da Unicamp. Ela conseguiu
observar diferença no gene cag-A, que pertence a uma “ilha
de patogenicidade”. Seu sistema de agressão consiste na produção
de substâncias que aderem à mucosa gástrica. A farmacêutica,
orientada pelo gastroenterologista da Universidade José Murilo
Robilotta Zeitune, constatou que o risco de câncer avançado
nas pessoas contaminadas com a bactéria que contém esses genes
é três vezes maior. O estudo foi efetuado em cinco regiões
genômicas principais (urease C, vac-A, cag-A, cag-T e dup-A
em suas duas regiões).
O H.
pylori, explica Zeitune, é uma bactéria responsável por várias
doenças gástricas que acometem a população mundial e fica
localizada principalmente no antro, porção final do estômago,
“não penetrando nem a mucosa do estômago e nem o duodeno”,
informa. Esse microrganismo determina danos fundamentalmente
ligados à úlcera gástrica e duodenal, a maioria das gastrites
crônicas, a 60% dos adenocarcinomas do estômago e ao linfoma
do tipo Malt (neoplasias com características especiais que
apresentam disseminação sistêmica apenas em estágios avançados).
Existem hoje, no entanto, outras doenças fora do aparelho
digestivo relacionadas ao H. pylori, enfatiza a farmacêutica,
que desde o mestrado investiga essa bactéria mediante técnicas
de biologia molecular.
Nesse
aspecto, na Unicamp, a linha de pesquisa de Zeitune também
vem decifrando a relação do H. pylori com a púrpura trombocitopênica
idiopática (doença caracterizada pela destruição das plaquetas).
Vem estudando ainda a relação da bactéria com doenças do fígado
e, recentemente, publicou um trabalho com a professora Helena
Grotto, do Departamento de Patologia Clínica, avaliando o
H. pylori com alguns casos de anemia ferropriva (redução da
quantidade total de ferro corporal até a exaustão das suas
reservas; o fornecimento de ferro é insuficiente para atingir
as necessidades de diferentes tecidos, incluindo as necessidades
para a formação da hemoglobina e dos glóbulos vermelhos).
O H.
pylori desde 1994 é considerado pela Organização Mundial da
Saúde (OMS) um carcinógeno tipo 1 – ou seja, um agente que
causa câncer –, tendo uma nítida associação com o câncer gástrico,
principalmente do tipo intestinal. No presente estudo, o câncer
desse tipo pareceu estar relacionado à presença da bactéria,
que provoca lesões iniciais na mucosa gástrica e que vão se
agravando, podendo evoluir para o câncer. “No Brasil, o diagnóstico
do câncer gástrico precoce tem sido realizado em torno de
10% a 13% da população. No Japão, ele bate à casa dos 40%
e, por este motivo, o país se especializou na sua detecção”,
conta o médico.
O câncer
precoce, aquele que apenas acomete a mucosa e a submucosa,
pode ser curável na maioria dos casos, tranquilizam Zeitune
e Bruna Röesler. Acontece que o diagnóstico é feito muito
tardiamente, devido à ausência de sintomas no início da doença
ou ao autotratamento. Por isso ele caminha para o câncer avançado.
Mesmo assim, ele pode permanecer precoce por longos anos,
o que leva a supor, eventuamente, o seu potencial ao desaparecimento,
frisa o médico.
Características
Como o H. pylori acaba sendo a mola propulsora para muitas
manifestações do câncer gástrico, a ideia foi entender se
essa bactéria que está no câncer gástrico precoce é igual
àquela presente no câncer avançado. “Conseguimos verificar
uma diferença que pode trazer luz no sentido de explicar por
que esse câncer gástrico precoce se transforma em avançado
e o tempo que isso leva para acontecer”, afirma o gastroenterologista.
“Nossa pesquisa identificou uma diferença genética nessa bactéria
e o próximo passo será saber como está o seu sequenciamento,
tanto no câncer precoce quanto no avançado. Pela primeira
vez aprofundamos o estudo do H. pylori com o câncer gástrico
precoce.”
A descoberta foi bastante
interessante, na opinião do especialista, já que o portador
do câncer precoce tem reais chances de cura em 90% dos casos.
Segundo ele, o Gastrocentro segue hoje cerca de 120 pacientes
nessas condições. Além do mais, relata ele, a unidade soma
profissionais capacitados para fazer diagnóstico inicial desse
câncer, o que aumentaria as possibilidades de cura desses
pacientes. “Todos nossos endoscopistas têm formação no Japão
e estão aptos a diagnosticar imagens atípicas no estômago.”
Estatisticamente, o perfil
genético do câncer gástrico precoce, esclarece a farmacêutica,
é um pouco diferente do avançado. Isso de certa forma permitirá
desenvolver mais linhas de pesquisa relacionadas ao assunto
e procurar outros genes associados ao câncer precoce. “Contudo,
o mais importante foi levantar o problema desse câncer, não
somente do ponto de vista clínico. É preciso entender como
ele caminha, ou para ser avançado ou para permanecer como
ele está, ou até para desaparecer.”
Até o momento não se sabe
exatamente como essa bactéria leva à formação da úlcera. Normalmente
a etiopatogenia é o H. pylori. “O que temos certeza é que,
quando um paciente tem uma úlcera duodenal e presença de H.
pylori, a sua erradicação leva à cicatrização da lesão ulcerada.
Isso já sabemos. Agora, ainda não está esclarecido como ele
causa a lesão crônica”, pontua a farmacêutica.
O câncer gástrico é dividido
em dois tipos principais: o intestinal e o difuso. O tipo
intestinal é mais associado ao H. pylori e fica localizado
geralmente na região de maior concentração dessa bactéria
no estômago, sendo que 95% são adenocarcinomas tanto precoces
como avançados.
Ainda no tipo intestinal,
acredita-se que a bactéria provoque uma cascata de alterações,
facilitando o desenvolvimento do câncer. Esta cascata começa
com inflamação na mucosa gástrica, muitas vezes assintomática,
e que pode levar a inflamações mais graves como uma gastrite
atrófica (situação em que diminuem muito as células da mucosa
do estômago), que ainda conduziria a uma outra inflamação
mais grave, que seria uma metaplasia intestinal. Esta metaplasia,
por sua vez, levaria à displasia, que finalmente resultaria
em uma neoplasia, que é o câncer.
Rotina
Zeitune menciona que, no protocolo de atendimento do Gastrocentro,
suspeita-se de câncer na vigência de quadros sintomáticos,
com pacientes na faixa etária entre 50 e 60 anos, sem muita
disposição para se alimentar, com anemia e histórico familiar
de câncer.
O padrão-ouro para o diagnóstico
do câncer gástrico é a endoscopia digestiva alta.
Sobre as perspectivas para os pacientes com câncer precoce,
o médico realça que elas são boas. Se detectado nesta fase,
através de terapêutica endoscópica, em geral não exige procedimento
cirúrgico e raramente requer cirurgia aberta. A sobrevida
em cinco a dez anos gira em torno de 90%, e o paciente fica
praticamente curado. De outra via, se o câncer é avançado,
depois de cinco anos essa sobrevida cai para 20%.
Um comportamento que está
chamando a atenção de Bruna Röesler e de Zeitune é que, apesar
do câncer gástrico ser frequente no Brasil, na região Sudeste
ele parece estar diminuindo a sua prevalência, e curiosamente
nas mulheres. Esta queda já é visível em países desenvolvidos
como os Estados Unidos, desde a década de 1940.
O câncer gástrico, ressalta
Bruna Röesler, depende da interação de três fatores para o
seu desenvolvimento: além da presença da bactéria, as características
genéticas de cada indivíduo contaminado e fatores ambientais
como o tipo de alimentação, por exemplo. “O consumo de alimentos
salgados, enlatados e com muitos conservantes pode propiciar
um aumento no número desse câncer”.
Ainda que desconhecendo o
mecanismo de transmissão da bactéria, já é fato que as baixas
condições sanitárias e de higiene colaboram sobremodo para
a contaminação. “Além disso, quem vive em locais menos favorecidos
economicamente tem uma proporção mais alta de contaminação
pela bactéria”, esclarece a farmacêutica. “Quando essas condições
melhoram, diminuem as incidências de doenças associadas à
infecção pela bactéria.”
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Publicação
Tese de Doutorado “Detecção e análise dos padrões
genotípicos de cepas do Helicobacter pylori em amostras de
tecido gástrico obtidas de pacientes com adenocarcinoma gástrico
distal do tipo intestinal nos estágios precoce e avançado”
Autora: Bruna Maria Röesler
Orientadores: José Murilo Robilotta Zeitune
e Sandra Cecília Botelho Costa
Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM)
Financiamento: Capes
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