De volta à segunda casa
FamÃlia doa à Unicamp arquivo pessoal do historiador José Roberto
do Amaral Lapa, fundador do CMU e do IFCH
MANUEL ALVES FILHO
O arquivo
pessoal do historiador José Roberto do Amaral Lapa, composto
por objetos pessoais, documentos, correspondência, originais
de livros e projetos de seus ex-alunos de graduação e pós-graduação,
entre outros, acaba de ser doado pela famÃlia do intelectual
à Unicamp. O material, que chegou acondicionado em caixas
de papelão, começou a ser analisado e organizado na última
semana pela equipe do Centro de Memória da Unicamp (CMU),
onde permanecerá guardado. De acordo com Fernando Antônio
Abrahão, supervisor da área de Arquivos Históricos do CMU,
a expectativa é que parte do acervo seja colocada à disposição
para consulta pública até o final do ano.
“Pela relação que a famÃlia nos deu, nós já podemos adiantar que se trata de uma coleção extremamente ricaâ€, afirma. Ele adianta que a Universidade tem interesse em adquirir a biblioteca do historiador, mas isso depende de alguns entendimentos. Amaral Lapa, como era mais conhecido, morreu em 2000, aos 70 anos. Ele foi professor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) e fundador do CMU.
Fernando Abrahão conta que o interesse da Unicamp pelo arquivo pessoal de Amaral Lapa surgiu logo após a morte do professor. Na época, a famÃlia informou que os objetos e documentos do intelectual estavam sendo relacionados e organizados, mas manifestou a intenção de doá-los à Universidade. Na mesma ocasião, os familiares também foram sondados sobre a possibilidade da venda da biblioteca do historiador. “Eles demonstraram interesse nesse sentido, visto que todo o acervo do professor Amaral Lapa poderia ser mantido na Unicamp, instituição onde ele passou a maior parte da sua vida acadêmicaâ€, relata o supervisor da área de Arquivos Históricos do CMU.
Após algumas conversações entre as partes, ficou definido que o arquivo pessoal de Amaral Lapa seria mesmo doado à Unicamp. Quanto à compra da biblioteca por parte da Universidade, o acordo ainda dependerá da avaliação do acervo e da disponibilidade de recursos. “Nossa expectativa é que tudo dê certo, pois se trata de uma coleção de grande valor para os pesquisadoresâ€, considera Fernando Abrahão.
Segundo ele, o arquivo pessoal do ex-docente da Unicamp chegou ao CMU acondicionado em 82 caixas de papelão. O material foi previamente organizado pela famÃlia do intelectual, que elaborou uma lista com cada um dos itens. “Abrimos apenas uma ou outra caixa, mas sabemos o que há dentro de todas elasâ€, afirma. O material doado à Unicamp foi dividido em dois segmentos: vida pessoal e vida profissional. Entre os itens estão correspondências, objetos de escritório, projetos e relatórios de pesquisa, cópias de projetos de ex-alunos, bibliografias e até mesmo originais de alguns livros escritos por Amaral Lapa. Um deles é a obra Os ExcluÃdos – Contribuição à história da pobreza no Brasil (1850-1930), que acaba de ser lançado pela Editora da Unicamp. Também fazem parte do acervo fotos, medalhas, objetos indÃgenas e até tijolos da época do Império, que devem ter sido coletados pelo historiador por ocasião da demolição de algum imóvel em Campinas ou região.
Entre
os papéis presentes na coleção, alguns chamam especial a
atenção, assinala Fernando Abrahão, por revelarem um aspecto
pouco conhecido da vida de Amaral Lapa. São artigos e crÃticas
literárias escritas por ele para os jornais Diário do Povo
e Correio Popular, ambos de Campinas, mas assinados com
os pseudônimos de Gonçalves do Amaral e Percival da Mata.
“Quando Lapa era jovem, ele tinha mania de assinar seus
escritos com outros nomes. Houve época em que usava quatro
pseudônimos diferentesâ€, lembra Elida Gomes do Amaral Lapa,
viúva do historiador. Segundo o supervisor da área de Arquivos
Históricos do CMU, além do valor inestimável para a pesquisa,
o acervo também é importante por demonstrar como era feita
a pesquisa histórica no passado. “Quase tudo era feito sem
o auxÃlio do computador ou da internetâ€, exemplifica.
Brevemente, prossegue Fernando Abrahão, a Unicamp deverá organizar uma cerimônia para oficializar a doação do arquivo pessoal do professor, inclusive com a assinatura de um termo especÃfico. Futuramente, infere, é possÃvel que os documentos sejam digitalizados, como forma de serem mais bem preservados. Quanto à biblioteca de Amaral Lapa, a viúva do historiador informa haver mais de 9 mil tÃtulos. “Creio que o acervo deve contar com obras valiosas, pois o professor Amaral Lapa pesquisou muito em Portugal e amealhou livros sobre temas como a inquisição e a economia cafeeira. Isso sem falar de documentos sobre a história de Campinas, sua cidade natal, assunto no qual ele sempre foi referência obrigatóriaâ€.
Historiador pretendia que acervo ficasse na Unicamp
A vinda do arquivo pessoal
de Amaral Lapa para o CMU da Unicamp atende a um desejo
manifestado pelo próprio historiador. Quem afirma é
a viúva do intelectual, Elida. “Quando viajava, Lapa
ficava muito receoso em relação à integridade do seu
acervo. Em várias oportunidades ele afirmou que gostaria
que todo o material ficasse sob a guarda da Unicamp.
A doação do seu arquivo pessoal à Universidade é uma
forma de atender parcialmente ao desejo deleâ€, afirma.
De acordo com ela, a venda da biblioteca à instituição
deve completar a ação. “Fizemos um inventário preliminar
e somamos cerca de 9 mil tÃtulos. Agora, vamos esperar
pela avaliação da coleção, para que possamos finalizar
a negociação com a Unicampâ€, acrescenta.
Amaral Lapa era considerado uma referência no paÃs como historiador. Ele foi professor IFCH e fundador do CMU. Também foi autor de vários livros, alguns deles sobre Campinas, o que lhe valeu o reconhecimento por parte de seus pares como o “maior historiador da cidadeâ€. Entre os tÃtulos publicados destacam-se A Cidade: os Cantos e os Antros, Livro da Visitação do Santo OfÃcio da Inquisição ao Estado do Grão-Pará, A Bahia e a Carreira da Ãndia, Economia Colonial e Historiografia Brasileira Contemporânea. Natural de Campinas, Amaral Lapa formou-se professor normalista em 1940 pelo Instituto Carlos Gomes e em técnico de contabilidade pela Escola Técnica de Comércio Campineira. Bacharel em Ciências JurÃdicas e Sociais pela PUC-Campinas (1959), tornou-se doutor em Ciências pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de MarÃlia (1966). Morreu em junho de 2000, aos 70 anos. Integrante do grupo de professores ilustres da Unicamp, recebeu postumamente o tÃtulo de Professor Emérito da Universidade.
Sobre o CMU
O Centro de Memória da Unicamp (CMU), órgão vinculado à Reitoria da Universidade, tem como objetivo promover e integrar estudos e pesquisas interdisciplinares voltados à reconstrução da memória histórica e sócio-cultural de Campinas e região. Para a realização desse trabalho, o CMU conta com acervos documentais e bibliográficos. Cuida, ainda, da restauração, organização, conservação e divulgação dessas coleções. Para atingir seus objetivos, o Centro se propõe a realizar pesquisas próprias e/ou em convênios com outras instituições (prefeituras, escolas, organizações não-governamentais etc.). Presta assessoria a projetos ligados à memória histórica e ao patrimônio sócio-cultural, organiza e promove eventos de ordem acadêmica (seminários, conferências, exposições) cursos, treinamentos e/ou estágios voltados à preservação da memória nas áreas de Arquivologia, Biblioteconomia, Restauração de Documentos, História Oral e Iconografia.