MANUEL
ALVES FILHO
Dentro
das próximas semanas, pesquisadores do Instituto de Computação
(IC), da Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri) e do
Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas
à Agricultura (Cepagri), todos da Unicamp, iniciarão os
primeiros testes de campo de soluções desenvolvidas no âmbito
do projeto “eFarms, uma estrada de mão dupla de pequenas
propriedades rurais para o mundo em rede”. O objetivo da
iniciativa, financiada pelo Instituto Virtual Fapesp-Microsoft
Research, com apoio e parceria da Cooperativa Regional de
Cafeicultores em Guaxupé Ltda (Cooxupé), é desenvolver ferramentas
computacionais e infraestrutura de comunicação de dados
de baixo custo para auxiliar agricultores a tomar decisões
referentes à gestão, manejo e planejamento de safra. “Trata-se
de uma pesquisa de caráter multidisciplinar e com grande
alcance social”, considera Claudia Maria Bauzer Medeiros,
docente do IC e coordenadora do projeto.
As pesquisas em torno do eFarms começaram em 2007. De lá
para cá, informa a professora, os trabalhos evoluíram significativamente.
Isso se deve, segundo ela, à excelência e à afinação dos
pesquisadores, que vêm trabalhando juntos desde 1998 em
outros projetos na área de gerenciamento de dados agrícolas.
Uma grande parte dos protótipos concebidos pela equipe está
pronta. Já estão em operação alguns softwares e uma rede
sem fio de baixo custo, que liga o IC a redes de sensores
na Feagri. Também foram criados modelos matemáticos específicos.
“O próximo passo será levar tudo isso para áreas rurais,
com acompanhamento da Cooxupé, para testarmos em condições
reais de uso. Nossa expectativa é que o projeto seja encerrado
entre abril e maio de 2010”, adianta.
Os softwares concebidos para o eFarms terão a missão de
cruzar e tratar dados de diferentes ordens, fornecidos tanto
por sensores instalados no solo, que medirão atributos como
temperatura, umidade e luminosidade, quanto por satélites,
que darão informações como as condições da cobertura vegetal.
Esse tipo de tecnologia, conforme a professora do IC, tem
um caráter marcadamente inovador, inclusive em âmbito internacional.
O mais interessante é que as análises das informações coletadas
poderão ser feitas em várias dimensões, a partir de séries
históricas. O produtor rural poderá, por exemplo, comparar
o desempenho entre os talhões da sua propriedade. “Nada
impede, porém, que o modelo seja estendido para avaliações
nos âmbitos estadual ou regional”, adianta Claudia Medeiros.
A
infraestrutura de comunicação de dados implantada pelos
pesquisadores da Unicamp, que ajudará a alimentar o banco
de dados, utiliza tecnologia de redes sem fio. De acordo
com a professora, trata-se de um trabalho bastante complexo,
que exige muito conhecimento em engenharias eletrônica e
de redes. “Os sensores são dispositivos sensíveis. Não é
fácil montá-los ou mantê-los. Por estarem instalados no
campo, eles sofrem interferência do crescimento das plantas
ou da ação do vento. Além disso, em algum momento a bateria
acaba. Dependendo do relevo, a transmissão do sinal também
pode ser atenuada. Todos esses problemas estão sendo atacados
pelo grupo, que montou redes reais para os experimentos,
quando o mais comum é lançar mão de redes simuladas”, detalha.
Dito de maneira simplificada, o sistema como um todo funcionará
da seguinte forma. Os sensores instalados no campo farão
as medições das variáveis associadas ao desenvolvimento
dos pés de café. Em seguida, através da rede sem fio, os
dados serão enviados, com frequência ainda a ser determinada,
para uma pequena estação intermediária, instalada na própria
fazenda ou nas proximidades. Esta, por sua vez, transmitirá
os dados para um banco instalado da Cooxupé, que se encarregará,
com o suporte das ferramentas computacionais, de promover
o cruzamento, integração e interpretação das informações,
que serão posteriormente repassadas aos seus 11 mil cooperados
espalhados principalmente pelos estados de Minas Gerais
e São Paulo. “De posse desses elementos, os produtores terão
condições de aperfeiçoar o planejamento e o manejo das plantações,
bem como a previsão de safra”, afirma Claudia Medeiros.
Como o próprio nome do projeto indica, o tráfego de dados
proporcionado pelo eFarms terá duas mãos. Da mesma forma
como a Cooxupé abastecerá os cooperados com informações
já processadas e que ajudarão a orientar a gestão dos negócios
e o manejo das plantações, estes também poderão confirmar
se as orientações estão ou não adequadas, o que realimentará
a massa de informações disponíveis. “Ou seja, o produtor
não apenas consumirá, mas também produzirá informações de
interesse de toda a comunidade rural”, explica a coordenadora
do projeto.
A docente destaca, ainda, que o eFarms também prevê a interligação
entre as propriedades rurais e destas à cooperativa. Atualmente,
segundo a docente do IC, esse contato é bastante complicado,
em razão das dificuldades técnicas e do alto custo para
a implantação de redes de comunicação em áreas rurais brasileiras.
“A solução que estamos propondo também prevê o acesso à
internet, outra necessidade dos agricultores. O uso dessa
ferramenta deverá beneficiar outros grupos além dos ruralistas,
pois a Cooxupé mantém, em parceria com prefeituras, cursos
de informática gratuitos em diversas cidades”, esclarece.
Nos próximos dias, os pesquisadores da Unicamp e representantes
da Cooxupé terão um encontro para definir a estratégia que
orientará os testes de campo. A cooperativa indicará quais
propriedades participarão da experiência e se encarregará
da instalação dos dispositivos e equipamentos, sob a orientação
dos cientistas. “Depois que os testes de campo forem validados,
ficará a critério da cooperativa adotar ou não essas novas
tecnologias. Nossa expectativa é que isso ocorra, visto
que as ferramentas serão de grande valia para os cafeicultores,
que passarão a contar com dados confiáveis para gerir suas
propriedades”, pondera Claudia Medeiros. Ainda segundo ela,
as mesmas soluções podem ser aplicadas a outras culturas,
com eventuais adaptações. “Para os cafeicultores, é importante
saber o grau de umidade das folhas do pé de café. Já os
citricultores podem ser interessar por outro tipo de informação”,
exemplifica.
A
coordenadora do eFarms reforça que, em razão da sua complexidade
e inovação, o projeto não teria sido executado sem o esforço
conjunto de especialistas em computação e ciências agrárias.
“Embora sejamos de áreas diferentes, conseguimos construir
um diálogo único que nos levou a resultados muito interessantes”,
analisa Claudia Medeiros. A abordagem multidisciplinar,
registre-se, tem outro viés importante, refletido na formação
de pessoal altamente qualificado para trabalhar nessas áreas.
No contexto do eFarms, informa a docente, foram concluídas
ou estão em andamento 12 dissertações e teses, considerando
tanto o IC quanto a Feagri. Outro fator assinalado por ela
foi a oportunidade oferecida pelo edital do Instituto Virtual
Fapesp-Microsoft Research, que buscava projetos de pesquisa
inovadores e com aplicação social. Segundo a docente, o
edital atraiu o interesse da Cooxupé.