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Quitosana, alginato e antimicrobiano
compõem curativo para queimaduras
Membranas podem ser usadas como
adesivos
protetores encontrados no mercado
Um curativo à base de membranas de quitosana e alginato incorporando
o agente antimicrobiano AlphaSan®RC2000, medicamento contendo
10% de prata, apresentou elevado potencial em tratamento de
queimaduras e outros tipos de lesões de pele. A pesquisa desenvolvida
por Ana Kelly Girata e orientada pela professora Ângela Maria
Moraes, em vias de patenteamento pela Agência de Inovação
Inova Unicamp, mostra que as membranas com o agente antimicrobiano,
quando umedecidas com fluidos similares aos corpóreos, tornam-se
anatômicas e possuem capacidade adequada de absorção de exsudatos
(líquido que sai de ferimentos). De acordo com testes in vivo,
as membranas foram classificadas como não-sensibilizantes
e não-irritantes. Pelos testes de atividade antimicrobiana,
as membranas foram eficazes contra as cepas por Staphylococcus
aureus e Pseudomonas aeruginosa. Os resultados da pesquisa,
na opinião da autora, devem trazer contribuição importante
para vítimas de queimaduras e soluções econômicas para a saúde
pública.
Ana Kelly explica que a quitosana
é um polímero natural obtido pela desacetilação da quitina
(polissacarídeo encontrado no exoesqueleto de crustáceos)
e apresenta propriedades antimicrobianas (como agente bactericida,
bacteriostático, fungicida e fungistático) e cicatrizantes,
conforme já descrito na literatura. Por ser biocompatível
e naturalmente degradada no organismo (o monômero e os oligômeros
de glucosamina são substâncias que participam de rotas do
metabolismo animal) e apresentar propriedade de formar géis
em soluções ácidas fracas, sua capacidade de utilização em
formulações farmacêuticas para aplicações tópicas em ferimentos,
queimaduras e/ou vesículas oriundas de agressões fúngicas
ou bacterianas vem sendo estudada por vários pesquisadores.
Vários grupos de pesquisas
vêm publicando trabalhos que enfocam o desenvolvimento de
matrizes de alginato e quitosana, justamente por sua alta
aplicabilidade na área de curativos, segundo Ana Kelly. E
os resultados de sua pesquisa confirmam que as propriedades
dos dispositivos formados por esses polímeros podem ser melhoradas
quando usadas em conjunto, pois apresentam maior estabilidade
a variações de pH e maior eficiência na liberação controlada
de princípios ativos, conforme observado também em pesquisas
anteriores. A associação dos dois compostos também possibilita
uma ação positiva na absorção dos fluidos das lesões, além
de permitir a redução do custo final dos dispositivos, segundo
a pesquisadora.
As
membranas com o agente antimicrobiano foram capazes de liberar
até 100% do fármaco incorporado ao longo de sete dias de ensaio.
Com o aumento da concentração do fármaco nas membranas de
quitosana e alginato, segundo Ana Kelly, foi observado que
a membrana se tornou mais opaca e espessa. A pesquisadora
também declara que os benefícios da utilização dos curativos
com prata superam a desvantagem de seu efeito citotóxico,
já que o estudo constatou moderada citotoxicidade a fibroblastos
das membranas de quitosana e alginato contendo a prata. Durante
o estudo, os curativos foram produzidos, esterilizados e caracterizados,
e a prata liberada foi quantificada.
A pesquisadora explica que
o uso diverso de agentes antimicrobianos tem sido fundamental
na prevenção e na terapia de infecções. Entre os metais nobres,
a prata é o mais utilizado, sendo aplicada em tratamentos
de infecções por queimaduras, feridas abertas e úlceras crônicas.
O agente antimicrobiano, segundo Ana, é composto de 10% de
prata, sendo praticamente insolúvel em água. É constituído
por uma rede tridimensional de fosfato hidrogenado de zircônio,
sódio e prata, com muitas cavidades equidistantes contendo
prata.
Ana Kelly explica que as membranas
podem ser usadas como se fossem os conhecidos adesivos protetores
encontrados no mercado, com a vantagem de não precisarem ser
trocadas com frequência, já que apresentaram baixa perda de
massa quando colocadas em contato com fluidos similares aos
corpóreos durante a pesquisa. Isso, segundo Ana Kelly, diminui
o trauma ocasionado pela troca constante de curativos.
Outra aplicação das membranas
com o agente antimicrobiano seria em casos de recuperação
de desbridamento cirúrgico, como em procedimentos estéticos,
mas ela esclarece que não foram realizados testes em sua pesquisa.
Elas são finas e podem ser eficientes também na recuperação
de tecidos que passaram por cirurgia. Neste caso, pode ser
utilizada como uma segunda pele protetora, segundo a pesquisadora.
Além disso, as membranas controlam infecções bacterianas.
Polímeros
As propriedades musoadesivas
do alginato também chamaram a atenção dos pesquisadores. Esse
polissacarídeo, segundo ela, é utilizado na indústria farmacêutica
e alimentícia para encapsular fármacos e macromoléculas. Ela
o descreve com material inerte, biocompatível e biorreversível.
Assim como a quitosana, segundo Ana Kelly, o alginato está
entre as fibras naturais consideradas promissoras por causa
da não-toxicidade e bioatividade. Ela acrescenta que fibras
de variados tipos têm sido utilizadas em curativos devido
à maciez, capacidade de absorção de fluidos e facilidade de
fabricação. Além disso, os polissacarídeos têm diversas características
tecnológica e economicamente relevantes, segundo Ana Kelly.
Segundo Ana Kelly, após a
adição de AlphaSan® RC2000 não houve desestruturação do complexo
polimérico da quitosana e alginato. A eficiência de incorporação
do agente antimicrobiano chegou a 99%, o que indica uma perda
pequena de fármaco durante o processo de incorporação.
Ela enfatiza que sem o agente
antimicrobiano, as membranas não apresentaram efeito bactericida,
já as preparadas com 1,1% de prata, apresentaram eficácia
contra as bactérias (Staphylococcus aureus e Pseudomonas
aeruginosa) causadoras de infecções. Isso indica a preservação
da atividade microbicida do AlphaSan® durante o tratamento.
A
pesquisadora explica que a cicatrização de feridas de pele,
além do uso de curativos, depende de vários fatores como causa
da lesão, estado nutricional do paciente, nível de manutenção
da função das áreas afetadas, cuidados específicos com a área
lesada, doenças associadas, além da atitude positiva e cooperação
do paciente. Baseada em outros estudos, ela lembra que o tratamento
da ferida deve, além de obter a cicatrização, não permitir
maior perda de tecido, promover ótimas condições caso procedimentos
cirúrgicos sejam necessários, ser o mais indolor possível
e prevenir infecções.
Ana Kelly acrescenta que,
além dos elevados custos financeiros, a grande incidência
de queimaduras com desdobramentos relacionados à mortalidade
e morbidade traz consequências sociais sobre os portadores,
que frequentemente desenvolvem sequelas que podem levar à
perda de membros e outras funções, resultando em afastamento
do trabalho e de outras atividades. Ana enfatiza que embora
haja investimento em pesquisas voltadas para a compreensão
dos processos e fenômenos das diversas fases de reparação
dos tecidos, o índice de queimaduras com consequências sérias
tem-se mantido bastante alto.
Linha de pesquisa
O trabalho de Ana faz parte
de uma linha de pesquisa coordenada pela professora Ângela,
com ênfase em aplicações da quitosana. Um aspecto interessante
é a parceria entre a universidade e a indústria, uma vez que
a pesquisa teve apoio técnico da empresa LM Farma Indústria
e Comércio Ltda., situada em São José dos Campos (SP). A empresa
especializada na produção de curativos e outros produtos de
uso clínico. “Os estudos são realizados com farmacêuticos
para se chegar a uma característica aplicável”, informa.
De acordo com Ana Kelly, o
trabalho, desenvolvido no Laboratório de Engenharia de Biorreações
e Colóides da FEQ/Unicamp, contou com apoio fundamental de
outros trabalhos desenvolvidos pela equipe da professora Ângela.
Como exemplo, ela menciona uma tese de doutorado que desenvolveu
metodologias escalonáveis de preparação e caracterização de
membranas de quitosana e alginato contendo o antibiótico bacitracina.
Outro trabalho é uma dissertação de mestrado que estudou a
adição de surfatantes e o uso de reticulantes bicompatíveis
à mistura polissacarídica, visando à melhoria da distribuição
das cadeias poliméricas e a melhoria das propriedades mecânicas
da membrana.
Além da patente “Membranas
de quitosana e alginato incorporando fármacos”, submetida
ao INPI, a pesquisa resultou num pedido de registro na Anvisa
e um artigo publicado nos anais do 18º Simpósio Nacional de
Bioprocessos.
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■ Publicação
Artigo: “Curativos
de quitosana e alginato contendo prata”. 18º Simpósio Nacional
de Bioprocessos.
Tese: Desenvolvimento de curativos de quitosana
e alginato contendo fosfato hidrogenado de zircônio, sódio
e prata
Autora: Ana Kelly Girata
Orientadora: Ângela Maria Moraes
Unidade: Faculdade de Engenharia Química
(FEQ)
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