|
Diretor revela planos
do CNRS no Brasil
Centro francês
abre escritório de
representação no Rio de Janeiro
O
CNRS Brasil, escritório de representação
do Centre National de la Recherche Scientifique, foi inaugurado
oficialmente no último dia 16, no Rio de Janeiro. Trata-se
da mais importante instituição francesa pública
de pesquisas, com longa trajetória de cooperação
com pesquisadores brasileiros.
O escritório funcionará no Brasil
sob a direção de Jean-Pierre Briot, membro do
Laboratoire d'Informatique de Paris 6 (LIP6), laboratório
de ciência da computação conjunto da Université
Pierre et Marie Curie (Paris 6) e do CNRS. Na entrevista que
segue, Briot revelou os projetos do centro no país
ao professor do Departamento de Ciência Política
do IFCH Andrei Koerner, que atualmente realiza pesquisa sobre
Justiça Constitucional junto ao Institut des Études
Politiques de Paris, com apoio da Capes.
Quais são as perspectivas do
CNRS acerca das atividades de pesquisa junto a instituições
brasileiras?
Jean-Pierre Briot - O CNRS é
a primeira instituição pública de pesquisas
na França. Ele cobre todos os campos científicos
e é estruturado em 10 Institutos - biologia, química,
ecologia e meio ambiente, informática, matemática,
ciências da engenharia, física, física
nuclear e de partículas, ciências humanas e sociais,
ciências do universo -, mais as ações
interdisciplinares, entre as quais nanociências e desenvolvimento
durável.
Em 2009, o orçamento do CNRS foi de 3,367 bilhões
de euros.
O centro conta com 26 mil funcionários
em seu quadro permanente - sendo que, destes, 11,6 mil são
pesquisadores - e 7,6 mil contratados, como os pesquisadores
associados e doutorandos. Possui 1,2 mil laboratórios,
dos quais quase 90% são em parceria com estabelecimentos
de ensino superior ou empresas. Publica, em média,
25 mil trabalhos científicos por ano, e mais de 50%
deles são em coautoria com ao menos um laboratório
estrangeiro. Está em primeiro lugar entre instituições
públicas na França em registro de patentes:
até 2009, por exemplo, havia registrado 3.765 patentes,
382 novas, das quais 44,5% já estão em exploração.
Enfim, desde 1999 foram criadas 503 empresas de inovação,
42 apenas em 2009.
O Brasil é um parceiro estratégico
do CNRS, notadamente por sua presença crescente na
cena científica internacional, pois está em
segundo lugar no aumento do número de publicações,
depois da China; a França é o seu segundo parceiro
científico, depois dos Estados Unidos; apresenta objetos
de estudo e questões científicas muito importantes,
como biodiversidade, modelos de desenvolvimento e outros.
Sobre a biodiversidade, aliás, é preciso ressaltar
a recente criação do Centro Franco-Brasileiro
da Biodiversidade Amazônica.
É importante ressaltar também
que o Brasil é o país com o qual a França
tem a sua fronteira externa mais extensa. Enfim, existe um
histórico de cooperação com a França,
como, por exemplo, Claude Henri Gorceix, Oswaldo Cruz, Claude
Lévi-Strauss etc.
O CNRS assinou quatro convênios com
instituições de pesquisa brasileiras: o CNPq
(desde 1975, prorrogada em 2007), a Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
(Fapesp/2004), a Fiocruz (2006) e a Fundação
de Amparo a Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb/2006).
Atualmente, o CNRS mantém vários
acordos de cooperação com o Brasil, entre os
quais com o Impa, no Rio de Janeiro. Outros três laboratórios
associados - um com a Fiocruz em imunologia/biomedicina, outro
com a UESC em Ilhéus (Bahia) em análises químicas
e o terceiro, com a USP, UFSC e UFMG, em modelização
do magnetismo. São nove projetos de cooperação
científica, denominados Pics e 26 bilaterais - do tipo
intercâmbio de pesquisadores -, mais 16 projetos regionais
na América do Sul e uma participação
no Réseau de Mathématiques Franco-Brésilien.
Vale ressaltar também que, em 2009, houve 858 missões
de pesquisadores do CNRS no Brasil.
Quais são os objetivos do escritório do CNRS
no país?
Jean-Pierre Briot - Este é o nono escritório
do CNRS no exterior, sendo que os demais estão em Bruxelas
(para a Europa); Hanói (para a Ásia); Johanesburgo
(para a África); Moscou (para a Rússia e Comunidade
dos Estados Independentes); Pequim (para a China); Santiago
do Chile (para a América Latina); Tóquio (para
o Japão e a Coréia); e Washington (para os Estados
Unidos e o Canadá). Há o projeto de criar um
décimo escritório na Índia. Pode-se observar
que a quase totalidade dos escritórios são regionais,
e o CNRS criou um dedicado apenas ao Brasil, o que mostra
a importância e a vontade de parceria privilegiada com
o país.
O CNRS Brasil está instalado na Maison
de France, no Consulado Geral da França no Rio de Janeiro.
Esta sede abriga também outros serviços franceses
(Mission Economique, Chambre de Commerce) ou europeus (Consulados
da Finlândia e da Alemanha). A localização
oferece, além disso, proximidade com numerosas instituições
científicas federais de excelência, como a Academia
Brasileira de Ciências, Finep, Impa (matemática),
Fiocruz (biomedicina) e CBPF (física), ao mesmo tempo
em que assegura uma representação nacional para
o conjunto dos parceiros científicos do país.
De um modo geral, o escritório CNRS
Brasil tem por objetivo ajudar a ampliar a colaboração
científica entre o CNRS e, de maneira mais geral, a
França e o Brasil. Podem-se considerar três eixos
de atividades principais. O primeiro é a representação
do CNRS e de seus institutos científicos junto às
instituições científicas brasileiras
e, igualmente, a representação das instituições
brasileiras e a informação sobre as políticas
científicas do Brasil destinadas ao CNRS.
O segundo é identificar e/ou imaginar
novas formas e oportunidades de cooperação,
baseando-se no acompanhamento, informação e
representação e o estímulo às
redes de pesquisas. E, por fim, o terceiro eixo é a
facilitação na montagem de cooperações,
incluindo, por exemplo, a participação na organização
de missões de diretores do CNRS no Brasil ou de visitas
de representantes de instituições brasileiras
ao CNRS. Isso também inclui, evidentemente, a ajuda
aos pesquisadores sobre as oportunidades e os instrumentos
de cooperação, tais como os programas entre
o CNRS e as instituições parceiras.
Entre as perspectivas de ação
do escritório e de cooperação com o Brasil,
está em andamento a renovação dos protocolos
entre o CNRS e o CNPq, nosso parceiro tradicional e, de certa
forma, o seu homólogo no Brasil. Nesse âmbito,
novos acordos de cooperação são visados:
a implantação de um GDRI (Groupement De Recherche
International) em ótica quântica/nanomagnetismo
(física) e um novo LIA (Laboratoire International Associé)
em genética dos tumores (biomedicina).
Quais são as principais modalidades de apoio à
pesquisa e como se pode fazer pedidos de financiamento?
Jean-Pierre Briot - O CNRS tem diversos
instrumentos de cooperação internacional, a
começar pelos projetos conjuntos/bilaterais, do tipo
de intercâmbio de pesquisadores - com o CNPq, a Fapesp
e a FioCruz, por exemplo -, que são programas análogos
ao programa Capes-Cofecub. Depois, se passa a níveis
de cooperação progressivamente mais estruturados
e mais perenes e com melhores dotações, que,
em ordem ascendente, são : Pics (Projet International
de Coopération Scientifique), LIA (Laboratoire International
Associé), GDRI (Groupement De Recherche International),
e UMI (Unité Mixte Internationale). Existem atualmente
um UMI, 3 LIAs e 9 Pics com o Brasil, referidos acima.
Além dos programas próprios
ao CNRS ou dos quais ele participa (por exemplo, os programas
regionais na América do Sul), existem igualmente outros
programas: de intercâmbio de pesquisadores, como os
Capes-Cofecub e USP-Cofecub; programas conjuntos com maiores
dotações, entre a Agence Nationale de la Recherche
(ANR) e a Finep, os programas europeus etc.
Vocês têm objetivos de cooperação
em áreas de políticas públicas, como
política ambiental, urbana, de desenvolvimento, políticas
penais ou de segurança pública, etc?
Jean-Pierre Briot - O escritório
não tem ainda uma visão suficientemente completa
do conjunto das atividades e das oportunidades e prioridades
em ciências humanas e sociais (SHS) com o Brasil, para
responder de uma maneira muito precisa à questão.
O escritório é recente, pois foi criado oficialmente
em janeiro, e tornou-se operacional no início de fevereiro.
Não obstante, vou dar uma resposta mais pessoal e prospectiva.
Considero que o Brasil tem características fora do
comum - escala, biodiversidade humana e biológica,
temas relevantes em matéria de modelos de desenvolvimento
etc. Apresenta, assim, além de sua excelência
científica própria, objetos e escalas de estudo
excepcionais. Pesquisadores brasileiros exploram soluções
originais, por exemplo, em matéria de políticas
de gestão da biodiversidade, notadamente na Amazônia,
o que leva a questões específicas de gestão
supranacional com a Guiana Francesa e, então, leva
a outros temas sobre cooperação.
A França foi, e ainda permanece, o
primeiro país de formação e de estágio
- doutorado e pós-doc - de estudantes e pesquisadores
brasileiros em SHS. As potencialidades são, em minha
opinião, muito grandes e ainda insuficientemente exploradas.
Uma análise da cooperação
existente entre o Brasil e a França em SHS -número
de projetos, doutorados sanduíche, coorientações,
missões, colóquios - mostra que elas são
muito numerosas. Entretanto, elas permanecem frequentemente
bastante individualizadas e pouco estruturadas. Sem dúvida,
isto se deve em parte à natureza e à cultura
da atividade dos pesquisadores em SHS, mais individualizada,
diferentemente de disciplinas como, por exemplo, a física,
que, em virtude da natureza das experiências que deve
organizar, tem necessidade de equipes disciplinares fortes.
No entanto, existe um instituto
na França que tem o papel aglutinador em matéria
de pesquisa sobre as Américas: o Instituto
das Américas. Ele deve poder ajudar a estruturar
a cooperação em SHS entre a França e
o Brasil. Aliás, está sendo instalada uma representação
- o Pôle Brésil de l'Institut des Amériques
-, acolhido no Cendotec (Centro
Franco-Brasileiro de Documentação Técnica
e Científica) - em São Paulo. O escritório
está em contato com eles e acompanhará as suas
ações.
Dê-nos um resumo do campo de pesquisas
em inteligência artificial, especialmente a simulação
de sistemas sociais para a resolução de problemas
de cooperação e de decisão coletiva.
Jean-Pierre Briot -
Não vou detalhar aqui as diferentes atividades em matéria
de inteligência artificial, um ramo histórico
e atualmente bastante ativo da informática, pois isso
mereceria outra entrevista. Dado o caráter mais preciso
da sua questão, vou enfocar um exemplo representativo,
uma comunidade interdisciplinar muito interessante e muito
ativa, no cruzamento da modelização, a simulação
e a análise informática de processos sociais.
Esta comunidade é ao mesmo tempo de origem muito diversa
- informáticos, sociólogos, economistas, etc.
- e bem conectada e unida. Ela tem uma revista de referência,
o Journal of Artificial Societies and Social Simulation (JASSS).
Um dos movimentos importantes
no interior desta comunidade é o ComMod (Companion
Modeling). Ele reúne pesquisadores de diferentes
disciplinas - agrônomos, ecologistas, hidrólogos,
sociólogos, informáticos - e volta-se ao estudo
e à construção de uma metodologia para
a gestão participativa de recursos renováveis
-interação de dinâmicas humanas, sociais
e naturais. O movimento é um meio de ultrapassar as
fronteiras disciplinares, e de levar em consideração
a natureza complexa dos sistemas estudados, combinado com
um aspecto de pesquisa voltada à ação.
Quais são as suas pesquisas neste
campo, especialmente em cooperação com pesquisadores
ou laboratórios brasileiros?
Jean-Pierre Briot -
Em nível pessoal, e em decorrência de meu interesse
crescente pela abordagem da comunidade ComMod, iniciei há
cerca de quatro anos, com minha colega Marta Irving, professora
da UFRJ, especialista em gestão social da biodiversidade,
um projeto interdisciplinar e franco-brasileiro, sobre o acompanhamento
informático da gestão participativa de espaços
protegidos - em particular os parques nacionais -, para a
proteção da biodiversidade e a inclusão
social. Este projeto denomina-se SimParc (Simulation
participative de la gestion de Parcs). Ele inclui pesquisadores
em gestão social da biodiversidade, notadamente do
Programa de Pós-Graduação Eicos da UFRJ,
e pesquisadores em informática, sobretudo do LIP6/UMPC-CNRS
e da PUC-Rio.
O objetivo do SimParc é ajudar a compreender
melhor, a formar e a acompanhar tais processos de gestão
participativa, no nível do funcionamento do conselho
de gestão de um parque, que inclui diferentes conselheiros,
representantes de atores sociais - ambientalista, operador
de turismo, comunidade - com interesses a priori potencialmente
divergentes sobre as escolhas de políticas de conservação
dos diferentes setores do parque. Por exemplo, uma escolha
para conservação de uma espécie endêmica,
ou, pelo contrário, uma abordagem mais flexível
que permita o ecoturismo.
Deve-se lembrar que o projeto SimParc pode
tornar-se realidade graças à conjunção
de vários fatores. Inicialmente, a minha inclusão,
pelo CNRS, durante dois anos, no Departamento de Informática
da PUC-Rio, e a liberação de minhas responsabilidades
de chefe de equipe em Paris, me deu a oportunidade e o tempo
de explorar novos domínios.
Para saber mais: www.cnrs-brasil.org.
|
|