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Linhas do tempo
Obras de Geraldo Porto
bordadas por sua mãe, Maria Alves de Carvalho, ilustram
Calendário Unicamp 2010 e integram exposição a ser inaugurada
no próximo
dia 2 na Galeria de Arte
ÁLVARO KASSAB
Geraldo
Porto elege a figura sem ignorar a arte abstrata. O arco de
referências do artista plástico e professor do Instituto de
Artes (IA) é amplo e dispensa barreiras. Da arte bruta à abstrata,
da arte naif à concreta, abraçou as diferenças por entender
que sem elas as coisas ficam sem sentido. Deu-se ao luxo,
passadas quatro décadas de carreira, de levar ao paroxismo
suas experimentações e parcerias. Sua última fornada de obras
exprime esse momento: reúne lirismo, religiosidade, delicadeza,
ironia e exuberância cromática. Os trabalhos são bordados
por sua mãe, Maria Alves de Carvalho, que se viu aos 86 anos
em cadeira de rodas ao fraturar uma perna.
O conjunto dessas obras estará
em exposição de 2 a 18 de dezembro na Galeria de Arte da Unicamp.
Das mais de 40 obras expostas, 12 vão ilustrar o Calendário
Unicamp 2010, cujo lançamento ocorre na galeria no próximo
dia 2, às 17 horas, com a apresentação do Açucena, coral feminino
de 25 vozes, que será regido pela cantora Ana Salvagni. Porto
fez a curadoria dos calendários anteriores, que estamparam
obras de Bernardo Caro (2007), Álvaro de Bautista (2008) e
Fúlvia Gonçalves (2009).
Mãe e filho desprezaram esboços
e planos de voo, dando chance ao acaso. Aleatórias, as formas
foram se encaixando à medida que as peças iam saindo das mãos
e das agulhas afiadas de dona Maria. Porto indicava o melhor
local para colocá-las: o botão aqui, a toalha de renda ali.
Se o resultado final é harmonioso, o mesmo não se pode dizer
do processo de criação. “Brigamos e discutimos muito”, confessa
o artista, que trocou tintas e pincéis por incursões aos bazares
de armarinhos à cata de tecidos, linhas, botões e fitas coloridas,
deslumbrado diante de tantas opções.
Tal
mergulho revolveu as camadas do tempo e da memória do artista.
“Sempre gostei de flores, rendas, tecidos bordados e tudo
o que diz respeito ao universo feminino de fantasia e encantamento”,
revela. Na galeria, ele vai reproduzir um ateliê de costura
em homenagem a sua avó paterna, a professora e costureira
baiana Joana Nogueira Porto, além de expor trabalhos de seus
alunos de Processos Criativos em Artes Plásticas. Também mostrará
criações de outras costureiras e mosaicos de tecidos realizados
com o artista plástico Chico Fransé, parceiro de 40 anos.
Mãe e filho apresentam um
trabalho poético e original, com rendas, chitas, passamanarias,
botões, cetins, veludos, flanelas, sinhaninhas e sedas, matérias
da arte de dar unidade a enredos insólitos e comoventes, que
Porto chama de “panos”.
O artista criou uma aura de
brasilidade que dialoga com a cultura pop. Esse hibridismo
aparece nos retalhos da colcha caipira, no gobelein com mulheres
bordando no frio europeu, na profusão de flores de crochê,
além da assumida influência da religiosidade popular. Misturam-se,
nessas referências do sincretismo, parangolés, inocentes anjos
barrocos, imagens de santos multicoloridas, thangkas budistas
e estandartes da Festa do Divino e das antigas Folias de Reis.
Maria e Geraldo pintam, bordam e costuram para arrematar a tessitura do tempo.
Exposição: Sala dos Milagres, de Geraldo Porto
e convidados
Data: de 2 a 18 de dezembro,
Horários: de segunda a sexta, das 9 às 17
Apresentação,
às 17 horas do dia 2, do Coral Açucena, sob regência de Ana
Salvagni
Local: Galeria de Arte da Unicamp
Endereço: Rua Sergio Buarque de Holanda,
prédio da Biblioteca Central
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