Os jogadores
de futebol podem pôr as barbas de molho. Pouco
afeitos às cobranças da torcida, da
mídia, dos cartolas e dos técnicos,
eles em breve terão pela frente mais um perspicaz
analista de suas atuações em campo:
o computador. A novidade, que promete ser tão
implacável quanto o mais crítico observador
na arquibancada, chama-se SORTTS (Soccer Real-Time
Tracking System), um sistema para gravar e processar
digitalmente, em tempo real, imagens de cada passo
dos 22 atletas e mais o árbitro nos 90 minutos
de jogo.
Desenvolvido
conjuntamente pelo Instituto de Computação
(IC) e pela Faculdade de Educação Física
(FEF) da Unicamp, o projeto, em fase de testes, permite
determinar precisamente a posição de
todos os jogadores a cada instante em uma partida
de futebol. Esse recurso deverá auxiliar, sobretudo,
na preparação física das equipes,
já que as imagens fornecem importantes informações
biométricas dos atletas, como velocidade, aceleração,
distâncias percorridas, regiões do campo
em que atuaram e até os instantes em que permaneceram
parados.
A comparação
de dados de uma partida com os de outros jogos pode
revelar oscilações no desempenho de
um atleta e indicar a necessidade de aprimorar sua
condição física, ou mesmo alguma
deficiência de posicionamento a ser corrigida,
explica o professor Ricardo Anido, diretor do IC e
um dos coordenadores do SORTTS junto com os professores
Neucimar Leite (IC) e Ricardo Barros, do Laboratório
de Instrumentação para Biomecânica
da FEF. O trabalho conta ainda com a participação
do professor Sérgio Cunha, da Unesp-Rio Claro
e dos alunos Pascual Figueroa e Bruno Muller Jr.
Os técnicos,
contudo, também podem utilizar os dados disponíveis
para rever e organizar suas estratégias de
jogo, adianta Ricardo, a partir da clara visualização
do posicionamento de cada atleta de sua equipe e do
time adversário.
Histórico
A diferença entre o SORTTS e sistemas
convencionais de registro de imagens, como o videoteipe,
é sua capacidade de gerar um histórico
distinto e completo de cada jogador na partida.
No momento, o sistema consegue monitorar a trajetória
dos jogadores e mais o juiz em cerca de 90% do tempo
de duração do jogo. Só mesmo
o computador permite registrar e processar, com esse
percentual de precisão, o enorme número
de informações visuais geradas por esse
tipo de esporte, ressalta Ricardo. Mas ele observa:
há situações em que o monitoramento
totalmente automático não consegue bons
resultados; ainda é necessário muito
trabalho para aperfeiçoar o sistema.
As imagens em
campo são inicialmente captadas por seis câmeras
digitais de vídeo, posicionadas nos locais
mais altos do estádio. Posteriormente, são
processadas por um conjunto de 66 microcomputadores,
que operam simultaneamente e em altíssima velocidade.
Cada computador é previamente programado para
rastrear um único atleta, isolando-o no conjunto
de imagens que recebe das câmeras, a partir
de alguns parâmetros numéricos e de cores
atribuídos pelos programadores da Unicamp a
cada jogador.
Os computadores
que não acompanham nem jogadores nem juiz são
utilizados para fazer correções de falsas
detecções de imagens, como sombras ou
linhas demarcatórias do gramado, e evitar oclusões
que ocorrem em momentos de maior concentração
de atletas em uma única região do campo,
como nas cobranças de escanteio, ou quando
um jogador está sendo marcado por outro.
A movimentação de cada atleta aparece
finalmente no monitor de vídeo do computador
tal como sua imagem foi gravada ou na forma de representações
gráficas.
Marketing
O SORTTS já foi utilizado experimentalmente
em dois jogos disputados pelo Guarani, em seu estádio,
em Campinas, que dispõe de arquibancadas mais
altas e consideradas pelos pesquisadores mais adequadas
para a captação de imagens.
Por enquanto, por causa da complexidade da operação,
o processamento ocorre em imagens gravadas. Sua aplicação
em tempo real, ideal para poder disponibilizar as
informações logo após o término
das partidas, no próprio estádio, esbarra
em dificuldades técnicas para implantar o sistema
em um computador de menor porte.
Os inéditos recursos do sistema, entretanto,
já atraíram a atenção
de quem pensa em utilizá-los fora dos estádios,
informa Ricardo. Como resultado da apresentação
do sistema no workshop Unicamp/Itautec, recentemente
organizado pela Pró-Reitoria de Pesquisa, um
novo projeto, financiado pela empresa, está
sendo negociado, com o objetivo de adequar a tecnologia
desenvolvida para o seu emprego em ações
de marketing, como o mapeamento das trajetórias
de clientes em supermercados para identificar quais
são as gôndolas mais visitadas pelos
consumidores.