A tecnologia, resultado do trabalho da professora Maria Ângela Meireles, da doutoranda Patrícia Leal e do pesquisador Paulo de Tarso Vieira Rosa, respectivamente bolsistas da Fapesp e da Capes, corresponde a um processo de extração supercrítico que obtém uma fração purificada da bixina. A novidade, segundo Maria Ângela, é o emprego de um gás pressurizado como solvente de extração, no caso, o dióxido de carbono.
Maria Ângela explica que convencionalmente usa-se o etanol para obtenção do corante, mas que é necessário eliminar seu resíduo depois que a bixina é extraída da semente. “Na etapa de eliminação do etanol é usado calor e isso pode imprimir algum tipo de degradação na substância, além do maior gasto de energia”, afirma a pesquisadora.
Pelo novo processo desenvolvido na FEA, a fração da bixina obtida é mais pura e não há a necessidade de um processo adicional de eliminação de resíduos, já que o solvente usado é um gás. Segundo Maria Ângela, a partir de uma determinada temperatura o dióxido de carbono começa a adquirir as propriedades de fluído supercrítico. Nessas condições de temperatura e pressão, ele tem capacidade de solvatação, ou seja, de solubilizar o princípio ativo. “Para separar o corante do solvente, reduz-se a pressão e o dióxido de carbono volta a ter propriedades de gás”, explica.
A professora destaca que mesmo com o uso do dióxido de carbono, o processo é limpo, pois não há produção do gás. “O dióxido de carbono utilizado é reciclado. Foi produzido em outras indústrias e captado para a reutilização”, afirma.
A nova tecnologia pode ampliar o escopo de aplicação da bixina, cujo uso industrial é focado principalmente na obtenção de tons entre o amarelo e o vermelho púrpura. Na indústria alimentícia, o pigmento é muito usado na fabricação do coloral, produto consumido por mais de 140 milhões de brasileiros. No Nordeste, o consumo do produto supera 500 gramas per capita ao ano. A bixina também é aplicada em alimentos condimentados cuja coloração natural foi perdida durante o processo de industrialização.
Segundo Patrícia Leal, embora o consumo do pigmento extraído pelas técnicas convencionais não seja prejudicial à saúde, seu uso ainda apresentava restrições devido à presença de resíduos do solvente no produto.
Patrícia observa que a indústria de cosméticos usa o pigmento para obter a coloração de vários produtos, entre os quais esmaltes, maquiagem e cremes de bronzeamento, mas algumas pessoas podem ter reações alérgicas provocadas pelos resíduos do solvente presentes no pigmento. Com a nova tecnologia, diz a pesquisadora, a ausência de resíduos abre portas para novas aplicações. “Sabemos que entre as propriedades da bixina está a atividade antioxidante, que pode ser aplicada no desenvolvimento de cremes para o retardamento do envelhecimento”, prevê a doutoranda. O grupo acredita que a tecnologia pode ser aplicada em outros produtos que contêm bixina, entre os quais alguns tipos de medicação para doenças estomacais.
Menos nocivos Maria Ângela Meireles afirma que o grupo considerou a importância e o potencial dos corantes naturais em substituição aos corantes sintéticos enquanto desenvolveu a nova tecnologia. Segundo a docente, os pigmentos naturais são considerados menos perigosos para a saúde, seja ela humana ou animal. “O que provém de uma fonte natural está mais de acordo com a natureza que um produto sintético”, diz a especialista. A professora explica que uma série de reações químicas é utilizada na síntese de corantes, e que por isso existe a possibilidade de se poluir o meio ambiente de uma maneira mais nociva do que quando se faz a extração do corante natural.
Ademais, o mercado para corantes naturais está cada vez maior, pois seu consumo está sendo incentivado pela tendência de substituição de produtos sintéticos. “Há hoje uma preocupação crescente com a saúde do meio ambiente. Isso implica se selecionar técnicas extrativas e não técnicas de síntese”, observa a pesquisadora.
Por outro lado, a cientista alerta que é preciso haver o manejo sustentável do ambiente para que a extração seja feita de maneira correta. “Não é só usar o pigmento natural. Ele precisa ser proveniente de uma fonte certificada de uma agricultura responsável. Todo o elo deve ser contemplado quando se pensa em usar tecnologias limpas”, completa.
A tecnologia está pronta para a transferência para o mercado. Segundo Vera Crósta, da Agência de Inovação Inova Unicamp, a Agência está à procura de empresas parceiras para efetivar o licenciamento da tecnologia. Vera afirma que esta patente é mais uma oportunidade de se firmar uma parceria entre a Unicamp e o setor produtivo, viabilizando a transferência de um produto do laboratório para o mercado. “Acreditamos que, além do potencial econômico, esta tecnologia pode ser mais uma colaboração da Universidade para o uso de técnicas industriais mais limpas”, observa Vera.