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IB desenvolve vacina para
combater infecções em aves
Pesquisadores usam bactéria Escherichia
coli para o desenvolvimento de linhagens
Pesquisadores
do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp estão desenvolvendo
uma vacina a partir da bactéria Escherichia coli (E. coli),
responsável por diferentes tipos de infecção em aves na granja
– como celulite, septicemia, onfalite e síndrome da cabeça
inchada – com o propósito de evitar que tais infecções ponham
em risco todo plantel aviário do país, o que traria perdas
econômicas inestimáveis. A pesquisa de doutorado que gerou
essa iniciativa é de autoria da aluna Fernanda de Pace, sob
orientação de Wanderley Dias da Silveira, docente do Instituto.
A estimativa do professor é de que a vacina poderá estar em
uso num prazo de dois a três anos. “Estudaremos agora os mecanismos
de patogenicidade para desenvolver linhagens vacinais que
possam ser usadas contra os diferentes processos infecciosos
que ocorrem nos plantéis aviários das granjas”, acentua Wanderley.
Segundo
o professor, é sabido que a E. coli pertence a grupos gênicos
diferentes e, por conta disso, o intuito daqui em diante será
deletar genes específicos de cada um deles a fim de verificar
se tal bactéria perde a sua capacidade de provocar doenças,
para daí então poder ser usada como vacina. Um dos próximos
passos consistirá em testá-la em modelos animais. “Até o momento,
conseguimos demonstrar que uma linhagem patogênica, causadora
de septicemia em frangos de corte, é produtora do sistema
de secreção tipo 6 e que, nesta bactéria, está relacionado
à patogenicidade em aves”, revela o orientador do trabalho,
que foi desenvolvido em cooperação com a professora Vanessa
Sperandio, do Departamento de Microbiologia da Universidade
do Texas, ex-aluna de mestrado e doutorado do professor Wanderley
na Unicamp.
Ele conta
que esta é a primeira pesquisa no mundo a demonstrar a possível
relação entre este sistema de secreção e a patogenicidade
em linhagens bacterianas de E. coli que provoca doenças em
aves. Também pretende demonstrar que esta iniciativa abre
grandes perspectivas porque, através da obtenção de mutantes
nos genes responsáveis por este sistema de secreção, será
possível criar linhagens vacinais atenuadas com o objetivo
de diminuir a incidência de infecções nas granjas por essa
bactéria, já que o setor aviário é extremamente importante
para a economia do país. “A finalidade é conseguir metodologias,
métodos ou linhagens que levem a uma diminuição desse tipo
de infecção”.
Por que
a obtenção de linhagens vacinais é tão relevante? Wanderley
esclarece que exatamente porque na alimentação das aves às
vezes são introduzidos antibióticos para combater as infecções
ocasionadas por esta e outras bactérias. Em geral, são empregados
e vão integrar, ainda que em concentrações pequenas, a carcaça
do animal a ser consumido. Essas subdoses de antibióticos,
uma vez ingeridas por seres humanos, levarão à criação ou
ao aparecimento de linhagens bacterianas infecciosas também
resistentes. “Se obtivermos linhagens vacinais sem adição
de antibióticos nas rações, o Brasil certamente terá muito
a ganhar.”
As linhagens
vacinais da E. coli são inoculadas no animal, que cria anticorpos
contra elas. Em possíveis infecções, com outras linhagens
totalmente patogênicas, o sistema imunológico reconhece aquele
patógeno, não permitindo que a infecção progrida. Na ausência
de infecção, o animal chega a um maior ganho de peso, a uma
possibilidade de abate em idade mais precoce, com consequente
diminuição de custos para o granjeiro e a indústria produtora
do alimento, seja para exportação ou para o mercado interno.
Dentre as técnicas disponíveis para estimular respostas imunes
eficientes, o uso de bactérias como carreadoras de antígenos
vacinais pode constituir uma das estratégias de maior êxito.
Wanderley
avisa que uma deliberação dos países importadores-consumidores
assinala que, em alguns anos, as carnes com resquícios de
antibiótico – substâncias que têm a capacidade de interagir
com micro-organismos e de provocar o aparecimento de linhagens
patogênicas resistentes em humanos – não poderão ser mais
compradas. “O nosso objetivo é chegar a linhagens vacinais
que levem à total erradicação do uso de antibióticos em ração
para aves.”
Importância
O desenvolvimento de linhagens vacinais para combater infecções
causadas por E. coli em aves comerciais está inserido num
problema econômico maior que é o fato de o Brasil ser o maior
exportador mundial deste tipo de carne, exportando para cerca
de 180 países, com um valor aproximado anual de US$ 5 bilhões.
Trata-se de um aporte de valores em moeda forte que fica somente
atrás, em termos de exportação de produtos primários, do minério
de ferro, soja e carne bovina. “É um valor inclusive superior
à exportação de suco de laranja, algo em torno de US$ 1,7
bilhão anual”, especula o docente.
Além
da verba advinda das exportações, a produção de carne de frango
gera milhares de empregos no mercado interno brasileiro e
produz alimento de alto valor nutritivo. Hoje em dia esse
alimento apresenta um custo relativamente baixo, comparado
à carne bovina. “Em termos de qualidade e valores nutricionais,
a meu ver, é melhor do que a carne bovina. Assim, o setor
de produção de frangos, aves poedeiras e ovos no Brasil é
extremamente ‘valioso’”, aponta o professor.
Ele contemporiza que o setor,
por motivos óbvios, não é perfeito e sofre alguns problemas
que podem levar, por exemplo, a uma diminuição na produção
da carne de frango. O primeiro problema deles relaciona-se
às infecções causadas por micro-organismos patogênicos. Entre
estes micro-organismos existem fungos, outras bactérias e
vírus. Dentre as bactérias que causam infecções em aves de
corte, ou poedeiras, a bactéria Escherichia coli pode ser
uma das principais. Todas levam à diminuição na produção de
carne e ovos e descarte deste material que, teoricamente,
poderia ser amplamente reaproveitado.
Sobre os cuidados que se deve
ter com as aves brasileiras, Wanderley comenta que não se
deve ignorar o fato de que esses animais são criados em cativeiro.
Cada granja tem seus galpões aonde eles são criados numa alta
densidade “populacional”. É um local que, por mais que reúnam
condições adequadas de sanitização e controle ambiental, toda
e qualquer infecção poderá originar um surto, levando à morte
das aves ou a efeitos no seu crescimento e aproveitamento,
com grandes prejuízos.
Um outro ponto importante,
salienta o professor, é o fato de a E. coli ser considerada
um risco zoonótico para seres humanos. Alguns trabalhos indicam
que essa bactéria patogênica para aves tem semelhança genética
com linhagens de Escherichia coli, que causam infecções do
trato urinário em humanos e meningite em recém-nascidos. Para
diminuir a sua incidência, neste caso, é recomendável que
se evite que tais bactérias cresçam nas aves. Ao impedir este
crescimento, minimizam-se os riscos de transferência deste
micro-organismo para o ambiente. “Reduzir processos infecciosos
em aves, em cadeia, leva à diminuição de todos os processos
secundários”, expõe Wanderley.
Os frangos exportados, descreve
ele, têm como características alta produtividade em peso e
crescimento rápido, sendo abatidos com aproximadamente 40
dias de idade. Contudo, em razão da superpopulação existente
nessas granjas, toda e qualquer situação de estresse é capaz
de levar riscos ao animal, diminuindo o seu sistema imunológico,
com maior probabilidade de aquisição de infecções.
A Escherichia coli causadora
de patogenicidade em aves é estudada há pelo menos 17 anos
na linha de pesquisa “Mecanismos de patogenicidade e virulência
de bactérias patogênicas”, coordenada por Wanderley. Diversos
trabalhos do grupo comprovaram que essas linhagens têm algumas
características específicas diferentes de outras linhagens
descritas nos EUA, no Canadá e em outros países desenvolvidos,
tornando os trabalhos originais e relevantes.
No Laboratório de Biologia
Molecular Bacteriana, atua uma equipe multidisciplinar, ligada
ao Departamento de Genética, Evolução e Bioagentes do IB,
formada por uma biomédica e um agrônomo (funcionários da Unicamp),
um veterinário (aluno de mestrado), duas biólogas (alunas
de doutorado) e duas professoras pesquisadoras colaboradoras
(pós-doutorandas).
“Estamos estruturando o nosso
Laboratório e incentivando novos alunos para formação de pesquisadores
especialistas na área de estudo destas bactérias tão significativas,
inclusive estabelecendo parcerias de pesquisa com universidades
brasileiras (Universidade Estadual de Londrina, Universidade
Federal de Pernambuco, Universidade Federal do Rio Grande
do Sul) e com o Instituto Biológico/SP-Unidade Bastos, além
de Universidades estrangeiras como a University of Texas Southwestern
Medical Center-USA, a Iowa State University-USA, o INRS-Institut
Armand Frappier, Québec, Canadá”, elenca o docente.
Cada membro da equipe procura
estudar e conhecer diferentes mecanismos de patogenicidade
presentes nestas linhagens bacterianas. Janaína Garbim (PD)
e Flávio Silveira trabalham na área de proteômica, verificando
proteínas importantes para o processo de patogênese. Monique
Ribeiro realiza a caracterização molecular dos genes de patogenicidade
presentes nas diferentes amostras. Jacqueline Boldrini realiza
mutações em prováveis genes de patogenicidade para obtenção
de linhagens atenuadas, enquanto Thaís Rojas – com suporte
do Laboratório de Genômica do IB da Unicamp (professor Gonçalo
Pereira e colaboradores Lucas Parizzi e Marcelo Carazzolle)
– analisa o genoma de linhagens (04) que já tiveram seu DNA
sequenciado.
O objetivo do sequenciamento
completo do DNA destas linhagens, além da comparação com linhagens
de origem aviária e humanas, é a determinação da presença
de genes específicos relacionados à patogenicidade, que possam
ajudar a entender os mecanismos causadores dos diferentes
tipos de infecção. O conhecimento da presença de genes específicos
e da sequência de DNA conhecida dos mesmos pode facilitar
e agilizar a produção de mutações sítio-dirigidas para a produção
de linhagens vacinais atenuadas, explica Wanderley.
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Publicações
- Pace, F.; Nakazato, G.; Pacheco, A.; Paiva, J.B., Sperandio,
V.; Silveira, W.D. The type VI secretion system plays a role
in type 1 fimbria expression and pathogenesis of an avian
pathogenic Escherichia coli strain. Infection and Immunity,
78:4990-8, 2010.
Tese de doutorado: “Estudo de genes do sistema
de secreção tipo VI em uma linhagem de Escherichia coli patogênica
para aves (APEC)”
Autora: Fernanda de Pace
Orientador: Wanderley Dias da Silveira
Unidade: Instituto de Biologia (IB)
Financiamento: Fapesp e Capes/PNPD
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