EDIMILSON
MONTALTI
Pesquisadores
do Grupo de Urologia Oncológica do Departamento de
Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM)
da Unicamp apresentaram no mês de abril, no Congresso
Americano de Urologia, em Chicago, nos Estados Unidos, os
resultados de um estudo realizado em 200 pacientes atendidos
no ambulatório de urologia do Hospital de Clínicas
(HC) da Unicamp e no Hospital Estadual de Sumaré
(HES). A pesquisa é resultado da dissertação
de mestrado "Correlação entre prostatite
tipo IV (NIH), PSA elevado e câncer de próstata",
do médico-assistente Rafael Mamprim Stopiglia.
O trabalho foi escolhido como o melhor da sessão
"Câncer de próstata: detecção
e mapeamento". A apresentação foi feita
pelo médico-assistente Leonardo Oliveira Reis, coautor
da pesquisa. A orientação da pesquisa é
do médico urologista Ubirajara Ferreira, coordenador
do Grupo de Urologia Oncológica. De acordo com os
pesquisadores, o estudo refuta uma prática adotada
há anos no diagnóstico do câncer de
próstata e impacta, diretamente, o trabalho de urologista
e o tratamento de pacientes.
De acordo com a Associação Americana de Urologia,
um em cada seis homens na faixa etária entre 45 e
75 anos tem câncer de próstata. De maneira
geral, a doença acomete cerca de 10% dos homens após
os 50 anos. À medida que a idade avança, as
chances crescem, chegando a atingir cerca de 50% dos homens
aos 75 anos. Pesquisas apontam que fatores genéticos,
alimentação e estilo de vida podem estar relacionados
com o câncer de próstata. "O que é
determinante nós não sabemos. Tem muita especulação,
mas não se chegou a uma resposta", disse o médico
urologista Ubirajara Ferreira.
É recomendado aos homens o exame de próstata
a partir dos 45 anos. O diagnóstico pode ser feito
pelo exame de toque retal, medida do PSA [sigla em inglês
para dosagem do antígeno prostático específico]
ou biópsia, dependendo do caso. A medida do PSA é
o exame mais usado pelos urologistas. O PSA é uma
substância produzida pela próstata que serve
como marcador para a detecção precoce do câncer
de próstata a partir do exame de sangue. Não
existe um valor considerado normal de PSA pela comunidade
médica urológica internacional e brasileira,
porém, valores acima de 2,5 merecem uma maior atenção.
A idade do paciente e o tamanho da próstata podem
alterar o índice do PSA. Atividades físicas
intensas num curto período de tempo também
podem causar alterações. Um paciente jovem
de 48 anos com PSA 9 é algo incompatível.
Mas para um paciente de 75 anos, esse índice pode
ser perfeitamente normal.
De acordo com Ubirajara Ferreira, quando existe alguma alteração
do PSA o médico fica, normalmente, em dúvida:
será que esse aumento é por causa de uma inflamação
na próstata (prostatite) ou por algum outro motivo,
como a presença de um tumor? O primeiro procedimento
adotado pelo urologista ao constatar um PSA elevado é
dar antibiótico ao paciente. Se o índice cair,
é sinal de apenas um processo inflamatório
na próstata; caso contrário, é pedida
a biópsia. "Dar antibiótico para todos
os pacientes que têm alteração do PSA
é uma ideia muito arraigada entre os urologistas.
Porém, a pesquisa mostrou que o nível de PSA
não é confiável, pela própria
dinâmica e função da próstata",
comentou o orientador do trabalho.
O estudo
Para a pesquisa foram recrutados 200 pacientes na faixa
etária de 50 a 75 anos, atendidos entre 2006 e 2008
nos ambulatórios de urologia do HC e do HES. Desse
total, foram selecionados 98 pacientes que tinham alteração
no sêmen, inflamação prostática
assintomática e elevação do PSA. Esses
pacientes foram divididos em dois grupos. Um grupo tomou,
durante um mês, antibiótico para prostatite.
O outro grupo tomou, pelo mesmo período, um medicamento
com princípio inativo, chamado placebo. Após
essa fase, todos os pacientes foram biopsiados: os que tiveram
aumento do PSA, os que não aumentaram, e os que diminuíram
o PSA.
Os pesquisadores constaram que 50% dos pacientes que tomaram
e não tomaram antibióticos tiveram o PSA diminuído,
mas que, para 30% desses pacientes, os sintomas evoluíram
para câncer de próstata. A conclusão
a que os pesquisadores chegaram foi de que o aumento do
nível de PSA pode ou não ser indício
de câncer. "Esta informação orienta
a prática diária do urologista que, em tempos
remotos, chegou a considerar, de forma empírica e
intuitiva, a diminuição do PSA como um indicativo
de ausência de câncer, o que o estudo mostrou
não ser verdade. A utilização de antibióticos
não traz benefícios ao paciente e não
autoriza o urologista em postergar a biópsia prostática
para confirmação do diagnóstico",
explicou Leonardo Oliveira Reis.
Entretanto, não havendo uma suspeita tão forte
de câncer, ao invés do médico biopsiar
de imediato o paciente, ele pode pedir o exame de PSA em
intervalos de três a seis meses. Se o PSA subir acima
0,5 ou 0,6 por ano, ele pode ter câncer, dependendo
da idade. "Assim, você pode biopsiar com mais
certeza. Mas a prática corriqueira de se dar antibiótico
para diminuir o PSA deve ser abolida. Isso só acarreta
custo e prejuízos aos pacientes", explicou Ubirajara.
Para os pesquisadores, o que garante a segurança
no resultado do trabalho é a metodologia empregada
e o seu grau de evidência científica. Numa
escala de 1 a 5, a pesquisa foi considerada de grau 2 pelos
avaliadores norte-americanos, a maior recomendação
existente para trabalhos prospectivos. A pesquisa da Unicamp
concorreu com trabalhos de ponta, de grupos da Europa e
dos Estados Unidos, que usaram até biologia celular
e outras tecnologias em suas pesquisas.
"Houve outro trabalho norte-americano semelhante ao
nosso, mas eles não biopsiaram todos os pacientes.
Eles partiram do pressuposto de que os pacientes que tiveram
diminuição do PSA com o uso de antibióticos
não necessitariam de biópsia. E nós
provamos o contrário. Num trabalho mais simples,
usando PSA e biópsia, coisa que a gente faz no dia-a-dia
e que tem aplicabilidade médica, conseguimos provar
que mesmo baixando o PSA, 30% dos pacientes têm chance
de ter câncer de próstata", disse Leonardo.
Os médicos urologistas do HC da Unicamp já
tinham como prática clínica ver o que acontecia
aos pacientes que eram dados antibióticos. Num primeiro
momento, o PSA diminuía, o paciente sumia e quando
voltava tinha câncer. "É a mesma coisa
que dar antitérmico para febre alta: você até
pode, mas precisa descobrir a causa. E o que descobrimos
foi que o uso de antibióticos só mascara e
posterga o diagnóstico do câncer de próstata.
Este subterfúgio é inadequado", concluiu
Ubirajara.
O trabalho resumo do trabalho está publicado na página
753, no volume 181, da edição número
4, de abril de 2009 do Journal of Urology (http://www.jurology.com)
Prevenção e campanha
Alguns
estudos apontam o uso do licopeno, presente no tomate, melancia,
pimentão e mamão e a redução
do consumo de carne vermelha e gordurosa como formas de
prevenção do câncer de próstata.
Mesmo assim, segundo Ubirajara, o licopeno ainda é
motivo de controvérsia. A melhor forma de prevenção,
segundo o urologista, é a detecção
precoce.
Ubirajara recomenda que os homens fiquem atentos a alguns
sintomas que podem indicar alterações no funcionamento
da próstata. Acordar várias vezes à
noite com dificuldade e dor para urinar, jato fino, gotejamento
e mudança na cor da urina são alguns sintomas
que sinalizam o aumento da glândula prostática.
"Não espere os sintomas. Por isso é que
recomendamos, depois de uma certa idade, a visita ao urologista
uma vez ao ano", recomendou o especialista da Unicamp.
Entretanto, salienta o médico, não existe
no país nenhuma política direcionada a incentivar
o homem a procurar um urologista. Pesquisa realizada com
330 homens atendidos no ambulatório do Hospital de
Clínicas demonstrou que menos de 2% vieram por causa
de propagandas veiculadas no rádio, jornal, televisão
e internet. "Se eu perguntar, por exemplo, para uma
senhora onde ela viu que precisa fazer exame periódico
de câncer de mama, provavelmente, ela vai dizer que
foi numa propaganda em alguma revista".
De qualquer forma, segundo Ubirajara, há problemas
que precisam ser resolvidos. Primeiro, o paciente não
se interessa em perguntar sobre câncer de próstata;
ademais, o médico fala pouco sobre o tema e, por
fim, a mídia não tem interesse no assunto.
"Os cânceres de mama e de próstata têm
acometimento, origem e história semelhantes. Se você
olhar as políticas públicas no Brasil para
a prevenção do câncer de mama, temos,
pelo menos, um mês de campanha. No caso do câncer
de próstata, isso se resume há apenas um dia.
Isso não é uma crítica, é uma
constatação", argumentou Ubirajara.
A glândula e suas funções
A
próstata é uma glândula exclusiva do
sexo masculino e que se localiza logo abaixo da bexiga,
envolvendo a uretra. Ela pesa entre 25 e 30 gramas e tem
formato de uma castanha. Sua consistência torna-se
endurecida quando apresenta câncer. A próstata
produz cerca de 70% do líquido seminal, substância
fundamental na vitalidade e no transporte dos espermatozóides.
As doenças que podem acometer a próstata são
basicamente de três tipos: doenças inflamatórias
(prostatite), infecciosas e tumorais (câncer). A prostatite
aguda pode ocasionar febre alta, ardor e dificuldade para
urinar, incômodo no reto, além de sensação
de mal-estar. O tratamento é feito com antibióticos
e anti-inflamatório. A prostatite crônica é
uma condição que leva a um quadro de desconforto
à micção e à evacuação.
O tratamento pode ser a base de anti-inflamatório.
Um homem que tenha um parente de primeiro grau com câncer
de próstata tem cerca de duas vezes mais chances
de ter a doença. Com dois parentes relacionados,
o risco de desenvolver este câncer sobe para quase
nove vezes.
O exame de próstata deve ser feito a partir dos 45
anos. Ele é feito por meio do toque retal. O toque
retal dura, em média, 10 segundos. É aconselhável
a sua realização anual. Caso haja algum caso
de câncer de próstata num parente relacionado,
aconselha-se o seu início aos 40 anos. O câncer
da próstata pode se apresentar como uma área
endurecida na sua porção periférica,
região esta facilmente acessível ao toque
retal. Outro exame de rotina é o PSA, mas não
é 100% seguro, o que não exclui o toque retal.
Fonte: Ferreira, U. Câncer de Próstata - Tire
suas dúvidas - 99 respostas e um alerta. Âmbito
Editores. 2006.