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Teste detecta parasitos com mais precisão

Primeira aplicação epidemiológica da técnica foi feita em escola de Pedreira

O pesquisador Jancarlo Ferreira Gomes, à  esquerda, e o professor Alexandre Xavier Falcão: obtenção de lâminas mais limpas (Foto: Antoninho Perri) Em 1918, Monteiro Lobato já mostrava a realidade das parasitoses intestinais ao descrever o homem do campo na imagem do Jeca Tatu, personagem que ficou conhecido também em livros didáticos de literatura e ciências do ensino fundamental e também em filme estrelado por Amácio Mazzaropi e dirigido por Milton Amaral. No enredo, Jeca Tatu representava mais um cidadão brasileiro com parasitismo crônico. Ele protagonizava uma ficção baseada em fatos reais que já mataram muitos cidadãos por falta de diagnóstico e tratamento adequados. A história do Jeca foi relembrada pelo pesquisador Jancarlo Ferreira Gomes, dos Institutos de Biologia (IB) e de Computação (IC) da Unicamp, na introdução do Programa de Controle das Parasitoses Intestinais da Cidade de Pedreira, em São Paulo, por meio do qual ele constatou que 342 entre 737 estudantes de uma Escola Municipal Prof. José Jurandyr Piva da cidade encontram-se infectados por enteroparasitoses. Entre os quais, 194 apresentam parasitismo simples e 148, poliparasitismo. Dos 395 escolares com diagnóstico negativo, 149 apresentaram sintomatologias, talvez em razão da intermitência da passagem do parasito no hospedeiro, ou pela ação de outro agente etiológico, como vírus e bactéria.

Desenhos de Jeca Tatu, personagem de Monteiro Lobato citada na tese: parasitismo é problema secularO levantamento, realizado em parceria com a Secretaria de Saúde de Pedreira, foi a primeira aplicação epidemiológica da Técnica Coproparasitológica de TF-Test (Three Fecal Test). Esta técnica, desenvolvida em 2004 por Sumie Hoshino Shimizu, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP, Luiz Cândido de Souza Dias, da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, e Jancarlo Ferreira Gomes, do Instituto de Biologia da Unicamp, permite atingir um nível de sensibilidade diagnóstica de até 97,8%, enquanto as convencionais podem oscilar de 40% a 70%. O programa epidemiológico contou com a participação da empresa Immunoassay, atual detentora do kit TF-test.

De acordo com o professor do Departamento de Sistemas da Informação do Instituto de Computação Alexandre Xavier Falcão, responsável pela técnica na Unicamp, durante projeto pós-doutorado de Gomes no IB e no IC em 2009, os pesquisadores desenvolveram um processamento laboratorial com obtenção de lâminas mais limpas e com maior concentração parasitária que as convencionais, denominado de TF-Test Modified. Este novo processamento permitiu aos pesquisadores garantir imagens de maior qualidade para detecção dos parasitos. Falcão pontua que a técnica de TF-Test, financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp/Pipe), foi desenvolvida visando à automatização do diagnóstico das enteroparasitoses, a fim de garantir diagnósticos de alta eficácia, e com baixo percentual de erro. O desenvolvimento do projeto de automatização, aprovado pela Fapesp, já está em atividade desde 2009 e recebe apoio da Unicamp.

Com alta sensibilidade para helmitos e protozoários do trato intestinal, a técnica de TF-Test é capaz de executar um enriquecimento parasitário diferenciado, preconizado com a tríplice coleta de material fecal, em dias alternados, e processado de uma só vez no laboratório. Segundo Falcão, o novo desdobramento (TF-Test Modified) da tecnologia, com patente já depositada pela Unicamp no Inpi, permitirá uma visualização exata das estruturas de parasitos como giárdia, difícil de ser diagnosticada em exames convencionais, em razão do seu complexo ciclo vital.

Gomes explica que muitas das técnicas coproparasitológicas convencionais empregadas para os exames de fezes, utilizando ou não os kits comerciais, apesar de demonstrarem baixos custos, apresentam baixas e moderadas sensibilidades diagnósticas e permitem revelar somente a metade das espécies parasitárias presentes na amostra fecal analisada. No caso de Pedreira, a aproximação de informações precisas surpreendeu o coordenador da área de Saúde da Família da Secretaria de Saúde de Pedreira e doutorando do Departamento de Saúde Coletiva da Unicamp, Adriano Peres Lora. Para ele, o número de crianças infectadas que o programa conseguiu identificar mostra a eficiência da tecnologia desenvolvida pelos pesquisadores em relação aos exames convencionais. Ele enfatiza que a metodologia desenvolvida pelos pesquisadores conseguiu chegar a um diagnóstico mais apurado de parasitoses nas crianças.

Além do levantamento dos casos, os exames feitos com a técnica de TF-Test permitiram a diferenciação das 11 espécies detectadas. As crianças estavam infectadas por seis protozoários, entre eles 238 casos de blastocistose sintomática, e cinco helmitos, que aparecem em número menor, devido, talvez, ao novo perfil epidemiológico de característica urbana, segundo Gomes. Entre os protozoários apareceram também Entamoeba coli, Giardia duodenalis, Endolimax nana, Entamoeba histolytica /E. díspar e Iodamoeba bütschlii.

O contato com animais de estimação também podem estar entre as causas de alta taxa de infecção apresentada especialmente por protozoários intestinais, segundo o parasitologista. Entre os estudantes infectados, 232 (67,84%) convivem com animal de estimação. Considerando informações de relatos científicos, no mundo, os cães representam cerca de 65% de animais de estimação, de acordo com Gomes.

Os testes realizados em Pedreira levantaram também informações reveladoras à literatura sobre o parasito Blastocystis hominis. De acordo com Gomes, a patogenicidade deste protozoário até hoje é objeto de discussão, pois os estudos existentes são controversos com relação a sua capacidade patogênica. No programa, porém, 44 escolares infectados somente por B. hominis apresentaram sintomatologias como dor abdominal e diarreia.

Qualidade sanitária

Se no início do trabalho Gomes falava de um Jeca Tatu doente por causa da desatenção ao homem do campo, ao final do trabalho ele se surpreende com a informação de que 310 das 342 crianças investigadas moram em residências com saneamento básico satisfatório. Apenas 32 não têm saneamento satisfatório. Estes dados podem estar relacionados às variações diversas de adaptação dos parasitos com o meio ambiente.

O pesquisador acrescenta que as técnicas convencionais foram desenvolvidas em épocas remotas, quando a população endêmica apresentava altos níveis de intensidade de infecção por enteroparasitose, sobretudo por tratar-se de endemias rurais. “Nestas condições, essas técnicas mostravam um bom desempenho de diagnóstico, fornecendo resultados sensíveis, mas com o passar dos anos houve a adaptação do parasitismo, principalmente após o processo de industrialização, com a migração de grande parte da população aos centros urbanos, aliada a algumas melhorias de condições de saúde e de vida da população, como alimentação, uso de medicamentos antiparasitários, serviços sanitários e higiene”.

Novas lâminas

O cuidado com as lâminas, ou a falta dele, também oferece risco de falseamento no resultado de exames. Uma falha do profissional técnico de laboratório pode fazer com que o equipamento fique inadequada para o diagnóstico. A nova versão, TF-Test Modified, oferece uma lâmina ainda mais apropiada que a utilizada no programa realizado em Pedreira. A vantagem da nova técnica, segundo Falcão, está em permitir a preparação de lâmina de microscopia com alta concentração de estruturas parasitárias e baixa quantidade de impurezas fecais.

 

Para além de Pedreira

A escola de Pedreira foi só uma demonstração de que as pesquisas em busca de avanço tecnológico para a área de diagnóstico de parasitos devem ser intensificadas, na opinião de Gomes. As parasitoses intestinais são altamente prevalentes na população mundial, sobretudo nos trópicos, onde o Brasil está localizado. Mas as novas adaptações dos parasitos levam países da Europa a buscarem informações sobre diagnóstico e tratamento para algumas doenças, segundo o parasitologista. Em algumas literaturas da área médica, essas doenças já são consideradas entre as principais do planeta.

Segundo Gomes, dados divulgados recentemente pela Organização Mundial da Saúde (OMS) mostram que 3,5 bilhões de pessoas no mundo encontram-se infectadas por parasitos intestinais. Destas, cerca de 450 milhões, na maioria crianças, estão doentes e vivem em áreas tropicais e países em desenvolvimento, incluindo o Brasil. “No mundo, acredita-se que as enteroparasitoses sejam responsáveis pela maioria dos óbitos ocasionados entre crianças com idade entre 1 e 9 anos, pelo sistema imunológico imaturo, por falta de higiene e, em muitas vezes, por deficiência nutricional”, acrescenta.

Ter proporcionado a oportunidade de ter um diagnóstico eficiente para a cidade de Pedreira é motivo de orgulho para os pesquisadores, pois, uma vez tratadas, as crianças deixam de fazer parte do quadro de quase 450 milhões e pessoas que podem estar convivendo com déficit orgânico, de origem física ou mental, provocado por alguma espécie de enteroparasito. “Este déficit, no caso das crianças, pode impedir o amplo desenvolvimento da criança, inclusive o educacional. E agora podemos garantir a permanência dessas crianças em sala de aula”, explica Gomes.

Com apoio da Secretaria de Saúde de Pedreira, o programa já está na fase de tratamento dos escolares, segundo Lora. Desde a entrega dos resultados, 70% dos escolares já receberam tratamento. Os 30% restantes já estão sendo convocados por intermédio dos pais para se tratarem. As 117 crianças com sintomatologia (diarreia, dor abdominal, cansaço, dores no corpo, falta de fome, emagrecimento) também serão acompanhadas. Lora informa que, a partir de agora, pretende fazer a avaliação periódica dos escolares. De acordo com Gomes, é recomendada a realização de novos exames a cada seis meses, a fim de levantar o impacto da terapêutica, medir as taxas de reinfecções e novos casos de infecções.

Apesar de as crianças estarem sendo acompanhadas pela Secretaria de Saúde, o programa não se encerra nos resultados para os pesquisadores da Unicamp. Numa próxima etapa, o grupo fará visita às escolas para levantar o desempenho educacional dos escolares e obter informações sobre o tratamento de escolares parasitados.

O médico Lora enfatiza a importância do Programa de Controle das Parasitoses Intestinais da Cidade de Pedreira para a área de saúde pública. “A cidade de Pedreira é parceira de longa data da Universidade em várias áreas. Nós estamos dando continuidade às etapas do programa, entre elas a de controle e prevenção”, afirma.

 

Publicação: Análise Automatizada de Enteroparasitos para Finalidade Diagnóstica (pós-doutorado)

Autor: Jancarlo Ferreira Gomes

Unidades: Instituto de Biologia (IB) e Instituto de Computação (IC)

Financiamento: Fapesp

 

 
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