Opinião
Consulta à comunidade: balanço,
reflexões e sugestões
Nos
dias 12 e 13 de março últimos a Unicamp realizou
o processo de consulta à sua comunidade interna para
sucessão do reitor que irá dirigir a universidade
no quadriênio 2009/2013.
Na qualidade de presidente
da Comissão Organizadora da Consulta (COC), constituída
pelo Conselho Universitário, apresento a seguir um
breve balanço do processo e de seus resultados, comparando-o
com a consulta ocorrida há quatro anos e fazendo
algumas considerações e sugestões para
o futuro.
A consulta à comunidade
é o primeiro, e fundamental, estágio do processo
democrático que a Unicamp utiliza para escolher seus
dirigentes. De acordo com a legislação vigente,
os reitores das universidades públicas paulistas
são escolhidos pelo governador do Estado, com base
em uma lista composta por três nomes.
No caso da Unicamp, essa
lista é elaborada pelo Conselho Universitário,
com base no resultado da consulta à comunidade. Nesta,
é considerado o voto ponderado do corpo docente,
do corpo discente e do corpo de servidores técnicos
e administrativos, utilizando como fator de ponderação
o peso de 3/5 para a categoria docente, e de 1/5 para cada
um das duas outras categorias, nos termos da legislação
vigente e dos Estatutos da Unicamp.
Embora possua essas características
que a diferenciam de uma eleição, a consulta
é um processo legítimo de escolha de dirigentes,
alicerçada no respeito à democracia interna,
na transparência do processo e no respeito à
vontade da comunidade. A Unicamp adotou esse processo com
êxito há quase três décadas e
seus resultados vêm se mostrando de importância
fundamental para o histórico de sucesso da Universidade.
O processo de consulta à
comunidade para escolha do Reitor é composto por
um conjunto de ações coordenadas pela COC,
com o objetivo de organizar e supervisionar a realização
do processo, e também de divulgar as candidaturas
e suas propostas, além de estimular a participação
de toda a comunidade.
Como parte do processo de
consulta, a COC promoveu a realização de debates
entre os candidatos, com o objetivo de divulgar para a comunidade
as suas propostas, projetos e visões para a Unicamp.
Esses eventos foram realizados no campus de Campinas, nos
horários diurno e noturno, e nos campi de Piracicaba
e Limeira, tendo contado, todos, com grande participação
da comunidade. No sentido de ampliar ainda mais essa participação,
os debates foram gravados pela TV Unicamp e transmitidos
por meio da CameraWeb e do Canal Universitário de
Campinas.
As regras para os debates
foram formuladas de comum acordo entre a COC e representantes
dos candidatos. As entidades representativas das três
categorias que compõem a comunidade, a Associação
de Docentes da Unicamp, o Sindicato dos Trabalhadores da
Unicamp e o Diretório Central dos Estudantes, foram
convidados a compor a mesa condutora dos debates, e também
a formular perguntas aos candidatos. As demais perguntas
aos candidatos foram feitas pelos membros da comunidade
presentes aos debates, e selecionadas por meio de sorteio.
O Jornal da Unicamp
publicou, nas semanas que antecederam a consulta, entrevistas
com os candidatos, abordando questões relativas ao
ensino, à pesquisa, às relações
com a sociedade e à gestão da Universidade,
contribuindo assim para o aprofundamento desses temas e
para sua divulgação junto à comunidade.
Foi justamente sob esse
clima de democracia interna, combinado ao desejo de participar
da escolha do futuro reitor, que 9.393 membros da comunidade,
compareceram às 23 urnas localizadas nos quatro locais
de votação nos dias em que se realizou a consulta.
Dois desses locais localizaram-se no campus de Campinas
(Faculdade de Ciências Médicas e Ginásio
de Esportes), outro no de Piracicaba e o quarto no campus
de Limeira. Votaram nesta consulta 1.595 docentes, 5.546
servidores e 2.257 alunos.
Deve
ser destacado que esse número de votantes representa
um acréscimo de 28,5% em relação aos
que votaram na consulta anterior, ocorrida em 2005. Analisando-se
a participação por categorias, verifica-se
que o aumento se deu em todas elas. Votaram nesta consulta
13% a mais de docentes, 22% a mais de funcionários
e 65% a mais de alunos. Houve, portanto, um aumento significativo
na participação de todos os segmentos da comunidade,
sendo destacado o aumento no número de estudantes.
Mas, embora a participação
tenha aumentado, as taxas de abstenção ainda
são expressivas. Nesta consulta houve 18% de abstenção
entre os docentes, 23% entre os funcionários e 91%
entre os alunos. Para os futuros processos de consulta,
faz-se necessária uma análise cuidadosa dos
motivos que podem levar à abstenção,
buscando-se alternativas para motivar uma parcela ainda
maior da comunidade a participar do processo. Algumas sugestões
nesse sentido são apresentadas ao final deste artigo.
O Conselho Universitário
da Unicamp, por meio da Deliberação A-37,
de 30/09/2008, havia determinado que a consulta poderia
ser realizada de forma convencional, por meio de cédulas
de papel, ou por sistema eletrônico de votação.
Contudo, devido a dificuldades operacionais ocorridas com
o sistema eletrônico que seria utilizado nesta consulta,
o Consu reviu essa decisão em 16/12/2008, determinando
que fosse utilizado o método convencional.
Quanto à organização
do processo de consulta, deve ser destacado o importante
e competente trabalho realizado pela Secretaria Geral da
Unicamp, cujos funcionários trabalharam por vários
dias durante a fase de preparação da consulta,
e também durante o período de votação.
Também digno de destaque foi o trabalho voluntário
de mais de 170 pessoas, que atuaram junto às urnas
de votação como mesários durante os
dois dias, e também como apuradores. Agradecimentos
são devidos a cada uma dessas pessoas, pelo esforço
e dedicação que tornaram possível a
realização da consulta.
Olhando agora para o futuro,
sou da opinião que o processo de consulta pode ser
aperfeiçoado com vistas à escolha dos futuros
reitores. Um dos aspectos que deve ser levado em consideração
é o calendário do processo. O fato da consulta
ser realizada em meados do mês de março faz
com que toda a fase preparatória, incluindo as campanhas
dos candidatos, ocorra durante os meses iniciais do ano.
Como esse período coincide com as férias escolares,
a participação da comunidade nessas etapas
do processo tende a ser mais reduzida. Além disso,
o expressivo contingente de alunos de graduação
e de pós-graduação ingressantes nos
anos em que se realiza a consulta tem poucos dias para se
informar sobre o processo, e sobre os candidatos e suas
propostas, o que muitas vezes inibe sua participação.
Uma ação no sentido de deslocar o processo
em relação ao mês de março poderia
contribuir para estimular a participação,
principalmente no caso dos estudantes.
Um segundo aspecto que merece
atenção é a persistência do uso
do sistema convencional de votação, com cédulas
em papel. Esse método de votação tem-se
revelado cada vez mais anacrônico, possibilitando
a ocorrência de diversos tipos de falhas. As mais
comuns constatadas pela COC neste processo incluem desde
a falta de rubricas de mesários em algumas cédulas,
levando à anulação de votos, até
a difícil conferência individual das urnas,
em que o número de cédulas depositadas deve
coincidir com o número de assinaturas constante das
listas de eleitores. Devido ao grande número de assinaturas
superpostas nessas listas, algumas das urnas e respectivas
listas tiveram de ser conferidas sucessivas vezes, por diferentes
mesários e também pelos membros da COC. A
demora ocorrida no processo de apuração desta
consulta foi, em grande parte, devida a esse problema.
Outro argumento a favor
da votação utilizando o sistema eletrônico
é o seu potencial impacto com respeito à maior
participação da comunidade. Com esse sistema,
poder-se contar com um grande número de postos de
votação, localizados em todas as unidades
e órgãos da Unicamp, evitando-se deslocamentos
das pessoas até os postos centralizados usados na
votação convencional. Com isso, são
oferecidas maiores facilidades e cria-se um estímulo
adicional à participação dos vários
segmentos, mas principalmente dos alunos.
Urge, portanto, que a Unicamp
reúna suas competências para desenvolver um
sistema eletrônico de votação robusto,
seguro e que tenha a confiança de toda a comunidade,
a ser empregado nas próximas consultas para escolha
de seus dirigentes.
O balanço deste processo
de consulta à comunidade para escolha do reitor revela
um saldo extremamente positivo. Vivemos, sem sombra de dúvida,
uma oportunidade histórica de reflexão sobre
o futuro da Unicamp, por meio do exercício democrático
e participativo da sua comunidade. Estão de parabéns,
portanto, os dois candidatos que se submeteram ao processo
de consulta, e toda a comunidade que dele participou.
Álvaro Crósta é
diretor do Instituto de Geociências (IG) e Presidente
da Comissão Organizadora da Consulta à Comunidade
(COC)