Untitled Document
PORTAL UNICAMP
4
AGENDA UNICAMP
3
VERSÃO PDF
2
EDIÇÕES ANTERIORES
1
 
Untitled Document
 



nano transcriação

O poeta e músico Juli Manzi, cuja tese foi defendida no IA: diálogo entre a poesia e mídias eletrônicas (Foto: Antoninho Perri) Ao grafar a palavra “Infinitozinho” – ex­traída de um poema-escultura de Arnaldo Antunes – em um fio mil vezes mais fino que o cabelo, o poeta e músico Juli Manzi, nome artístico de Giuliano Tosin, fez história por “escrever” o primeiro nanopoema em língua portuguesa. Manzi, doutor em Multimeios pelo Instituto de Artes (IA) da Unicamp, afirmou que o objetivo dessa experiência é “mostrar o lado ocioso e vagabundo das mídias eletrônicas, um lado que não serve para nada senão gerar estados de espírito e insights para o intelecto”. Segundo ele, cabe aos artistas e aos poetas usarem as inovações das mídias de modo a subverter a lógica funcional desses meios. “Elas são programadas para uma finalidade meramente produtivista”, disse.

Utilizando a tecnologia de emissão de um feixe de elétrons, gerado por um microscópio eletrônico de transmissão por varredura, a palavra-poema foi impressa em um nanofio de fosfeto de índio, cuja medida impressiona: 35 nanômetros por 440 nanômetros, ou seja, a milésima parte de um fio de cabelo. O experimento foi desenvolvido em parceria com Daniel Ugarte, professor do Instituto de Física “Gleb Wataghin” (IFGW) e com os pesquisadores Giancarlo Tosin e Luiz Henrique Tizei, do Centro de Nanociência e Nanotecnologia Cesar Lattes, do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS). Faz parte de sua tese de doutorado, orientada pela professora Maria de Fátima Morethy Couto (IA), que foi defendida no último dia 24 de fevereiro.

Kit multimídia
O envolvimento de Tosin com a obra do compositor, músico e poeta Arnaldo Antunes surgiu no final da década de 1990, durante o trabalho de conclusão do curso de jornalismo, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Na época, constituiu como objeto de estudo a obra “Nome”, um kit multimídia do qual o pesquisador escolheu o videoarte, formado por videopoemas. “Para mim foi uma experiência muito marcante porque, até então, se tratava de um tipo de iniciativa artística e poética inédita”, contou. Ele ainda afirmou que nunca tinha visto alguém usar o vídeo e as animações computadorizadas, complementado por um trabalho de trilhas de áudio para fazer poesia multimídia.

No mestrado, realizado em seguida no programa de Multimeios do IA, o trabalho foi pesquisar como aconteciam as transferências de algumas obras do suporte impresso para as mídias eletrônicas. Descobriu então a existência da Teoria da Tradução Intersemiótica, criada pelo artista plástico e professor da Unicamp Julio Plaza, falecido em 2003. Tosin aliou essa teoria ao procedimento de tradução de Arnaldo Antunes, de poemas impressos a mídias eletrônicas. Paralelamente, trabalhou casos de Philadelpho Menezes, Décio Pignatari, Augusto de Campos e Julio Plaza, que tinham feito poemas em suporte impresso e depois reinventaram essas obras.

Tosin observou ainda que, no âmbito da teoria de Julio Plaza, havia um tipo específico de procedimento chamado de transcriação – conceito inspirado principalmente na obra de Haroldo de Campos, que dizia ser impossível traduzir poemas, ou seja, deve-se transcriá-los na língua de chegada. “Esse conceito foi baseado em Ezra Pound e Roman Jakobson, autores que faziam parte de um conjunto que os concretistas usavam como referência”, atestou.

O próximo passo era aliar a questão teórica com realizações práticas. O trabalho de doutorado permitiu ao pesquisador a continuidade das transcriações intermidiáticas e a utilização de diferentes mídias eletrônicas como o áudio, a animação digital, o vídeo e o nanopoema. “Foi uma maneira modesta de representar essa diversidade, essas possibilidades de realização que as mídias eletrônicas trazem”.

O nanopoema “Infinitozinho”, baseado em obra de Arnaldo Antunes: primeiro trabalho do gênero no país(Foto: Reprodução) Especificamente, no que diz respeito ao nanopoema, Tosin revelou que estava em busca de alguma mídia inusitada para realizar uma das transcriações. Numa conversa com o físico do LNLS Giancarlo Tosin, seu irmão, questionou acerca de tecnologias acessíveis na região de Campinas. Giancarlo falou sobre a escrita com nanopartículas e as diferentes técnicas que existem para isso. Apresentado ao professor Ugarte, o aluno lembra que na hora veio em sua mente o poema-instalação “Infinitozinho”. “Poder recriar esse poema nessas dimensões infinitamente pequenas, achei que ia dar um diálogo semântico muito legal com a obra do Arnaldo”, confessou.

Na opinião do pesquisador, o resultado final é uma excelente demonstração desse diálogo entre a poesia e as mídias eletrônicas, sobretudo porque o trabalho foi absolutamente experimental. “Quando digo experimental é porque não sabíamos quais seriam exatamente os resultados e nem se conseguiríamos fazer aquilo”, assegurou. Prova disso, é que uma nova transcriação utilizando a mesma técnica foi tentada e o experimento não teve êxito. Segundo Tosin, isso tem a ver com a questão da poesia como uma arte fora do controle de quem a faz e de quem a traduz. Para ele, o poeta é apenas um meio de canalização dessa energia superior que vem das palavras e dos pensamentos.

Tosin lembra que a relação da poesia com diferentes mídias é bem antigo. No século XIX, Stéphane Mallarmé trabalhou com novas formas de tipografia e desempenhou um papel fundamental na evolução da literatura, que obteve continuidade nas experiências dos dadaístas e futuristas, entre outros movimentos de vanguarda do século XX.

Existe, de acordo com o pesquisador, uma busca por parte dos poetas em produzir poemas usando os meios do seu tempo, valorizando as características midiáticas contemporâneas. “No Brasil isso foi muito valorizado em detrimento da poesia concreta”. Os concretistas, segundo ele, foram grandes incentivadores e estimuladores da poesia em diferentes mídias e quando isso chega ao universo digital, expande-se em termos de possibilidades de realização. E indaga: “Como pensa o poeta de hoje? Será que ele pensa só a partir do que ele lê ou a partir de todos os meios que ele consome? Portanto, é plausível que ele recorra a todo esse arsenal semiótico para produzir poesia”, concluiu.


 
Untitled Document
 
Untitled Document
Jornal da Unicamp - Universidade Estadual de Campinas / ASCOM - Assessoria de Comunicação e Imprensa
e-mail: imprensa@unicamp.br - Cidade Universitária "Zeferino Vaz" Barão Geraldo - Campinas - SP