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Sensor ‘inteligente’ faz medição
de energia elétrica por cômodos
Parceria entre Eletropaulo e Unicamp
prevê uso de módulos wireless
Os
custos inesperados com energia elétrica no país prosseguem
como um problema a ser solucionado, tanto com vistas à melhoria
de seus patamares para os consumidores, que nem sempre têm
noção do que terão que pagar no mês seguinte, quanto para
as concessionárias, que vivem a incerteza das constantes inadimplências
observadas ao longo desses anos. Para diminuir prejuízos e
permitir que os consumidores tenham conhecimento detalhado
sobre os valores das contas mensais, uma equipe de engenheiros
da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (Feec)
está concluindo um trabalho de quase dois anos num sistema
que felizmente possibilitará a medição individualizada de
energia elétrica em residências e empresas, com o uso de módulos
com sensores inteligentes wireless.
Trata-se de uma parceria com
a Eletropaulo, a maior distribuidora de energia elétrica do
Estado de São Paulo. A iniciativa do projeto, cujo responsável
na Unicamp é o professor da Feec José Antonio Siqueira Dias,
ainda conta com a expertise do professor da mesma unidade
Elnatan Chagas Ferreira, coordenador do convênio Unicamp e
Eletropaulo.
A intenção é identificar onde
estão os maiores consumos efetuados dentro de uma residência.
O novo sistema emprega Zigbee, uma tecnologia de rede disponível
mundialmente que designa um conjunto de especificações para
a comunicação sem fio entre centenas ou até eventualmente
milhares de pontos. A Zigbee Alliance é formada por um grupo
de empresas que permite o licenciamento de sua tecnologia
pelos interessados a fim de criar novas aplicações. “Usamos
esta comunicação para que os módulos conversem sem fio através
do sistema”, conta Siqueira.
A Eletropaulo deve injetar,
até o fim do projeto, cerca de R$ 800 mil, no que tange à
parte desenvolvida pela Unicamp, que gerou o sistema composto
pelos módulos medidores de energia elétrica que avaliam os
gastos bem como a comunicação wireless entre estes módulos.
Na Universidade, estão iniciando os testes com dez protótipos
nas dependências do Departamento de Eletrônica e Microeletrônica
(Demic), onde estão sendo feitas medidas que emulam os principais
equipamentos eletroeletrônicos em uma casa. Está sendo estudado
o funcionamento das redes e a confiabilidade dos módulos de
medida de energia.
Ao todo, serão entregues 80
protótipos, que ficarão pelo menos dois meses em testes de
campo. O programa piloto será testado em algumas residências
do Estado e na Eletropaulo já no início de 2011, para comparar
os valores encontrados com os obtidos do medidor de energia.
A tarefa de instalação é meticulosa, pois exige a distribuição
de sensores em todos os pontos de energia elétrica da residência.
Módulos
De acordo com Siqueira, no Demic avaliou-se a melhor situação
para inserir módulos medidores de energia elétrica sem danificar
as residências e nem modificar a instalação elétrica. “Isso
foi consensual”, garante. Foram a seguir desenvolvidos três
módulos medidores de energia elétrica, explica Luís Duarte,
gerente de projetos do convênio Eletropaulo e Unicamp. Ele
esclarece que, cada qual, mede o consumo de forma diferente,
isso por conta das várias maneiras de se distribuir a energia
dentro das casas. Estes três equipamentos poderão ser utilizados
simultaneamente.
O
primeiro módulo, que é o de mais fácil aplicação e também
o mais comum, afirma Duarte, é próprio para a tomada. Assim
sendo, em todo o equipamento que puder ser desligado da tomada,
insere-se esse módulo entre ela e o equipamento, “operando
como uma extensão”. Há uma via de entrada e outra de saída
para serem introduzidas nas tomadas do cômodo.
O segundo módulo mede o consumo
de energia elétrica de equipamentos que emitem luz, sejam
eles lâmpadas ou abajures, “já que não há como tirar uma tomada
da lâmpada e conectá-la ao equipamento”, explica Duarte. Neste
caso, um fotossensor verifica há quanto tempo a lâmpada está
ligada e há quanto tempo está desligada. O microcontrolador
faz um cálculo matemático e demonstra o quanto de energia
elétrica foi dispendida. Isso é programável, e o computador
devolve tais informações. “Enfatizamos que cada lâmpada tem
um consumo de energia.”
O terceiro módulo presta-se
a medir energia elétrica de equipamentos que consomem uma
grande quantidade de corrente. O chuveiro elétrico é um típico
exemplo: além de gastar mais energia, também possui maior
potência. “Para a medição do chuveiro, adota-se uma garra
semelhante a um alicate amperímetro”, expõe Duarte. Igualmente
através de cálculos matemáticos, o módulo fornece a potência
consumida.
O principal objetivo do estudo
foi oferecer ao consumidor uma forma de entender o consumo
de energia elétrica de cada eletrodoméstico para poder decidir
onde deve atuar para diminuir o seu consumo de energia. Além
disso, o consumidor pode comparar o consumo medido pelos módulos
com o esperado para o equipamento. “Relacionando o consumo
de cada equipamento com uma tabela que especifica o consumo
médio deles, há condições de saber se ele exibe algum problema
ou se é um modelo muito antigo que já dá sinais de que se
tornou ineficiente”, comenta o coordenador do projeto.
Na prática, ele resume o processo
de funcionamento dos módulos. Há uma instalação dos módulos
medidores de energia nos pontos em que ficam os eletrodomésticos
e luzes de toda a residência. Há um período de cerca de dez
dias para se ter uma mensuração precisa do consumo. “Constatamos
que um terço de um mês pode ser um período interessante para
obter esses dados”, expõe Duarte, pois uma semana nem sempre
dá a dimensão do consumo habitual, uma vez que as pessoas,
no fim de semana, usufruem da estrutura de suas casas de forma
diferenciada dos demais dias.
A comunicação dos sensores
é feita via rádio, com uma rede controlada por uma central.
Quando se fala em rádio, realça Siqueira, não se fala no sentido
de pessoas conversando. Esta é uma comunicação wireless, do
tipo da comunicação por IP (Internet Protocol) usado na Internet
sem fio, porém adotando-se um protocolo mais simples e que
impacta significativamente o desempenho dos mecanismos de
controle de tráfego.
A propósito, o professor revela
que existe uma grande probabilidade de a Eletropaulo – dentro
do Programa de Pesquisa e Desenvolvimento da Agência Nacional
de Energia Elétrica (Aneel) – levar o projeto para uma próxima
fase, numa modalidade que se chama “cabeça de série”. Com
isso, esse produto já estará praticamente pronto para industrialização.
A Eletropaulo e a Unicamp já conversam sobre a solicitação
de uma patente.
Cenários futuros
de automação
O projeto do Demic se reforça
como oportuno sobretudo porque existe uma tendência atual,
no cenário de curto prazo, relembra o professor Siqueira,
das tarifas praticadas pelas concessionárias no Brasil serem
diferenciadas de acordo com o período do dia em que são
usados os eletrodomésticos nos domicílios. “Há um upgrade
de nosso equipamento, que é um estudo futuro, em que numa
etapa posterior procurará compreender em qual horário poderá
ser posto em execução o seu uso racional. Sabendo hoje quais
eletrodomésticos gastam mais energia, isso permitirá ligá-los
em horários mais convenientes para economizar.”
Isso já ocorre em diversos
países do mundo, avisa o professor. No Brasil, o tema é
reincidente e no momento a discussão emerge através da agência
reguladora, a Aneel. Tal discussão deve ganhar impulso por
se cobrar cada vez mais o uso eficiente da energia. Já se
vislumbra a propensão mundial dos equipamentos serem inteligentes,
baseados na automação, mormente os que consomem muita energia,
como por exemplo a máquina de lavar roupa.
Conectada a um sistema desses,
estima Siqueira, a máquina de lavar avisaria o momento de
iniciar um novo ciclo de lavagem. Este sistema poderia atuar
enviando uma mensagem via celular para o proprietário da
máquina dizendo que ela estaria pronta para ser ligada.
Sabendo que são 17h30, por exemplo, e que isso poderia encarecer
a tarifa para o consumidor, o sistema perguntaria se a lavagem
poderia esperar até as 19h30.
Em outra situação então,
exemplifica o professor, a máquina que até foi ligada mais
cedo, às 16h30, quando chega às 17h30, ao continuar operando,
manda uma mensagem do tipo: “o ciclo de lavagem que estou
executando pode ser interrompido sem nenhum problema. Quer
que eu interrompa o ciclo e continue depois das 19 horas?”.
Toda esta inteligência, refere ele, demonstra potencial
para ser incorporada aos equipamentos em poucos anos.
Siqueira tem orientado algumas
teses nessa linha de pesquisa, intitulada “Breakdown de
consumo de energia”. O termo breakdown, define ele, é empregado
para dar o sentido de repartição em pequenas fatias do consumo
de energia. “Esta é a primeira vez que vejo um projeto capaz
de fazer uma medida completa de uma residência e detalhar
o consumo de todos os equipamentos”, comenta. Duas teses
de mestrado de seus alunos, engenheiros eletricistas, têm
ligação com este trabalho. Ambas, aliás, são complementares.
Uma é a de José Douglas Zambianco, que aborda a parte de
Zigbee, com base na qual foi feita a central – o concentrador
– e todos os circuitos responsáveis pela comunicação entre
os módulos.
A outra, do aluno Douglas
Airoldi, deu relevo aos módulos de medida e também à interligação
de duas ou mais redes ZigBee usando módulos PLC (Power
Line Communications), que se comunicam através da própria
rede de energia elétrica.
A necessidade de se realizar
redes híbridas (ZigBee interligadas por módulos PLC) apareceu
depois de discussões com a Eletropaulo, quando observou-se
uma limitação para a aplicação do projeto, caso os módulos
ZigBee fossem instalados, por exemplo, numa fábrica que
tem dois barracões distantes um do outro.
O que ocorre é que esta
tecnologia de comunicação wireless tem, ensina o coordenador,
uma limitação de distância: cerca de 15 metros. “Imagine
só dentro de paredes, num barracão que dista de outro uns
50 metros. Não conseguiríamos fazer tal comunicação. Com
a rede híbrida, tudo é totalizado num ponto só, ou seja,
quando termina a comunicação, está tudo pronto para emitir
um único relatório.”
Segundo Siqueira, esse projeto
tem um fundo social muito saliente porque leva em consideração
a incapacidade das pessoas pagarem as suas contas. “Sou
da teoria que as pessoas até querem regularizar esse pagamento,
mas lhes faltam recursos para isso”, defende ele.
O consumidor, imaginando
um gasto de R$ 60,00 com energia elétrica por mês, ao receber
sua conta, constata um número bem superior ao esperado –
R$ 150,00. Não tem da onde tirar este dinheiro e tenta renegociar
o pagamento. No mês seguinte, a situação repete-se. “O consumidor
e a companhia não sabem mais o que fazer e nem da onde vem
o desperdício”, contextualiza o professor.
Essa nova ferramenta poderá
contribuir muito com o consumidor, por vir com a proposta
de um programa de educação. “Se o programa da Eletropaulo
de fato for ativado da forma como se prevê, isso será replicado
num grande número de residências do Estado. A princípio,
eles poderão atender até 500 casas simultaneamente”, relata
Siqueira.
Para pequenas empresas,
que pagam suas contas, mas gostariam de reduzi-las, esse
sistema será um ótimo aliado porque se instalam os módulos
em suas dependências e lá são deixados até conseguir um
diagnóstico. Estas empresas em geral pagariam por este serviço.
Com a nova sistemática, os funcionários da concessionária
iriam até o local e fariam a instalação gratuitamente.
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