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Tese comprova viabilidade de planta
industrial para extração supercrítica
Estudo da FEA revela que aumento
da
escala melhora o desempenho do processo
Estudo
realizado pela engenheira de alimentos Juliana Martin do Prado,
da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp,
comprovou a viabilidade técnica e econômica para a instalação
de uma planta industrial de extração supercrítica em território
brasileiro. Para tanto, ela utilizou como matéria-prima modelo
o cravo-da-índia e a validação da metodologia foi proposta
utilizando matérias-primas de perfil agronômico e tipos de
extratos diferentes como o gengibre, o cidrão, a semente de
uva e o resíduo de cana-de-açúcar.
O grande
destaque, de acordo com a pesquisadora, é o resíduo de cana.
Trata-se de um subproduto que é pouco ou nada aproveitado
pelas usinas e do qual, a partir do processo de extração,
obtém-se uma cera rica em alguns compostos de interesse da
indústria farmacêutica, usados especificamente no tratamento
da redução de colesterol. “Acreditamos bastante nesse resíduo.
Ele está totalmente disponível com custo zero e as usinas
têm potencial para investir numa planta desse tipo”, garantiu
Prado. O estudo resultou em tese orientada pela professora
Maria Angela de Almeida Meireles, coordenadora do Laboratório
de Tecnologia Supercrítica (Lasefi) da FEA.
Com relação
ao investimento na montagem dessas novas indústrias, a engenheira
revelou que a entrada da China no mercado de equipamentos
para a extração supercrítica contribuiu significativamente
para a redução dos custos. Antigamente, segundo ela, os fabricantes
estavam apenas nos Estados Unidos e Europa e eram necessários
cerca de US$ 2 milhões para aquisição dos equipamentos necessários.
Hoje, esse valor teve uma redução de praticamente 50%, ou
seja, com pouco mais de US$ 1 milhão é possível implantar
uma indústria de alto nível.
“É o
tipo de investimento cujo retorno é bastante dependente da
matéria-prima escolhida para trabalhar”, argumentou a pesquisadora.
Pelas suas estimativas, existe a possibilidade do tempo de
retorno ser inferior a um ano, dependendo da matéria e seu
valor agregado. Seguramente, disse Prado, uma indústria desse
tipo trabalhará com um blend de matérias-primas, o que certamente
puxará o custo para cima ou para baixo. No entanto, ela lamenta
que o empresariado brasileiro ainda conserve uma velha visão
de que o investimento inicial seja muito alto, além de muitas
dúvidas que poderiam ser esclarecidas junto aos especialistas
da área.
Prado
enfatizou que o trabalho desenvolvido no Lasefi foi muito
importante para mostrar que, conforme se aumenta a escala
de extração, o desempenho do processo apresenta sinais altamente
positivos. “Esse resultado é bastante significativo, principalmente
quando se adiciona a análise de viabilidade econômica”, disse.
Dessa maneira, a engenheira acredita que é absolutamente viável
montar uma indústria de grande porte no Brasil trabalhando
com as matérias-primas nacionais. “Atualmente vendemos a planta
e importamos o extrato”, afirmou.
Questionada
a respeito do que é escala industrial em extração supercrítica,
Prado explicou que isso está ligado ao volume do extrator.
Em escala de laboratório os extratores vão de 3 ml até um
litro. O extrator com o qual ela trabalhou em escala piloto
tinha cinco litros. Já na escala industrial o volume do equipamento
depende muito da aplicação. Quando a produção está focada
em plantas cujo extrato tem alto valor agregado e a quantidade
de matéria-prima processada não é tão alta, a partir de 50
a 100 litros já é considerado uma unidade industrial.
A supercrítica
é muito usada para, por exemplo, fazer a descafeinização de
café e chá. Para essas matérias-primas, cuja demanda é muito
grande, existem extratores industriais de mil litros. “Para
as plantas escolhidas neste trabalho, com escala reduzida
e alto valor agregado, serão utilizados extratores na faixa
de 100 a 400 litros”, explicou Prado.
Parte
da tese foi desenvolvida em parceria com empresa Centroflora,
da cidade de Botucatu (SP), no âmbito do projeto Parcerias
para a Inovação Tecnológica (Pite), uma linha de fomento da
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
A empresa financiou 40% do projeto, que teve custo total de
R$ 664 mil. Prado disse que essa questão da interação universidade-empresa
é muito importante, uma vez que atualmente é uma realidade
distante. Para ela, é preciso que ambas as partes criem laços
e aprendam a dialogar. “Estamos formando no laboratório pessoas
com essa visão de conseguir fazer essa ponte, que está faltando
no Brasil. É uma questão cultural. Pesquisa é uma coisa que
demanda tempo e dinheiro. Mas é importante que haja investimento”,
assegurou.
Metodologia
Quando qualquer matéria-prima
nova chega ao Lasefi e não há ideia de como é formada sua
composição, a pesquisadora contou que a atuação fica sobre
os compostos de interesse. A primeira coisa a ser feita é
uma extração por vários métodos, inclusive as clássicas –
por solventes e por arraste a vapor – para comparar com a
supercrítica em diferentes condições de temperatura e pressão.
A partir desses extratos é determinada a composição química
e, também, a atividade biológica – antioxidante ou antimicrobiana.
A partir daí, pode-se determinar, de todos os extratos, o
que está mais interessante do ponto de vista fitoquímico ou
de atividade biológica.
Na maioria das vezes, a supercrítica
acaba sendo a mais interessante. “Escolhemos o extrato mais
interessante e aumentamos a escala, trabalhando com otimização
– tempo de processo, quantidade de solvente – e depois finalmente
aumentamos a escala para piloto onde se trabalha com separadores.
Nessa fase tentamos concentrar o composto de interesse em
uma das frações”, pormenorizou.
Em 25 anos de atividades,
o Lasefi já caracterizou aproximadamente 40 espécies. Isso,
de acordo com Prado, é bastante significativo, porque cada
planta demanda um tempo considerável. “No começo eram poucas
plantas e agora temos um ritmo bastante acelerado. Desenvolvemos
um protocolo e sabemos o caminho a seguir. Caracterizamos
várias plantas ao mesmo tempo”, contou.
Tecnologia limpa
O processo começa com a colocação
da matéria-prima no leito extrator. Depois de fechar toda
a linha, acontece a pressurização com CO2 que escoa através
do leito e atua como solvente. Com a alta pressão, ele acaba
atingindo densidade próxima de líquido e na saída, quando
ocorre a despressurização, ele se separa do extrato, resultando
no produto final. Ele tem ainda a vantagem de poder recircular
na linha. “Em termos ambientais é uma tecnologia 100% limpa”,
assegurou Prado.
Existem alguns casos em que
o CO2 não é suficiente para extrair o composto
de interesse de determinada planta. Nesses casos adiciona-se
solvente em quantidade pequena – etanol ou água – para ajudar.
A engenheira ressaltou que quando são usadas essas substâncias
o processo continua 100% limpo. Porém, em alguns casos isso
não é suficiente. “No nosso laboratório não trabalhamos com
nenhum solvente tóxico, no entanto, existem alguns trabalhos
usando metanol, clorofórmio ou acetona, mas essa quantidade
é reduzida, ocasionando um impacto ambiental bem pequeno”,
acrescentou.
Quando a extração é feita com solvente orgânico o grande problema
é o resíduo. Mesmo que uma pequena quantidade de CO2 fique
retida após a despressurização, não há o menor problema porque
é completamente atóxico, ou seja, bastante seguro, tanto do
ponto de vista do consumidor quanto do operador da planta
industrial. “Quando há contaminação no extrato, isso se torna
também um risco para o operador”, garantiu a engenheira.
O Lasefi recebeu como doação
da Waters Technologies do Brasil Ltda. um cromatógrafo operando
com tecnologia de extração supercrítica. Segundo Prado, ele
terá a mesma função do cromatógrafo líquido (CLAE ou HPLC),
no entanto seu modo operacional é diferente. Há uma redução
no tempo de análise e na quantidade de solvente e, também,
é possível analisar simultaneamente um número maior de substâncias
por conta da pressão que é aplicada. “Como usamos diferentes
solventes, conseguimos algumas metodologias de análise que
não era possível obter por HPLC. Dessa maneira, agregamos
outras informações”, informou Prado.
A cromatografia supercrítica
já existe há algum tempo, porém, ela ainda não está totalmente
estabelecida. A engenheira disse que se quiser fazer uma análise
de qualquer composto por HPLC, há muito material disponível
na literatura e, portanto, é possível reproduzir determinadas
metodologias. Com relação à nova tecnologia, ela ainda não
está desenvolvida a esse ponto. “Estamos abrindo um novo campo
de pesquisa”, ressaltou.
Além disso, a engenheira iniciará
seu pós-doutoramento na área de biocombustíveis de segunda
geração. Será montado um equipamento de hidrólise para obter
açúcares a partir de resíduos industriais. “Essa é a próxima
etapa do Lasefi. Conhecemos muito da extração e trabalhamos
também com a formação de partículas no meio supercrítico.
Agora partiremos para cromatografia e as reações de hidrólise”,
afirmou Prado.
A engenheira de alimentos
lembrou ainda que, além da pesquisa mostrar que a viabilidade
técnica e econômica da implantação de uma unidade industrial
no Brasil é garantida em sua integralidade, no nosso país
existem profissionais altamente capacitados para atuar nesse
meio. “São pessoas que podem ajudar o empresário a desenvolver
um projeto e que esteja disposto a investir numa unidade desse
tipo. E aqueles que acreditarem sairão na frente com muita
vantagem”, concluiu.
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Publicação
Tese de doutorado “Estudo do aumento de escala do processo
de extração supercrítica em leito fixo”
Autora: Juliana Prado
Orientadora: Maria Angela de Almeida Meireles
Unidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos
(FEA)
Fonte de financiamento: FAPESP/ Projeto PITE
2005/60485-1 desenvolvido em parceria com a empresa Centroflora.
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