O professor Octavio Ianni é
um homem de esquerda. Mais que isso, é um intelectual
que durante toda a sua vida defendeu idéias
de esquerda, escreveu sobre experiências de
esquerda e nunca se furtou a uma análise serena
e honesta do declínio do marxismo e do avanço
do capitalismo nas décadas finais do século
20.
Já na década de 50 o professor Octavio
Ianni era um dos pilares da sociologia brasileira,
ao lado de Florestan Fernandes e, torça-se
ou não o nariz, Fernando Henrique Cardoso.
Nos anos 60, década muito
mais fecunda que hoje em termos de debate de idéias,
Ianni foi um ponto de referência para toda uma
geração de novos cientistas sociais.
Na década de 90, morto Florestan e Fernando
Henrique feito presidente, Ianni continuou sua trajetória
intelectual sem interrupção, sem concessões,
um agudo olhar de lince lançado sobre os fenômenos
novos trazidos pelo vento da história. Tornou-se
um crítico do globalismo e um dos pontos de
apoio da esquerda que ainda se arriscava a brandir
a idéia de um projeto nacional.
Agora que, teoricamente, a esquerda
chegou ao poder no país, era preciso uma voz
insuspeita como a do professor Ianni para nos advertir
de que ainda não. Para ele, o presidente
pensa que é presidente de um estado nação,
quando na verdade é o administrador de
uma província do globalismo. Condição
adversa da qual evidentemente o governo não
tem culpa, mas que deveria combater com as armas próprias
de quem veio dos movimentos sociais, em
vez de se dedicar, tão apressadamente,
a satanizar a atividade intelectual na universidade
pública.
Refere-se o professor Ianni, entre
outras coisas, à ameaça de desmonte
do setor público e da universidade, embutida
no projeto do governo, e que ele vê como parte
do próprio desmonte do projeto nacional,
ou seja, uma determinação do Consenso
de Washington a que a esquerda que compõe o
núcleo do governo não soube resistir.
Ou não pôde. Ou não quis.