André Luís Bonin, ex-aluno do Centro Superior
de Educação Tecnológica (Ceset)
da Unicamp, em Limeira, é hoje um bem-sucedido
consultor na área de controle ambiental. Mas
jamais imaginou que um projeto de sua autoria, desenvolvido
quando era aluno de graduação, em 1994,
pudesse ter uma repercussão como a alcançada
na cidade de Limeira. Bonin, orientado pelo professor
Adilson J. Rossini, identificou uma alternativa para
a reutilização da areia preta de fundição
na construção civil e, desde abril deste
ano, o projeto ganhou força ao proporcionar
a construção de uma fábrica de
tijolos ecossocial na entidade Comunidade Terapêutica
Mais Vida de Limeira, que trabalha na prevenção
e recuperação de dependentes químicos.
Tudo começou, conta
o professor Rossini, quando o então aluno Bonin
idealizou um processo alternativo para reutilização
de resíduos das indústrias de fundição.
Na época, a empresa Freios Varga hoje
TRW interessou-se pelo assunto e levou o graduando
para a fábrica para que a pesquisa fosse aperfeiçoada.
A diretora associada do Ceset, Regina Lúcia
de Oliveira Moraes, explica que através de
um convênio entre o Ceset e a empresa, Bonin
recebeu uma bolsa, válida por um ano, para
desenvolver o projeto. Depois de concluído,
o trabalho ganhou projeção nacional
ao ser apresentado no Congresso da Associação
Brasileira de Engenharia Sanitária, realizado
em 1995 em Salvador e, em 1996, no Congresso da Associação
de Indústrias de Fundição de
Aço.
Naquele momento, pouco
se falava no assunto, lembra Rossini. Segundo
ele, o estudo chamou a atenção de muitos
pesquisadores para uma linha de reutilização
da areia de fundição, até então
descartada no solo. Ele considera a pesquisa de seu
ex-aluno uma das precursoras na área. Logo
depois da apresentação nos congressos
de maior visibilidade da categoria, começaram
a surgir diversos estudos sobre o assunto.
Vários anos se passaram
e a pesquisa desenvolvida pelo aluno ficou na prateleira
da empresa, conta Regina. Um dos motivos pelo qual
a TRW não materializou o projeto de imediato,
foi por já possuir alternativas de descarte
do material. Eles possuem um aterro especial e contam
com o apoio municipal para o descarte adequado. A
média de produção do resíduo
na empresa gira em torno de 800 a 1.000 toneladas
por mês e embora seja classificado na categoria
2 material não inerte precisa
de uma destinação específica.
Rossini comenta que a grande quantidade de descarte
no solo pode causar a diminuição da
vida útil do aterro.
Recentemente, um grupo de
voluntários da empresa TRW, ao tomar conhecimento
da inovação, resolveu arregaçar
as mangas e começar um trabalho que tivesse
alcance social. A empresa possui ações
de responsabilidade social muito fortes, comenta
Rossini. A alternativa foi viabilizar a construção
de uma fábrica de tijolos na entidade Mais
Vida. Rossini não tem dúvidas de que
o projeto ganhou vida graças à persistência
do grupo de voluntários da TRW. Este
tipo de resultado é bastante gratificante,
comemora.
Caso a caso
Embora se constitua em um bom trabalho de reaproveitamento
de resíduos gerados em indústrias de
fundição, Rossini alerta que o estudo
foi específico para a empresa TRW. Ele explica
que outros casos de reutilização devem
ser estudados de forma detalhada. A metodologia
pode até ser adaptada, mas não generalizada
para todos os tipos de areia. Isso porque cada
resíduo possui características próprias
e a falta de um estudo aprofundado pode acarretar
danos ao meio ambiente.
Para chegar ao processo final,
Bonin procedeu ao conhecimento de como é gerado
o resíduo. Nesta etapa, ele avaliou a matéria
prima utilizada, a água, a energia e todas
as variáveis envolvidas. Em seguida foi feita
a caracterização da areia, mais especificamente
do que ela é constituída. Para isso,
o graduando recorreu às normas da ABNT para
a classificação com ensaios de solubilização
(quantos poluentes são solubilizados), de lixiviação
(quantos poluentes são liberados na água)
e massa bruta (quantos contaminantes constituem a
massa do resíduo).
Ecológico
A próxima etapa foi realizar estudos da composição,
recorrendo para isto a vários testes para a
checagem se a composição técnica
seria compatível com a resistência. Neste
estágio, o Ceset se transformou em um campo
de testes. Calçadas e passagens foram feitas
com o material desenvolvido.
Segundo Rossini, ainda faltava um dos testes principais,
que seria o das características ambientais
do produto. Para isso, os blocos e tijolos foram moídos
e submetidos a novas provas. Um aspecto interessante
foi que, ao comparar com outros blocos já comercializados,
o desenvolvido por Bonin apresentou valores menores
de substâncias contaminantes ao meio ambiente
do que os já existentes no mercado, o que originou
a denominação ecossocial.
Uma vez realizados todos os testes, o produto mostrou-se
viável e eficiente para sua fabricação
em grande escala de blocos, tijolos, postes, guias,
sarjetas, bloquetes e outros artefatos de concreto.
Secagem é natural
A comunidade Terapêutica
Mais Vida, em Limeira, possui guaritas, paredes,
bancos, fornos e churrasqueiras construídas
com o tijolo ecossocial. Foi uma grande
iniciativa para a entidade, comenta a
administradora Célia Regina Lana. Além
do aspecto financeiro importante para a comunidade,
um fator que vale ressaltar, segundo ela, é
a eficiência terapêutica da atividade.
Em geral, os pacientes que buscam o auxílio
da entidade para se recuperar da dependência
química, são dotados de baixa
auto-estima. O trabalho na fábrica
faz com que eles se sintam participantes de
algo útil, explica. Muitos dos
internos estão participando da idealização
do projeto. Deram idéias, formularam
opiniões e ajudaram a construir a fábrica.
Isto realmente tem um valor inestimável.
Célia também
fala sobre o retorno financeiro que o projeto
pode oferecer para a Comunidade. Segundo ela,
o sustento da entidade, que atende adolescentes
e adultos, vem basicamente de parcerias com
empresas, da promoção de eventos
e de uma parcela do orçamento municipal.
Em geral, é muito difícil
sustentar os 40 pacientes que temos nesta Unidade
que demanda, mensalmente, uma verba de R$ 20
mil.
Toda infra-estrutura do barracão
onde funciona a fábrica foi doada pela
TRW, o que elevou o padrão de qualidade
da entidade, segundo Célia. São
máquinas que podem produzir até
três mil tijolos por dia. Como estamos
iniciando os trabalhos, as máquinas estão
operando com a metade da capacidade. Ao
contrário do processo tradicional em
que são utilizados fornos para a secagem
do tijolo, na fábrica da Mais Vida a
secagem é natural. Por isso, ele não
apresenta imperfeições e são
todos fabricados uniformemente. A mistura da
areia de fundição, cimento e água
produz um melhor isolamento térmico e
acústico. Devido a sua qualidade e uniformidade
dimensional, o tijolo oferece uma economia pela
redução da espessura da camada
de reboco. Seu peso é de 1.600 g e as
dimensões, de 5cm x 10cm x 20cm.
A Comunidade Terapêutica
foi fundada em 1998 e possui outras duas unidades
em Limeira e um braço que atua em atividades
de prevenção ao uso de drogas.
Além da fábrica de tijolos, também
integram as atividades dos pacientes, uma horta
e a criação de porcos. Atualmente,
Rossini e Regina trabalham em um projeto para
baratear o custo do tijolo e incrementar a comercialização
do produto para ajudar na arrecadação
de verbas para manutenção.
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