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Ingestão de probióticos é benéfica
para portador de doença intestinal
Estudo conclui que microrganismos
controlam diarreia em casos de Doença de Crohn
O
uso de probióticos – microrganismos vivos que conferem benefícios
à saúde das pessoas quando administrados em quantidades adequadas
– nos portadores da Doença de Crohn, uma das principais enfermidades
inflamatórias intestinais, mostrou-se eficiente no controle
da diarreia, sintoma frequente nestes pacientes. O resultado
foi obtido na dissertação de mestrado da nutricionista Luciane
Cristina Rosim Sundfeld Giordano com pacientes atendidos no
Ambulatório de Doenças Inflamatórias Intestinais “Prof. Dr.
J. Ricardo Navarro Góes” do Centro de Diagnóstico de Doenças
do Aparelho Digestivo (Gastrocentro).
A pesquisa, apresentada à
Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp e orientada
pelo professor Cláudio Coy, do Departamento de Cirurgia, investigou
os efeitos da modulação da microbiota intestinal dos pacientes
pela suplementação oral das bactérias Lactobacillus casei
e Bifidobacterium breve. Os achados se mostraram animadores,
com os pesquisadores observando redução da ocorrência de diarreia
assim como melhora do estado nutricional.
Infelizmente, diz Giordano,
a doença de Crohn não é tão rara, lamenta ela, e 424 portadores
da doença estão cadastrados e em acompanhamento na Unicamp.
Na época, a nutricionista identificou que um grande número
de pacientes com doença de Crohn apresentava diarreia de difícil
resolução. Propôs então o desenvolvimento de um projeto envolvendo
o uso de probióticos para avaliar a sua efetividade. Ela lembra
que estes pacientes, na fase de atividade da doença, chegam
a apresentar até 25 episódios de evacuações ao dia. “Esta
é uma doença crônica que acomete principalmente os indivíduos
jovens, podendo atingir todo trato gastrointestinal, isso
com repercussões graves como a desnutrição, por exemplo.”
A pesquisadora trabalha na
Divisão de Nutrição e Dietética do HC supervisionando a área
de preparo de dietas enterais há mais de 15 anos, além de
desenvolver seu trabalho nas enfermarias e nos ambulatórios
de Gastro bem como membro da equipe multiprofissional de terapia
nutricional. Segundo ela, a sua pesquisa teve início ao ser
convidada a atuar nesse Ambulatório pelo médico Juvenal Ricardo
Navarro Góes, falecido em 2007.
Em meados de 2006, o projeto
teve então seu início com o intuito de se verificar a ação
de um probiótico especial que continha duas cepas (Lactobacillus
e Bifidobacterium) na frequência do hábito intestinal e no
estado nutricional. “Dados da literatura demonstraram que
70% a 80% dos pacientes hospitalizados com doença de Crohn
ativa possuíam graus variados de desnutrição secundária à
diarreia”, expõe a pesquisadora. Pelo fato de a doença não
ter cura, torna-se portanto fundamental o acompanhamento nutricional,
para que a resposta ao tratamento seja mais eficiente.”
Particularidades
Giordano selecionou 22 pacientes
com idade média de 22 anos por ocasião do diagnóstico. Um
dos fatores mais impactantes desta doença, conta, é o fato
de seu acometimento ser mais frequente em adultos jovens,
numa fase da vida em que eles deveriam estar bastante produtivos.
Porém, em função do aparecimento da doença, ocorrem diversas
limitações. Acredita-se que o seu desenvolvimento, a partir
do contato com substâncias com potencial de iniciar um processo
inflamatório primariamente intestinal, sejam oriundas da alimentação
ou de microrganismos presentes no próprio intestino. “Esta
inflamação, que deveria ser de curta duração, torna-se crônica
em indivíduos predispostos. Assim, parece lógico supor que
a modulação da microbiota intestinal possa alterar diversos
aspectos da doença. Este conceito é que orienta inúmeros trabalhos
existentes com probióticos na doença de Crohn”, recorda Cláudio
Coy.
Giordano esclarece que, na
doença de Crohn, ocorre um desequilíbrio da microbiota intestinal.
Quando o indivíduo está saudável, existe um padrão na população
bacteriana e, nos portadores dessa doença, há uma quantidade
reduzida sobretudo de Bifidobacterium, mas também de Lactobacillus,
bactérias com ações benéficas ao organismo. Isto explicaria
porque esta doença manifesta-se predominantemente no final
do intestino delgado e cólon (intestino grosso) – segmentos
do tubo digestivo com maior quantidade de bactérias.
No estudo, a maioria dos pacientes
eram portadores de desnutrição, com perda de peso acima de
10% em seis meses. O probiótico liofilizado (em pó) foi-lhes
fornecido durante três meses. “Com o seu emprego, observou-se
uma recuperação ponderal (de peso) significativa, sem ônus
financeiro algum ao paciente. O peso médio aferido no início
do estudo foi de 55 kg e, ao final, de 57 kg. Constatou-se
melhora também em outros parâmetros nutricionais estudados.
Estes dados evidenciaram que o controle verificado na diminuição
do número de evacuações com uso do probiótico trouxe secundariamente
um ganho significativo em vários aspectos nutricionais, sem
que houvesse interferência nos hábitos alimentares destes
pacientes, esclarece a nutricionista.
Segundo o orientador da dissertação,
a incidência das doenças inflamatórias intestinais vem aumentando
nos últimos anos em várias partes do mundo, inclusive no Brasil,
sem que se conheça ao certo os motivos para tal. O número
de casos de doença de Crohn no Ambulatório de Doenças Inflamatórias
Intestinais do Gastrocentro, por exemplo, vem crescendo progressivamente.
Em 2003, eram atendidos entre dois e três casos numa manhã,
dia desse ambulatório, e atualmente entre 30 e 40 pacientes
por período. Cláudio Coy afirma que várias alterações genéticas
são atualmente conhecidas e muitas delas relacionadas ao desenvolvimento
desta doença. Em algumas famílias e em determinados grupos
raciais, há uma incidência maior do que na população geral.
Ao explicar como é a doença,
o médico relata que se trata de uma enfermidade crônica e
limitante. Além disso, seus portadores lidam com diarreia,
cólicas, osteoporose, não se alimentam adequadamente, têm
desnutrição, anemia e outras manifestações que transcendem
o acometimento intestinal, piorando a qualidade de vida. Muitos
pacientes têm que ser operados várias vezes, ficam debilitados
e mais predispostos a infecções e complicações pós-operatórias.
Tanto Cláudio Coy como Giordano
acreditam que a resposta inflamatória que ocorre no intestino,
com envolvimento de outros órgãos, seja desencadeada por alguma
alteração na microbiota intestinal e que a sua modulação pode
melhorar o curso da doença. A expectativa de ambos é que o
emprego de probióticos mostre-se cada vez mais útil, podendo
ser instituído como terapia adjuvante ao tratamento medicamentoso.
Descoberta
De acordo com definição da Organização Mundial da Saúde (OMS),
em 2002, a mais utilizada internacionalmente, os probióticos
são “microrganimos vivos que, quando administrados em quantidades
adequadas, conferem benefícios à saúde do hospedeiro”. O pioneiro
no estudo com probiótico foi o cientista russo Élie Metchnikoff,
em 1908, que descobriu o Lactobacilus bulgaricus, a ele cabendo
no mesmo ano o Prêmio Nobel de Medicina, por verificar o papel
positivo da seleção de bactérias na longevidade do ser humano,
o que demonstra que o tema vem sendo investigado há muitos
anos.
A partir das suas observações
sobre a população de camponeses da Bulgária, sugeriu que as
bactérias do leite seriam facilitadoras para a manutenção
da saúde e prevenção de doenças, sendo, desta forma, importantes
para retardar o envelhecimento. Na época, ele constatou a
longevidade dos camponeses búlgaros que, ao saírem para trabalhar,
transportavam leite de búfala em moringas de couro. O leite
fermentava e eles o ingeriam ao longo do dia. Descobriu-se
aí o valor do probiótico, o qual recebeu o nome de Lactobacillus
bulgaricus por este motivo.
Neste mesmo período, Henry
Tissier, pediatra e microbiologista francês, descobriu que
nas crianças em aleitamento materno exclusivo havia a colonização
excessiva de um organismo dominante – os quais foram denominados
bifidobactérias pelo formato bifurcado – em crianças saudáveis.
Observou que as fezes de crianças com diarreia continham baixos
níveis deste microrganismo sugerindo que esta bactéria seria
administrada a fim de ser restituída a microbiota intestinal
saudável destes bebês. Em 1930, no Japão, Minoru Shirota descobriu
um probiótico nomeado Lactobacillus casei, cepa Shirota, o
qual foi capaz de sobreviver à passagem de todo o trato gastrointestinal,
sendo resistentes à acidez e bile, chegando vivos nas fezes.
Publicação
Dissertação de mestrado: “Avaliação de parâmetros clínicos
e nutricionais com emprego dos probióticos Lactobacillus casei
e Bifidobacterium breve em portadores de Doença de Crohn”
Autora: Luciane Cristina Rosim Sundfeld Giordano
Orientador: Cláudio Saddy Rodrigues Coy
Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM)
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