O que a pesquisadora não esperava era que testes em vestibulandos revelassem que a maior pressão sofrida não ocorre no momento dos exames, mas sim no mês de setembro, justamente quando são abertas as inscrições para as provas. A pesquisa mostra ainda que altos índices de estresse persistem por um período longo do ano.
Na opinião de Regina Célia, mais até do que na hora de brigar por uma vaga na universidade, o candidato fica mais nervoso no momento de escolher a universidade e a carreira que irá seguir para o resto da vida. “É uma escolha difícil, que requer muita conversa e orientação por parte de pais e professores. Mesmo assim, trata-se de uma tomada de decisão que pode influenciar os próximos anos de sua vida”, explica Regina Célia.
O que chamou atenção da pesquisadora para o problema foi sua experiência nas séries iniciais da graduação. “A incidência de doenças relacionadas ao estresse é muito alta. Muitas dessas patologias tornam-se crônicas”, observa. Por isso, o interesse em comprovar biologicamente o fenômeno.
Os testes foram aplicados pela educadora física Maria Cândida Camargo Rolim, sob orientação da professora do IB, em 92 pré-vestibulandos e 48 alunos do segundo ano do ensino médio. Eles foram submetidos a um exame mensal na saliva que indica a concentração de cortisol hormônio secretado em maior quantidade em situação de estresse.
Maria Cândida colheu 1.680 amostras para análises e comparou os índices de estresse entre os pré-vestibulandos e os estudantes de ensino médio em meses semelhantes.
Para os pré-vestibulandos, os exames também foram feitos no dia da prova. Com o objetivo de embasar as evidências apuradas nos testes, a educadora aplicou questionários para investigar a ocorrência de sinais e sintomas do quadro. Enquanto os alunos de ensino médio mantiveram as concentrações estáveis de cortisol ao longo do ano, os pré-vestibulandos tiveram alterações acentuadas em setembro e no dia da prova. Os índices altos, no entanto, permaneceram ao longo do ano nos candidatos ao vestibular.
Terapêutica Com os resultados apurados na pesquisa feita por Maria Cândida, um outro trabalho de mestrado, proposto pela professora Regina Célia, foi submeter os pré-vestibulandos a uma fisioterapia terapêutica nos períodos de maior concentração de cortisol na saliva, ou seja, os meses de setembro e novembro. O tratamento foi realizado pela fisioterapeuta Heloísa Aparecida Ferreira e, depois, comparado com um grupo-controle que não participou da terapêutica.
Os efeitos da iniciativa ainda não foram concluídos. Entretanto, pelos depoimentos informais dos voluntários, Heloisa acredita ter alcançado seus objetivos. “Muitos candidatos que me procuraram disseram que, depois da fisioterapia, estavam mais tranqüilos para realizar as provas”, comenta. A esperança da fisioterapeuta é conseguir, a partir das análises dos exames feitos na saliva, identificar uma redução do nível de estresse nos jovens, e também uma correlação com a aprovação nos exames.
Heloisa explica ainda que esse tipo de experiência pode despertar os jovens e adolescentes para a utilização da fisioterapia com fins terapêuticos. “Trata-se de uma população pouco assistida. Em geral, nos trabalhos acadêmicos e nas clínicas, a atenção é concentrada nas faixas etárias da idade adulta ou da terceira idade. Entretanto, este período de escolha e tomada de decisões também requer um cuidado maior com o organismo”, alerta a fisioterapeuta.
Da tensão do jogador de futebol
a mulher com endometriose
Regina Célia revela que o primeiro trabalho referente ao estresse como doença foi feito por um endocrinologista. Entretanto, ao longo dos anos, as categorias que mais buscam entender e estudar o mecanismo do estresse são os psicólogos e psiquiatras. “É importante lembrar que o estresse é um fenômeno biológico, basicamente composto por alterações orgânicas, mas que não deixa de ter questões emocionais envolvidas. Mesmo o estresse pós-traumático, contraído a partir de guerras ou seqüestros, possui base biológica”, explica.
No início, os trabalhos do Laboratório eram centrados em estudos sobre os efeitos do estresse em modelos animais. Em 2002, começaram os primeiros trabalhos com aplicação em humanos, financiados pela Fapesp e Fundo de Apoio ao Ensino e à Pesquisa da Unicamp (Faep).
A nutricionista Márcia Carvalho Garcia, a primeira a utilizar a análise por meio do cortisol, pesquisou as concentrações de estresse em jogadores de futebol durante os treinos e em épocas de campeonatos. Ela apurou que, surpreendentemente, os índices são estáveis, se comparados aos exames feitos em outros períodos com menor intensidade de jogos.
Outro trabalho de mestrado está investigando a concentração de estresse em jogadores de outras modalidades esportivas, entre as quais o badmington e o tênis. Na mesma linha de pesquisa aplicada, Regina Célia orientou um trabalho sobre nível de concentração de cortisol em mulheres com endometriose.
No estudo de Karina Petrelluzzi, o resultado apontou concentrações muito baixas do hormônio, o que pode significar exaustão do sistema de estresse no organismo. Regina Célia explica que é natural, em situações de estresse prolongado, a falta de reação às alterações. “A dor é um estímulo estressante. Trata-se, neste caso, de uma das piores situações, pois não há perspectivas de tratamento eficaz”, explica a professora.
Uma técnica segura
Retirar amostras de saliva para medir as concentrações de cortisol e, conseqüentemente, mensurar o nível de estresse não se trata de um método novo. Mas foi o Laboratório de Estresse do Instituto de Biologia a desenvolver as primeiras experiências no país. Atualmente, muitos pesquisadores já utilizam a técnica para estudos relacionados à doença, depois da divulgação dos trabalhos realizados pela equipe da Unicamp.
A técnica foi aplicada em todos os trabalhos desenvolvidos com humanos pelo laboratório. Basicamente, amostras da saliva são colhidas em tubos plásticos com algodão específico. O procedimento é simples e higiênico. Após a coleta, as amostras são depositadas em uma centrífuga na qual são feitas as medições. Segundo Regina Célia, o método oferece altos níveis de segurança dos dados.
Em geral, este tipo de medição é feito em laboratórios clínicos, a partir de amostragem de sangue. Este método, no entanto, é invasivo e inviável para pesquisas acadêmicas, uma vez que poderia oferecer riscos aos voluntários, além da necessidade de ser colhido um grande número de amostras.
Como o hormônio esteróide é secretado em maior quantidade em situações de alto estresse físico e mental, é importante o seu controle, pois está diretamente ligado aos níveis de gordura corporal e de perda de massa muscular.