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Acessibilidade em sistemas de informação
é avaliada por método desenvolvido no IC

Engenheiro de computação cria alternativa mais barata, rápida e fácil de aprender

Eduardo Tanaka: “O ideal é que, em qualquer lugar que haja interação entre uma pessoa com deficiência e um recurso tecnológico, ele consiga ser aplicado” (Foto: Antoninho Perri) Um dos problemas mais recorrentes nos métodos tradicionais de avaliação de acessibilidade na internet é que eles são muito demorados. Em média, um processo de avaliação que emprega checkpoints leva pelo menos cerca de uma hora, isso para uma única página. Assim sendo, teo­ricamente um site que possua 100 páginas despenderá a princípio 100 horas de trabalho do especialista para avaliá-lo em sua totalidade, pois não havia – até agora – um método de avaliação mais eficiente. Diz-se que não havia, pois em sua tese de doutorado, defendida no Instituto e Computação (IC) e orientada pela professora Heloísa Vieira da Rocha, o doutorando Eduardo Tanaka conseguiu chegar a uma melhor alternativa para avaliação de acessibilidade em sistemas de informação, baseada em heurísticas, tendo como característica a possibilidade de ser aplicado a qualquer momento da etapa de desenvolvimento.

Esse método tem-se mostrado barato, rápido e fácil de aprender, devendo auxiliar particularmente desenvolvedores de software que precisam avaliar acessibilidade e pessoas com deficiências. Mas ainda não está disponível na internet, já que o seu autor nutre a ideia, no momento, de publicar um livro apresentando o tema para os leitores.

Alguns checkpoints de acessibilidade, conforme Tanaka, são muito questionáveis. É o caso daqueles que sugerem que um determinado site tenha um mecanismo de busca ou mesmo um mapa. Ocorre que muitas vezes isso não tem um ganho muito expressivo para a acessibilidade, opina. Além disso, muitos desenvolvedores de software e especialistas da área de computação se sentiam de certa maneira intimidados com alguns destes checkpoints, que eram sobremodo subjetivos, dando margem a interpretações equivocadas do avaliador.

Seguramente, dos métodos de avaliação de acessibilidade existentes, os mais adotados hoje em dia são de longe os que adotam os checkpoints (que se baseiam na verificação de conformidade com guias de design acessíveis para a Web). Há também os testes com usuários com deficiências, possíveis de serem aplicados para avaliar sites ou softwares de maneira geral, relata o autor da tese. Mas estes demandam, conforme ele, também um processo muito demorado e caro, uma vez que é preciso buscar pessoas para participar desse processo de avaliação. “Para fazer um teste de usabilidade e analisar se um software é fácil, ou não, de usar com usuários sem deficiência, é recomendado de três a cinco usuários. É fornecida, aos usuários, uma lista de tarefas para executarem enquanto especialistas analisam se os usuários conseguem cumprir estas tarefas”, conta.

Com usuários que têm alguma deficiência, detalha ele, é necessário aumentar esse número. “Se participarem dos testes um cego, um surdo e uma pessoa com restrição motora, é muito provável que os dados não serão suficientes. O ideal é analisar de três a cinco cegos, de três a cinco surdos, de três a cinco pessoas com restrição motora”, acentua Tanaka, que é engenheiro da computação.

Ainda no teste convencional, “é preciso tentar extrair as principais tarefas que um potencial usuário desempenharia num software”, afirma Tanaka, “e fazer uma lista de prioridades, tentando começar com aquelas que poderiam ser feitas em período de uma a duas horas no máximo”. Às vezes, porém, com um só teste, dependendo do tamanho do software, não é possível ser avaliado por inteiro. “O problema é este. Imagine que para cada usuário seja preciso uma hora para fazer um teste. Para depurar os resultados de cada um, vou precisar de mais uma hora. Se tenho 15 usuários, serão 15 horas para execução, mais 15 horas para análise”, descreve. Este era um dos motivos para que muitos desenvolvedores ignorassem literalmente a avaliação da acessibilidade durante o ciclo de desenvolvimento de software.

Tanaka comenta que, além da quantidade de participantes, alguns materiais e métodos têm que ser adaptados, o que os encarecem, e aumentam a complexidade dos testes. Por exemplo, ao fazer um teste com um surdo, pode ser necessária a presença de um intérprete de língua de sinais e qualquer material impresso dos testes terá que ser em Braille para os cegos.

“Com o novo método, diminuímos o tempo e o custo de avaliação”, informa o engenheiro. Realmente não existia no mundo um método como o desenvolvido por Tanaka, pois era em geral voltado para a Web ou muito atrelado aos checkpoints já existentes. Então ainda prosseguia aquela lacuna, posto que não se conseguia aplicá-los em outros contextos. O novo método permite avaliar até um caixa automático de banco. O resultado da avaliação pode ficar pronto entre uma e duas horas com o método proposto por ele.

A base

O novo método segue basicamente cinco princípios, ou heurísticas (ciência que se dedica à investigação e descoberta dos fatos através da pesquisa de fontes e documentos), que ajudam especialistas a descobrir problemas de acessibilidade. Para chegar a este conjunto de princípios, o doutorando realizou vários testes com usuários, sendo alguns com surdos no Centro de Estudos e Pesquisas em Reabilitação (Cepre) “Prof. Dr. Gabriel Porto”. Ainda procurou conversar com pessoas que frequentavam o Laboratório de Acessibilidade da Biblioteca Central “Cesar Lattes” (BCCL), para saber as suas principais dificuldades. Cerca de 40 deficientes participaram dos testes.

A primeira heurística elaborada na tese de Tanaka consiste em dar suporte a diferentes tipos de entrada e saída – ter no seu recurso tecnológico como utilizar o teclado e mouse sem o monitor e saber os dispositivos de interação: um cego vai usar um leitor de telas, o deficiente físico pode não utilizar o teclado e o mouse, e sim um teclado virtual. A segunda é fornecer conteúdo para todos os usuários – não adianta fazer algo muito inovador como um sistema que você empregará somente o áudio (você fala com ele e ouve a resposta, o que um usuário surdo não vai conseguir utilizar). Outra coisa: hoje está muito em moda o uso de podcasts (é uma rádio digital com programação personalizada), que também oferece esse mesmo problema.

A terceira heurística defende a independência de uso – não adianta colocar diversos recursos de acessibilidade e o deficiente precisar de alguém para ligar e configurar para ele. O próprio deficiente tem que conseguir “ligar” e “lidar” com este tipo de recurso. A quarta heurística diz respeito às preferências do usuário – se o usuário configurou de uma forma o sistema para utilizá-lo com acessibilidade, este sistema terá que seguir este mesmo rumo. Se ele configurou o Windows para usar autocontraste de cores, por exemplo, o sistema precisa seguir sua convenção.

Finalmente, a quinta heurística aborda a eficiência e a interação alternativa – se o usuário utilizar um teclado virtual ou um leitor de telas, a interação dele tem que pensar em eficiência também. Muitas vezes estes dispositivos alternativos não têm tanta qualidade assim. “Então você tem que incluir no sistema algum tipo de atalho e uma forma mais eficiente de uso”, contribui o engenheiro.

A primeira conclusão do estudo de Tanaka, que atualmente é engenheiro de software num instituto de pesquisas em Campinas, foi que os métodos de avaliação atuais deixam muito a desejar. A segunda é que o novo método pode ser utilizado para avaliar qualquer recurso tecnológico, não ficando apenas restrito a um site na Web ou a um software. “O ideal é que, em qualquer lugar que haja interação entre uma pessoa com deficiência e um recurso tecnológico, ele consiga ser aplicado”, salienta.

A terceira conclusão envolve a questão de custos. Comparado com outros métodos de avaliação de acessibilidade, certamente um método que demora menos tempo e que exige menos de aprendizado das pessoas será um método mais barato, ainda que Tanaka não tenha dimensionado a economia que ele traria. “Esperamos que este tipo de método seja utilizado pela indústria e desenvolvedores de software”, frisa Tanaka, que tem mestrado e doutorado obtidos na área de Ciência da Computação da Unicamp.

Software

No mestrado, Tanaka trabalhou no redesign de um software que começou a ser concebido na sua iniciação científica e com o qual trabalha desde 2000 – o HagáQuê, um editor de histórias em quadrinhos. “Percebíamos nesse processo de redesign do HagáQuê para acessibilidade que a avaliação era demasiadamente demorada. Eu fazia uma mudança no software e não tinha como utilizar os checkpoints, as guidelines, por serem voltadas à Web. Aí precisava sempre recorrer aos testes”, conta. A cada mudança era preciso chamar usuários. Às vezes eles não eram encontrados ou diziam que podiam atender somente em outro dia.

Por essa razão, o engenheiro tomou uma decisão muito importante: desenvolver um método para avaliar acessibilidade que não necessitasse dos usuários. Já existiam iniciativas semelhantes a essa – os checklists aplicados por especialistas – e também padrões para orientar o design acessível, voltados principalmente para conteúdo na Web. Mas “eles têm algumas restrições, são demorados e caros. Não são aplicáveis a outros softwares fora da Web, que era o caso do HagáQuê”, revela.

Para Tanaka, a acessibilidade deve ser entendida dentro de um amplo contexto. Não adianta ter um software acessível e na prática dar um teclado, um mouse e um monitor para um usuário cego utilizar. “O mouse ele provavelmente não vai conseguir empregar, assim como o monitor”, esclarece.

Depois de lançada a primeira versão do software HagáQuê, algumas escolas de educação especial começaram a obtê-lo. Sabidamente alguns problemas impediram os alunos deficientes de fazer uso efetivo dele. Surgiu então a proposta de efetuar um redesign do HagáQuê para melhorar sua acessibilidade, que se tornou o estudo de mestrado do engenheiro.

Nesse projeto, o pós-graduando esbarrou na avaliação de acessibilidade, que era muito custosa. Havia muitos checkpoints que não eram aplicáveis ao HagáQuê, outros complexos. Tanaka também comprovou isto quando ministrava aulas sobre acessibilidade. Quando ensinava sobre os checkpoints, os alunos manifestavam muitas dificuldades.

Os checkpoints atentam, entre outros assuntos, para o usuário empregar uma linguagem mais simples e mais clara possível; optar pelas versões mais recentes de codificação para a internet (que é o HTML); e escolher sempre as tecnologias da W3C, o órgão que propôs estes checklists. “Por que uma apresentação em PDF não pode ser acessível, por exemplo? Por que não se trata do padrão da W3C”, responde Tanaka. “São questões, no entanto, muito sujeitas à contestação”, garante. O Consórcio World Wide Web (W3C) é uma comunidade internacional que desenvolve padrões com o objetivo de capacitar o crescimento da Web.

Quanto tempo os desenvolvedores estimavam que iriam gastar para avaliar uma página com os checkpoints? “Algumas pessoas diziam que iriam precisar de até seis horas. Eu preciso de uma hora porque sou especialista”, aponta Tanaka. O fato de ter se envolvido com a causa dos deficientes foi, para ele, um caminho natural. O redesign do HagáQuê abriu estas portas. O doutorando esclarece que sempre gostou de histórias em quadrinhos e que dificilmente perdia a leitura dos festejados gibis principalmente da Turma da Mônica e do avarento Tio Patinhas.

 

Publicação: Tese de doutorado “Método baseado em heurísticas para avaliação de acessibilidade em sistemas de informação”

Autor: Eduardo Tanaka

Orientadora: Heloísa Vieira da Rocha

Unidade: Instituto de Computação (IC)

Financiamentos: Capes, Fapesp e CNPq

 

 

 

 
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