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Os primeiros frutos do Cinapce

Livro mostra trabalhos iniciais de programa que reúne quatro instituições de São Paulo

LUIZ SUGIMOTO

Equipamento óptico que usa a luz laser para trazer informações sobre o funcionamento cerebral: novos dados sobre o cérebro de pessoas com epilepsia (Foto: Antoniho Perri)Neurociências e Epilepsia é o primeiro livro da série Cinapce (Cooperação Interinstitucional de Apoio a Pesquisas sobre o Cérebro), programa financiado pela Fapesp e coordenado pela Unicamp, que visa promover pesquisas em neurociências e formar uma rede de colaboração entre diversas instituições do Estado de São Paulo. O Cinapce foi lançado em abril de 2007, focando neste princípio a epilepsia. A publicação traz os trabalhos iniciais do programa, apresentados pelos pesquisadores durante workshop realizado em Campinas em junho do ano passado.

“O livro está dividido em quatro grandes áreas: aplicação clínica, desenvolvimento tecnológico, ciência básica e experimental e educação e interação social. A ideia é produzir uma série para divulgar os estudos desenvolvidos no Cinapce a cada ano. Este primeiro número já mostra o direcionamento das pesquisas pelas instituições paulistas”, afirma o neurologista Li Li Min, professor da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) e um dos organizadores da publicação.

O Cinapce já conta com 180 colaboradores catalogados, entre pesquisadores principais e pós-graduandos de nove unidades da Unicamp e também da USP, Unifesp e Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa. Sua sede está para ser inaugurada em maio, dentro do Hospital das Clínicas (HC) da Unicamp, depois dos ajustes finos na máquina de ressonância magnética de alto campo, avaliada em US$ 2 milhões e adquirida junto à Philips, e que oferece inúmeras modalidades de imagens do cérebro. 

“Trata-se de um equipamento avançado para estudos neurofuncionais, que permite ver o cérebro em ação e analisar as regiões que controlam determinadas funções. Ele abre as portas para pesquisas em todos os níveis, como de desenvolvimento tecnológico, aprimoramento de exames, formação de protocolos e estudos clínicos com pacientes”, explica o professor Roberto Covolan, do Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW) e um dos coordenadores do Cinapce ao lado de Li Li Min e do professor Fernando Cendes, do Departamento de Neurologia.  

O neurologista Li Li Min, professor da FCM, e o físico Roberto Covolan, do IFGW: programa já conta com 180 colaboradores catalogados (Foto: Antoninho Perri)Segundo Covolan, pesquisadores da Unicamp introduziram em 2005 esta tecnologia que une a eletroencefalografia (EEG) e a ressonância magnética funcional. “Até então, ninguém no Brasil havia recorrido à análise concomitante de registros da atividade elétrica captadas na EEG e da atividade funcional (hemodinâmica) oferecidas pela ressonância magnética. São informações de naturezas diferentes a respeito do que está acontecendo no cérebro em determinado momento”.

Na opinião de Li Min, o equipamento de ressonância magnética em fase de instalação representa o estado da arte em termos de diagnóstico, por promover maior acessibilidade e especificidade na detecção de lesões cerebrais. “A intensidade do campo magnético desta máquina é de três teslas e traz uma resolução anatômica bastante superior às dos aparelhos de 1.5 ou 2 teslas [um tesla corresponde a cerca de 20.000 vezes o campo magnético da Terra]. Com isso, conseguimos definir inclusive as lesões mais sutis em pacientes com epilepsia avaliados no programa – em boa parcela deles, não se conhece a causa exata”.

Luz laser
Roberto Covolan informa que uma segunda tecnologia introduzida no país pela Unicamp é um equipamento óptico com sondas que são posicionadas no couro cabeludo, usando-se a luz laser para trazer informações sobre o funcionamento cerebral. “É uma tecnologia que ainda estamos utilizando à parte, mas que também será acoplada ao equipamento de ressonância, acrescentando novos dados simultâneos sobre o cérebro de pessoas com epilepsia”. 

Esta combinação de técnicas é muito apropriada, conforme Covolan, por causa da complementaridade. “A ressonância magnética funcional é muito eficiente para a localização espacial da lesão, mas não possui boa resolução temporal, ou seja, as imagens são tomadas espaçadas no tempo. Ao passo que o equipamento óptico, inversamente, não apresenta boa localização espacial, mas sua resolução temporal é de um milésimo de segundo, visto que estamos falando de luz laser”.

O pesquisador acrescenta que este aparelho vem servindo ao desenvolvimento de protocolos para estudos da memória, que é considerada uma atividade cognitiva de alto nível, em continuidade aos trabalhos já iniciados com a ressonância magnética funcional há mais tempo. “Muitos pensam que os estudos funcionais dizem respeito apenas a atividades motoras, visuais ou auditivas, cujas regiões responsáveis são mais facilmente localizáveis no cérebro. Mas o equipamento torna possível a análise também da memória, embora não seja algo trivial de ser feito”. 

De acordo com Covolan, uma primeira pesquisa realizada com a ressonância magnética funcional junto a 30 pacientes com epilepsia, já trouxe resultados preliminares apresentados em congressos. “Muitas patologias que levam à epilepsia pedem a verificação de atrofia do hipocampo –  estrutura cerebral associada ao mecanismo da memória. Observamos um paciente com lesão no hipocampo, cujo cérebro passou a recrutar neurônios em outra região, que assumiu a função da memória. É um fenômeno que chamamos de plasticidade cerebral”.

Computação
O professor Li Li Min reitera que as causas da epilepsia são variadas, como uma lesão no cérebro, que por sua vez pode ser microscópica, extensa ou metabólica. “Conhecemos as lesões mais freqüentes causadoras de uma hiperexcitação que repercute no circuito cerebral, como a mencionada esclerose hipocampal ou as malformações do córtex. Mas há lesões que não conseguimos detectar a olho nu e, por isso, um grupo do Instituto de Computação (IC) vem buscando meios de apontar alterações nas imagens digitais de ressonância através de manipulações matemáticas”. 

Quanto à terapia para a epilepsia, o neurologista não crê na chegada de um medicamento superior aos já existentes no mercado. “As medicações atuais estão no limite da eficácia e visam ao controle neuronal para evitar a crise, que reaparece se o paciente deixar de tomá-las. É preciso desenvolver terapias que tragam efeitos no processo epileptogênico, isto é, na conformação dos neurônios que geram a crise, impedindo que ela aconteça”.

Li Min destaca que maiores avanços vêm sendo obtidos com o tratamento cirúrgico da epilepsia, buscando-se agora um sistema para prever quais seriam os resultados do procedimento. “Os candidatos à cirurgia são aqueles que não respondem a medicações, mas há necessidade de melhorar a triagem acoplando múltiplos dados de técnicas diferentes, a fim de medir a probabilidade de sucesso da cirurgia ou de danos neurológicos. Inclusive por que não se trata de um procedimento simples, e que é caro. Cerca de 70% desses pacientes têm chance de se livrar da crise, mas ainda não são 100%”.

Para Roberto Covolan, um desafio do Cinapce é desenvolver protocolos de exames funcionais com informações adicionais aos neurocirurgiões para um planejamento preciso da abordagem cirúrgica. “Certamente, os pacientes gostariam que nossos estudos alcançassem a mesma precisão que hoje é possível na previsão meteorológica, que conta com dados sobre tempo, pressão atmosférica e temperatura, além de computadores poderosos para resolver todas as equações sobre o comportamento do clima. No caso da epilepsia, também seria desejável termos um modelo matemático com condições de prever a ocorrência de crises”.

Curso vai transferir conhecimento

Será lançado em maio, no âmbito do programa Cinapce, um curso que trata de educação, saúde e ética para aproximadamente 300 professores dos ensinos infantil, fundamental e médio, a partir dos pólos de São Paulo, Campinas, São Carlos e Ribeirão Preto. “Queremos que o conhecimento gerado no Cinapce seja utilizado em outros segmentos e não apenas no meio científico. Como o foco inicial é a epilepsia, que traz impactos tanto na saúde como também de cunho psicológico e social, uma das maneiras de minimizar o preconceito é transferir este conhecimento para segmentos formadores de opinião, como dos professores”, observa o professor Li Li Min.

O curso aos professores será ministrado através da Univesp (Universidade Virtual do Estado de São  Paulo), parceria que vem ampliar bastante o raio de ação do programa. Outro curso para formadores de opinião, informa o docente da FCM, é o de jornalismo científico em neurociências, pelo Laboratório de Estudos em Jornalismo (Labjor) da Unicamp, um dos executores do Cinapce. “As aulas já começaram para uma turma de 19 alunos, metade de jornalistas e metade de profissionais de outras áreas”.

Retomando o livro Neurociências e Epilepsia [Editora Plêiade], que está inserido no esforço de divulgação do programa Cinapce, Li Min destaca a importância de trabalhos como da neurologista Clarissa Yasuda, que em seu doutorado desenvolveu técnicas de processamento de imagens de ressonância que trouxeram novas respostas sobre a plasticidade cerebral. A pesquisa apontando evidências de neuroplasticidade (regeneração e alterações de volume) em substâncias associadas ao controle de crises em pacientes submetidos a cirurgia de epilepsia, rendeu a Clarissa dois prêmios nacionais e cinco internacionais.

Outro trabalho destacado pelo organizador do livro, escolhido como o melhor do II Workshop Cinapce, é de autoria da psicóloga e pesquisadora Paula Teixeira Fernandes. Em sua pesquisa, ela questionou adolescentes sobre o uso das expressões “epiléptico” e “pessoa com epilepsia”, constatando na prática a diferença na teoria. “O termo ‘epiléptico’ traz o rótulo da doença, sugerindo a situação imutável, colocando a doença no primeiro plano. Já o termo ‘pessoa com epilepsia’ resgata o ser humano por trás da doença”, diz Li Min.

O professor da Unicamp compara a situação da pessoa com epilepsia à do portador de HIV, que não é mais chamado de aidético. “Temos no repertório de comunicação um instrumento simples para ajudar a reverter o preconceito. Na verdade, nós pesquisadores não nos referimos à epilepsia como uma doença, mas como uma condição neurológica; a doença sugere que há uma causa conhecida, enquanto a epilepsia é multifatorial. Uma pessoa com malformação no cérebro não desenvolverá, necessariamente, a epilepsia, que é desencadeada por outros mecanismos genéticos ou ambientais”. 

SERVIÇO
O livro Neurociências e Epilepsia pode ser baixado em seu formato eletrônico no site.

 
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