Pesquisadores
da Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Unicamp desenvolveram
um novo sistema capaz de detectar bolhas e partículas sólidas
em tubulações de indústrias químicas com alta sensibilidade.
Esta tecnologia se refere a um sensor opto-eletrônico, baseado
em emissão de laser, que se conecta a uma rede de comunicação
digital Fieldbus Foundation, muito utilizada em indústrias
químicas para transmitir os dados coletados por instrumentos
para o sistema de controle industrial. A tecnologia é inédita
e o pedido de patente foi depositado junto ao Instituto
Nacional de Propriedade Industrial (INPI).
A pesquisa que levou ao
desenvolvimento desta tecnologia foi realizada no Laboratório
de Controle e Automação de Processos do Departamento de
Engenharia de Sistemas Químicos (DESQ), no âmbito do projeto
de mestrado de Fábio Delatore sob a coordenação da professora
Ana Maria Frattini Fileti e com a colaboração de João Alexandre
Pereira, professor aposentado da FEQ. A professora explica
que a tecnologia foi desenvolvida com o objetivo de auxiliar
em alguns processos de engenharia química nos quais há escoamento
de líquidos e que, junto a esses líquidos, não possa haver
gases. “Exemplos típicos são recipientes nos quais se faz
estocagem de gases liquefeitos sob alta pressão”, cita.
Segundo Ana Maria, a presença
de gases nesses recipientes significaria uma possível ruptura,
que pode em alguns casos causar até explosões, mas o novo
sistema permite a detecção da presença da bolha a tempo
para que providências possam ser tomadas. “Uma vez detectada
a bolha no processo, o sistema é capaz de enviar um sinal,
soando um alarme, para que uma ação seja executada com o
objetivo de eliminar o problema”, explica.
A professora menciona também
que a tecnologia pode ser utilizada em sistemas de bombeamento
de líquidos, em que a presença de gases junto destes gera
um desgaste acentuado das palhetas das bombas. “Como se
fossem jatos de areia incidindo sobre o metal, corroendo-o,
de forma que a bomba perde a sua vida útil muito rapidamente”,
ilustra Ana Maria. Segundo ela, existem também algumas aplicações
possíveis na engenharia biomédica, como por exemplo, na
hemodiálise, onde o sangue é filtrado externamente para
a retirada de substâncias prejudiciais ao corpo e a existência
de bolhas poderia causar sérios transtornos ao paciente.
“Desenvolvemos um sensor muito barato com equipamento bastante
usual, popular, de forma a fazer com precisão esta detecção
de bolhas em escoamento de líquidos”, coloca a professora.
Os pesquisadores comentam
que a maioria das tecnologias atuais para identificar as
bolhas em sistemas de transporte de líquidos é baseada em
fios condutores dispostos em forma de grade dentro das tubulações.
“Tais tecnologias são capazes de detectar e caracterizar
bolhas individuais ou em grupo, mas sua principal desvantagem
é o contato direto com o líquido que pode resultar em medidas
imprecisas, se a limpeza regular do sensor não é realizada”,
avalia Ana Maria. A professora explica que as medidas imprecisas
nos outros sistemas ocorrem porque o contato do sensor com
o fluido pode gerar incrustação no aparelho, sendo necessária
a parada regular do processo para manutenção. Outra consequência
deste contato é a possibilidade de ocorrência de reações
químicas indesejadas, ocasionando perda de qualidade do
produto transportado.
Segundo os pesquisadores,
outros sistemas ópticos baseados em emissões de laser são
eficazes, mas têm elevados custos, pois estão normalmente
associados ao uso de sondas com fibra óptica, ou devido
ao fato de serem importados. “Estes sistemas estão restritos
a unidades de controle e monitoramento locais, que não fornecem
a interface para integrar o sistema à rede industrial, o
que torna impossível sua gestão centralizada”, comenta Fábio
Delatore.
Sendo assim, o sistema óptico
de detecção de bolhas em líquidos foi desenvolvido de maneira
a ter um investimento para desenvolvimento mais baixo, além
de ser não-intrusivo, baseado no princípio de emissão e
recepção de luz. A tecnologia proposta utiliza uma caneta
ponteira laser como emissor de luz e o componente eletrônico
chamado fototransistor para a recepção do laser.
Delatore descreve que pelo
novo dispositivo o sinal de luz emitido pela caneta laser
passa pela tubulação e atinge o fototransistor instalado
no outro extremo da mesma, não havendo um contato físico
entre o sensor e o líquido escoando. “O funcionamento do
sensor óptico é semelhante ao de um controle remoto da tevê,
em que o emissor laser está em sua mão, como o controle
remoto, e o receptor, que na sua casa é a tevê, no dispositivo
é o fototransistor, que recebe os sinais emitidos. Neste
sistema, qualquer barreira física, que seria por exemplo
sua mão na frente do controle remoto, ou a bolha no caso
da tubulação na indústria química, causa a interrupção do
sinal óptico”, explica. Delatore afirma que o mesmo sensor
também realiza a detecção de partículas sólidas, dentro
de escoamento de gases. “Sem modificação nenhuma no sensor
é possível também realizar a identificação de impurezas
sólidas em escoamento de gases ou líquidos”, acrescenta.
Segundo o pesquisador, o sistema eletrônico reconhece o
pulso desligado que caracteriza a passagem da bolha ou da
partícula sólida pelo sensor óptico.
Interfaces
Os pesquisadores explicam que dois tipos de sensores ópticos
foram desenvolvidos. O primeiro deles, o sensor pontual,
utiliza apenas um emissor laser e um fototransistor. Já
o segundo, chamado de sensor multiponto, utiliza quatro
emissores laser e quatro fototransistores. Além disso, duas
interfaces eletrônicas foram desenvolvidas para conexão
dos sensores à rede Fieldbus Foundation. A interface do
sensor pontual funciona com retenção do sinal de saída,
ou seja, a saída não se altera até a passagem de uma nova
bolha. No sensor multiponto, a interface funciona como um
contador assíncrono, onde a cada passagem de bolha, o contador
é incrementado.
Como a utilização da rede
Fieldbus Foundation vem aumentando em indústrias químicas,
essa rede foi escolhida para transmissão de dados do sensor
até a sala de controle para que a informação possa ser processada
pelo computador central. A rede Fieldbus é um sistema de
comunicação bidirecional (envia e recebe dados), em série
e totalmente digital, que interconecta os equipamentos de
campo (sensores, atuadores, transmissores e controladores),
permitindo a distribuição das funções de controle entre
os equipamentos de campo. “A vantagem do sistema desenvolvido
é também a possibilidade de que o seu sinal de saída possa
ser aplicado não somente em rede Fieldbus, mas também em
outras redes, por exemplo a Profibus e a Hart, que também
são utilizadas em indústrias químicas com tecnologias de
ponta tão boas quanto a disponibilizada”, explica Delatore.
Já há um protótipo pronto
para a tecnologia, inclusive para a detecção multiponto,
que permite a contagem de bolhas e sua análise pormenorizada
na tubulação, que inclui o cálculo da velocidade das bolhas
e permite a criação de um arquivo de dados.
Com o pedido de patente
depositado, a Agência de Inovação Inova Unicamp está em
contato com empresas, principalmente fabricantes de equipamentos
de controle de processos e desenvolvedores de software para
controle de processos, para a transferência da tecnologia,
que pode ser realizada por meio de um licenciamento.
De acordo com os pesquisadores,
há uma demanda crescente no mercado para sistemas de controle
em várias indústrias, como a petroquímica, química, energia,
aeroespacial, farmacêutico, tratamento de água, papel e
celulose. Sua expectativa é que a tecnologia venha a contribuir
para estas indústrias, em especial as que tenham a necessidade
do controle do volume determinado de bolhas, ou a exigência
de total ausência de bolhas ou de partículas sólidas no
processo. “Podemos orientar para uma linha de controle de
processos para ter um produto final bom, ou podemos trabalhar
com a segurança na indústria.”, coloca Delatore.