Pesquisa do IG abre perspectivas para
identificação de novas jazidas minerais
Estudos foram feitos na Província
Pegmatítica da Borborema, localizada no Nordeste
MANUEL
ALVES FILHO
Pesquisas
desenvolvidas para a tese de doutorado do geólogo Sebastião
Milton Pinheiro Silva, defendida recentemente no Instituto
de Geociências (IG) da Unicamp, geraram informações inéditas
acerca da Província Pegmatítica da Borborema, uma importante
área geoeconômica do Brasil, localizada nos estados da Paraíba
e Rio Grande do Norte. Por meio do cruzamento de dados novos
e antigos, fornecidos por ferramentas como sensoriamento
remoto por satélites e gamaespectrometria área e terrestre,
o pesquisador chegou a resultados que abrem perspectivas
para a identificação de novas jazidas minerais economicamente
viáveis na região. O trabalho foi orientado pelo professor
Alvaro Crósta e recebeu financiamento da Fundação de Amparo
à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Sebastião Silva explica
que escolheu a Província da Borborema para o desenvolvimento
das pesquisas, mais especificamente a sua porção sul, por
causa da grande atividade mineral lá existente. De acordo
com ele, algumas jazidas, como de tantalita e berilo, metais
considerados estratégicos, começaram a ser exploradas ainda
na época da Segunda Guerra Mundial. Atualmente, a região
produz, entre outros, bens minerais como o feldspato, o
caulim, rochas ornamentais e algumas gemas semipreciosas.
“Além disso, em razão da área estar localizada no semi-árido
nordestino, há uma grande exposição de rochas, o que facilita
a investigação”, acrescenta.
O autor do estudo destaca
que trabalhou com dois conjuntos de dados, um antigo e um
recente. O primeiro foi obtido por meio de levantamentos
aerogeofísicos de gamaespectrometria, realizados na década
de 1970. O segundo foi gerado por imagens atuais de sensoriamento
remoto por satélites. Para cruzar e organizar a massa de
informações obtidas, Sebastião Silva valeu-se de aplicativos
de software específicos. “Essa metodologia permitiu que
chegássemos a resultados importantes. Com o sensoriamento
remoto, por exemplo, conseguimos mapear as áreas de extração
e de potencial de novas ocorrências, o que poderá ser usado
futuramente para outros mapeamentos de detalhe e facilitar
a atualização das informações geológicas”, diz.
A partir dos dados fornecidos
pela gamaespectrometria, o geólogo conseguiu identificar
alguns tipos de granito ainda desconhecidos na região e
descobriu um novo tipo de mineralização associado a rochas
metamórficas. As evidências extraídas desses dados, segundo
ele, podem ser comparadas com impressões digitais geológicas,
pois fornecem indícios da eventual existência de depósitos
minerais. Alguns desses minérios têm elevado valor comercial,
como o zircão e o rutilo, por sua utilização em processos
industriais – revestimento de moldes de fundição e na forma
de pigmento para tintas, plásticos e alimentos, respectivamente.
“Ainda não é possível antecipar nada em termos de novas
jazidas, mas a informações coletadas abrem novas oportunidades
para a execução de pesquisas detalhadas que podem fornecer
resultados sobre a dimensão, teor dos minerais e viabilidade
econômica de eventuais depósitos”, esclarece Sebastião Silva.
O professor Alvaro Crósta
considera que o trabalho é perfeitamente aplicável, com
eventuais adaptações, à investigação de outros tipos de
mineralização. Ele lembra que o governo federal está investindo
fortemente em novos levantamentos aerogeofísicos em todo
o país, que apresentam grande evolução em relação à abordagem
realizada nos anos 70, principalmente quanto à maior resolução
e qualidade dos dados. “Também por isso, os resultados desta
pesquisa são oportunos. Penso que as tecnologias de processamento
e integração dos dados de sensoriamento remoto e aerogeofísicos
que desenvolvemos nesta pesquisa podem ser aplicadas ao
tratamento desses novos dados, de modo a gerar alvos exploratórios
que apresentem potencial para atividades de extração mineral”.
No que toca especificamente à Província da Borborema, prossegue
o docente, fica a expectativa de que o trabalho venha a
contribuir para o incremento do emprego e da renda da população
local. Alvaro Crósta lembra que naquele pedaço do semi-árido
nordestino a mineração é uma das poucas atividades econômicas
viáveis, principalmente em razão das características climáticas.
Recentemente,
o programa Globo Repórter, exibido pela Rede Globo,
abordou o tema da exploração de pedras preciosas e semipreciosas
pelo Brasil. Uma das gemas mostradas na reportagem foi a
raríssima turmalina azul, também chamada de “turmalina
Paraíba”, que ocorre somente em três lugares do mundo
e cujo preço de mercado é superior ao do diamante. Um
dos depósitos dessa pedra está justamente na Província
da Borborema. Na região existem quatro minas dessa gema,
sendo que duas ainda estão em operação. “Indiretamente,
penso que estas tecnologias também podem ser usadas para
localizar pegmatitos, um tipo de rocha ao qual estão associadas
as ocorrências dessa gema. A partir do cruzamento e análise
desses dados é possível encontrar evidências que levem
a novos depósitos de turmalina azul, ou de outros minerais
estratégicos, como a tantalita ou o berilo, usados pela
indústria aeroespacial e por siderúrgicas de alta precisão”,
infere o professor Alvaro Crósta.
Um efeito colateral positivo
das pesquisas desenvolvidas por Sebastião Silva foi a identificação,
naquele naco de chão do Nordeste, de anomalias de tório,
um elemento radioativo, que não poderiam ser explicadas
pelo que se conhecia da geologia até então. O pesquisador
foi a campo e descobriu áreas com potencial para a extração
de minerais portadores de elementos denominados “terras
raras”, um conjunto de 17 diferentes elementos químicos
utilizados em diversas aplicações tecnológicas, tais como
catalisadores e supercondutores. “Isso não quer dizer que
tenhamos encontrado esse tipo de mineralização na área estudada,
mas é um indicativo desse potencial, que necessita ser avaliado.
O fato de o trabalho acadêmico ter apontado para essa direção,
principalmente em se tratando de uma região onde esse potencial
era desconhecido, é uma decorrência inesperada, mas muito
bem-vinda”, considera o autor da tese.
Um
importante recurso empregado nos estudos em questão foi
a geologia espectral, que permite a análise detalhada da
composição mineralógica das rochas. Segundo o professor
Alvaro Crósta, o trabalho de campo foi significativamente
facilitado nos últimos anos em razão do uso de espectrômetros
portáveis, como o que foi empregado na pesquisa de Sebastião
Silva. “Esse tipo de tecnologia se mostra extremamente útil
para a definição de zonas minerais dentro de corpos mineralizados.
Anteriormente, os geólogos tinham que coletar amostras,
transportar até o laboratório, fazer as análises por métodos
convencionais e esperar até dois ou três meses pelos resultados.
Agora, os dados são obtidos em questão de segundos, no próprio
campo”, detalha. A geologia espectral, como o nome sugere,
usa um espectro, que pode ser o reflexo da luz solar ou
artificial, para gerar uma curva de assinatura espectral
da rocha analisada. É com base nas características dessa
curva que os especialistas identificam a presença de determinados
minerais, que servem de guias para a possível localização
de minérios com maior valor comercial.
Na opinião do professor
Alvaro Crósta, o Brasil ainda tem muito a conhecer acerca
dos seus recursos minerais. Embora o país tenha um razoável
nível de informação sobre algumas áreas produtoras, como
o Quadrilátero Ferrífero, localizado em Minas Gerais, de
onde são extraídos bens minerais como ouro desde o século
17, e de Carajás, no Pará, que é uma das principais províncias
minerais do mundo, grande parte do território nacional ainda
não foi devidamente estudada. “O foco dos trabalhos de análise
e prospecção estão voltados atualmente para os locais com
tradição de exploração mineral. Fora deles, nós praticamente
não conhecemos nada. Um exemplo disso é a Amazônia, onde
a cobertura vegetal é um elemento que dificulta o desenvolvimento
de pesquisas do gênero”, afirma o docente do IG. “É justamente
nessas regiões ainda pouco conhecidas que as tecnologias
desenvolvidas neste projeto poderão contribuir de modo efetivo”,
conclui ele.