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Estudo abre
perspectivas para plantio
de milho em solos ácidos com alumínio
Alterações em
plantas são pesquisadas em condições
próximas à realidade de campo
A
presença do alumínio (Al) em solos ácidos
é o principal fator limitante da produtividade agrícola
no Brasil e no mundo. A resposta desenvolvida pelas plantas
à ação do Al é complexa. Sua compreensão
pode ser facilitada pela identificação, por
meio de técnicas de análise em larga escala,
de genes responsivos após a exposição
da planta aos íons do Al. A isso se propôs a
bióloga Lucia Mattiello, em trabalho orientado pelo
professor Marcelo Menossi, desenvolvido no Laboratório
de Genoma Funcional do Departamento de Genética, Evolução
e Bioagentes, do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp.
A pesquisa mostra alterações
que ocorrem nos genes da raiz e da folha do milho nos seus
processos de desenvolvimento. Teve como objetivo ampliar o
conhecimento sobre a fisiologia e a regulação
gênica de raízes e folhas do milho cultivado
em solo ácido, abrindo perspectivas, segundo a autora
do trabalho, para entender pela primeira vez a base molecular
das alterações das plantas em situações
mais próximas à realidade do campo. Em geral,
as pesquisas a respeito se utilizam de plantações
hidropônicas, em vista da maior facilidade das investigações
em laboratório.
Na pesquisa foram utilizados dois genótipos contrastantes
de milho - uma espécie tolerante e outra sensível
ao Al - cultivadas em solo ácido com concentração
fitotóxica do íon. As duas linhas de milho foram
cultivadas tanto em solo cuja acidez permite a mobilidade
do íon do metal (pH= 4,1), como em solo corrigido com
hidróxido de cálcio (pH=5,5), que leva à
imobilização do íon na forma de hidróxido
de alumínio, insolúvel em água e assim
inofensivo para as plantas.
A
pesquisadora constata que a maior inibição do
crescimento radicular na espécie sensível esteve
altamente correlacionada com a acumulação de
Al nos ápices radiculares, ou seja, nas extremidades
das raízes. Esclarece que o sintoma mais evidente da
toxidez do Al é a inibição do crescimento
radicular, sendo este o parâmetro mais utilizado para
avaliar a injúria do metal. Tendo em vista que o sítio
primário de ação fitotóxica do
íon se localiza no ápice da raiz, o estudo do
mecanismo de toxidez do Al bem como dos mecanismos de defesa
da planta têm sido focados na interação
do íon com componentes celulares do ápice radicular.
Os dados fisiológicos
confirmaram a discriminação entre as duas linhagens
em solo ácido em relação à ação
do alumínio, abrindo perspectivas para entender pela
primeira vez a base molecular das alterações
das plantas em condições próximas à
realidade de campo. Para ela, esse foi o grande diferencial,
pois os estudos existentes se baseiam em sistemas hidropônicos.
O transcriptoma de raízes
- que corresponde à identificação das
modificações na expressão gênica
concentradas na faixa do RNA mensageiro - possibilitou a identificação
de possíveis candidatos à tolerância do
Al. Entre os candidatos, explica Lucia, "identificamos
genes responsivos pela presença de Al e não
pela acidez, delimitando assim os genes com possíveis
papéis na tolerância ao alumínio presente
em solo ácido. Para ela, os resultados permitem concluir
que o cultivo em solo é diferencial em relação
à hidroponia, pois outros fatores apenas presentes
no substrato solo podem provocar a indução de
alguns genes.
Para
a pesquisadora, os dados mostram que o transcriptoma de raízes
e folhas de milho são alterados em resposta ao crescimento
em solo contendo níveis altos de Al. Essas informações
permitiram a identificação de diversos processos
metabólicos afetados que podem estar envolvidos na
inibição radicular, bem como na de alguns pontos
que podem ser relevantes para explicar a tolerância
ao metal. Financiado pela Fapesp, o trabalho rendeu publicação
de artigo na BMC Plant Biology, periódico de grande
impacto.
Explicações
Lucia diz que procurou por um solo que fosse naturalmente
ácido e com concentração suficientemente
alta de Al para causar danos à planta. Estas condições
estão intimamente relacionadas porque, para que o Al
seja fitotóxico, o pH do solo deve estar abaixo de
cinco. Para tanto utilizou amostras de solos fornecidas pelo
Instituto Agronômico de Campinas (IAC), com pH 4,2 e
com cerca de 90 ppm de Al. No laboratório os dois genótipos
contrastantes do milho foram submetidos ao solo ácido
retirado da Fazenda Santa Elisa do IAC, em Campinas, e que
fora fertilizado para a cultura do milho de acordo a indicações
do próprio Instituto.
Como controle foi utilizado o mesmo solo, mas com pH corrigido
pela adição de hidróxido de cálcio,
no qual não é mais possível detectar
o Al livre. Para facilitar a retirada das extremidades das
raízes para exame, pois são os primeiros cinco
mm da raiz que são afetados pelo metal, o milho foi
plantado em sacos de muda pretos.
Ela explica que a partir do momento em que um gene está
sendo expresso, as informações do DNA são
transmitidas para o RNA mensageiro e é a partir deste
que as proteínas são sintetizadas. A identificação
das modificações na expressão gênica
concentradas na faixa do RNA mensageiro chama-se transcriptoma.
Para tanto, ela utilizou um chip de óligonicleotídeos,
também chamado de microarrays, que permite avaliar
a expressão de cerca de 16 mil genes do milho.
Em relação à expressão, Lucia
esclarece: "À medida que um gene está sendo
expresso, um RNA mensageiro vai se acumulando na célula,
o que pode determinar também a síntese de sua
proteína. Então a acumulação de
RNA mensageiro pode ser indicativa da formação
da proteína. Quanto maior a acumulação
de RNA mensageiro, maior a expressão do gene, enquanto
a menor acumulação do RNA indica a inibição
do gene".
Na
verdade, ela queria saber o que ocorria com o transcriptoma
quando um ápice radicular era extraído de uma
planta cultivada em solo ácido em comparação
com o solo corrigido. Então extraiu o RNA mensageiro
dos cinco primeiros milímetros do ápice radicular
e aplicou em cada caso o experimento de microarrays para as
duas variedades de milho desenvolvidas nas duas amostras de
solo.
Isto permitiu comparar o comportamento dessas variedades no
solo ácido e com isso identificar, em cada caso, genes
que estavam sendo ativados ou inibidos em razão da
exposição ao solo ácido. Com esse estudo,
ela pode determinar os genes favoráveis ou desfavoráveis
ao desenvolvimento da planta. Acabou identificando também
vários genes que não haviam sido identificados
em experimentos similares usando plantas em hidroponia.
Para ela, o projeto permite identificar genes candidatos,
assim chamados os possíveis contributos para a tolerância
ao Al, o que permite a concentração do estudo
nesses candidatos específicos. Resulta daí que,
a partir da identificação desses genes, podem
ser produzidas plantas transgênicas e plantas modelo
com tolerância ao metal, abrindo um amplo espectro no
campo da biotecnologia. A propósito, ela lembra que
o Al é um dos fatores mais limitantes para plantações
no Cerrado, por exemplo, cujo solo é altamente fitotóxico
por causa da presença do metal, problema que pode vir
a ser contornado pela biotecnologia.
A pesquisadora esclarece ainda que, como o solo nunca tinha
sido diretamente testado para avaliação da tolerância
ao Al, fizeram inicialmente vários experimentos de
fisiologia. Avaliaram o crescimento radicular da planta, pois
quanto mais inibido, maior o estresse a que está sendo
submetida pelo Al. Re-alizaram também avaliação
da calose, um polímero natural produzido pelo vegetal,
pois quanto maior sua quantidade maior a inibição
radicular. O estudo se iniciou pela fisiologia, pois havia
necessidade de determinar com certeza se a presença
de Al em solo ácido levava efetivamente ao estresse
da planta. Ou seja, a pesquisa se orientou primeiro em testar
o solo como método de avaliação de tolerância
ao Al, que constituiu a parte fisiológica e depois
como objetivo mais amplo se propôs a avaliar o transcriptoma
das raízes e das folhas.
A bióloga conclui que a metodologia desenvolvida se
revelou bem-sucedida para discriminar os dois genótipos
do milho e para avaliar a planta, alem de levar à descoberta
de genes que não haviam sido identificados nos experimentos
de hidroponia.
As folhas das plantas
também foram avaliadas, o que levou à constatação
que há uma variação bastante grande entre
os transcriptomas das folhas -principalmente na variante tolerante
- e que nelas existem vários genes candidatos à
tolerância. Isso, diz ela, nunca tinha sido verificado
porque não havia sido avaliado ainda o perfil transcripcional
das folhas em relação à tolerância
ao Al. Ela explica que o conhecimento do que acontece na folha
é importante porque é nela que ocorre a fotossíntese
e, portanto, por ela passam todas as vias metabólicas
importantes para a nutrição da planta.
Lucia Mattiello avalia
que o trabalho levou a enormes resultados, que permitem descortinar
excelentes perspectivas para os pesquisadores que pretendam
seguir pelas várias vertentes que se abrem a partir
dele.
Artigo
MATTIELLO, L.; Kirst, M.; da Silva, F.R.; Jorge, R.A.; Menossi,
M. (2010) Transcriptional profile of maize roots under acid
soil growth. BMC Plant Biology 10:196 doi:10.1186/1471-2229-10-196
Publicação
Tese: "Fisiologia e transcriptoma de milho cultivado
em solo ácido!
Autora: Lucia Mattiello
Orientador: Marcelo Menossi
Coorientador: Renato Atílio Jorge
Unidade: Instituto de Biologia (IB)
Financiamento: Fapesp
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